Título: Economia dos EUA acelera neste trimestre
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Fonte: Valor Econômico, 30/05/2007, Internacional, p. A14

A primeira estimativa do crescimento econômico dos EUA no trimestre passado, um desprezível 1,3%, foi ruim. Mas, quando for anunciada sua atualização, amanhã, com base em dados mais completos, economistas apostam que o resultado será ainda pior. As projeções vão de pouco menos de 1% e até 0,6%, com base em 14 especialistas consultados pela Action Economics. O primeiro trimestre provavelmente foi o pior registrado pela economia americana em mais de quatro anos.

No entanto, os investidores deverão se concentrar no que vem pela frente, sem olhar muito no espelho retrovisor. O trimestre passado provavelmente foi o ponto mais baixo desta retração econômica. Por quê? A evidência mais clara vem da recente aceleração do setor industrial americano. Os dois principais indicadores da atividade industrial, o índice ISM e o relatório do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) sobre a produção industrial, que indicaram a reversão para baixo da economia no ano passado, estão agora ganhando o terreno perdido.

É verdade que bens manufaturados representam apenas pouco mais que um terço da economia americana, medidos pelo crescimento real do PIB. O setor de serviços responde por cerca de 55%, com a construção contribuindo com cerca de 8%. Entretanto, o setor industrial ainda contribui bastante para as mudanças de curto prazo na taxa de crescimento da economia. Na verdade, um cálculo rápido mostra que os bens respondem por 80% dos altos e baixos na variação trimestre sobre trimestre do PIB. É por isso que o aumento recente da atividade industrial é forte sinal de que o resultado desprezível do primeiro trimestre não implica numa fraqueza contínua.

O mais importante é que a reação da produção industrial é crucial porque uma melhora aí está fortemente ligada à recuperação nas três áreas fora do setor imobiliário residencial nas quais que a economia tem estado fraca nos últimos trimestres: os investimentos, o crescimento dos estoques e o déficit comercial. Some-se a possibilidade da continuarem os aumentos, ainda que menores, nos gastos do consumidor e evidências de redução dos problemas do setor imobiliário, e os sinais de crescimento do segundo trimestre começam a parecer bons.

O padrão da produção até abril mostra isso. A produção industrial cresceu 0,6% em março e 0,5% em abril, os maiores crescimentos em meses seguidos desde a metade do ano passado. Até mesmo crescimentos modestos em maio e junho levariam o crescimento trimestral da produção para perto de 5%, numa taxa anualizada, em comparação ao 1,2% do primeiro trimestre e à queda de 2,1% do quarto trimestre de 2006.

A expansão está sendo amplo e inclui bens de consumo, equipamentos e matérias-primas. Até as empresas automobilísticas estão acelerando o ritmo. Após grandes cortes dos últimos três trimestres, num esforço de desovar os estoques, as montadoras estão elevando a produção neste trimestre.

A produção relacionada ao setor imobiliário residencial continua fraca, especialmente nos setores de produtos de madeira e mobiliário. Mas até a produção dos materiais de construção subiu um pouquinho em março e abril, e dá sinais de estabilização depois da grande queda do ano passado. Esse padrão está consistente com o vigor da construção no setor corporativo, que está ajudando a compensar parte da fraqueza da produção provocada pela queda do setor imobiliário residencial.

Uma das fontes mais importantes de vida nova no setor industrial é a reação da produção de máquinas para a indústria, que reflete muito bem os investimentos das empresas. Após cair muito, a produção se recuperou em todas as maiores categorias de máquinas, incluindo equipamentos de alta tecnologia, equipamentos de transporte e máquinas industriais.

Os investimentos das empresas em máquinas caíram no quarto trimestre de 2006 e mal cresceram no primeiro trimestre deste ano, mas os ganhos de produção recentes, junto com as tendências mais firmes nas encomendas e entregas de bens de capital, significam que os investimentos farão uma contribuição muito maior ao crescimento real do PIB neste trimestre.

Uma atividade industrial mais forte implica ainda numa reversão da fraqueza causada pelos estoques elevados do último verão americano (terceiro trimestre). Depois que os estoques de automóveis e artigos relacionados ao setor imobiliário residencial atingiram níveis muito altos em relação à demanda, as empresas rapidamente cortaram as encomendas, e a produção industrial sentiu o golpe. Só o crescimento menor dos estoques subtraiu 1,2 ponto porcentual do crescimento do PIB no quarto trimestre. Dados recentes sugerem outra redução de um ponto no crescimento do primeiro trimestre, muito maior que a estimativa inicial do governo.

O aumento da produção industrial significa que o ajuste dos estoques acabou, e a sua reposição será um "plus" para o crescimento do PIB no segundo trimestre, na medida que as empresas forem enchendo novamente seus depósitos para atender a demanda. Em abril, pelo segundo mês seguido, as companhias pesquisadas pelo Instituto de Gestão de Fornecimento (ISM, na sigla em inglês) disseram que os estoques de seus clientes foram insuficientes, e o percentual de empresas que disseram ter estoques "muito baixos" foi a maior desde julho de 2006.

A reação do setor industrial significa ainda que as empresas continuam recebendo muito apoio da demanda externa. As exportações caíram no primeiro trimestre, a uma taxa anualizada e ajustada à inflação de 1,5%. Esse declínio explica em parte porque um déficit comercial maior roubou quase um ponto porcentual do crescimento do PIB no período. Mas a queda das exportações refletiu especialmente a queda das entregas no setor da aviação e não foi indicativa da tendência. As exportações de bens de consumo aumentaram quase 16%, e as de automóveis, quase 9%.

As exportações do setor industrial continuam se beneficiando da forte demanda externa e da maior competitividade do dólar. As vendas para o mercado externo cresceram 10,4% por trimestre em 2006, e o índice de pedidos de exportação do ISM continuou, até abril, num nível historicamente consistente com o crescimento das exportações na faixa dos 8% aos 10%. No segundo trimestre, as exportações retornarão à vigorosa tendência de alta e contribuirão positivamente para a alta do PIB.

A demanda interna também vai incentivar a reação do setor industrial. Os gastos do consumidor certamente mostrarão os efeitos da alta dos preços dos combustíveis neste trimestre, uma vez que uma parcela maior da renda dos americanos está sendo desviada para a compra de gasolina, com uma sobra menor para outros gastos. Entretanto, os consumidores não estão de maneira nenhuma encrencados. A confiança do consumidor em maio, medida pela Universidade de Michigan, melhorou em relação a abril, apesar dos preços maiores da gasolina. O índice medido pelo Conference Board também subiu (leia texto abaixo).

Dois motivos prováveis: primeiro, a alta do preço das ações está ajudando bastante a aumentar o patrimônio líquido dos lares americanos, mais do que compensando eventuais perdas com os preços mais baixos das residências. Segundo, o mercado de trabalho dá sinais fortes de que continua vigoroso. O sinal mais importante vem da mais recente queda do número de pedidos de auxílio-desemprego. Os novos pedidos caíram abaixo dos 300.000 por semana na primeira metade de maio, e a média móvel de quatro semanas é a menor em mais de um ano. O nível atual dos pedidos é consistente com o ritmo saudável do crescimento do número de empregos.

Portanto, quem estiver preocupado com ritmo fraco de crescimento da economia, especialmente quando tiver conhecimento da atualização do crescimento do PIB do primeiro trimestre amanhã, deve se animar com a recuperação do setor industrial. Isso significa que a economia está na verdade acelerando.