Título: Mais um escândalo, mais um anúncio de pacote
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Fonte: Valor Econômico, 30/05/2007, Opinião, p. A16

O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, reuniu ontem o grupo de trabalho, formado por ele e líderes partidários, para sistematizar as propostas em tramitação na casa no que seria um pacote anticorrupção. Não será a primeira vez que o parlamento ensaia uma resposta rápida a um escândalo. Aliás, nos últimos três anos, vividos sob escândalos sucessivos, as "respostas rápidas" se sucedem sem nenhum resultado visível - aliás, o Congresso sequer ofereceu à opinião pública a punição de parlamentares com culpa comprovada no caso do "mensalão", quase todos absolvidos pelo plenário da Câmara, nem debateu medidas que pudessem efetivamente estancar a sangria dos cofres públicos.

A Polícia Federal, com todas as restrições que se possa fazer à sua pirotecnia, vem produzindo largamente fatos que fogem ao controle dos políticos. Não poderia ser diferente. A PF se profissionalizou e tem liberdade para trabalhar. E inevitavelmente produzirá escândalos políticos: afinal, a corrupção está arraigada nas instituições políticas brasileiras.

Nos dois anos anteriores à reeleição do presidente Lula, quando um escândalo atingiu em especial a base de apoio do governo, a oposição pôde, com facilidade, particularizar o crime, circunscrevê-lo à órbita do Executivo e dos partidos que o apoiavam. A Operação Navalha, contudo, trouxe a público todos os ingredientes da política tradicional brasileira, que podem atingir qualquer agremiação política: uma empresa que presta serviços a governos, com indícios de fraudes em licitações, deputados e senadores que declaram-se obrigados ao lobby junto aos diversos ministérios ou programas para levar recursos para as suas regiões e governadores e prefeitos eleitos. Do lado dos governos, a rede se completa com os serviços de lobistas privados e funcionários que estão dentro dos ministérios e ocupam os famosos "cargos de confiança" - um terceiro escalão vital para o esquema. Aliás, apenas quando um caso desse vem à tona é possível entender por que os governistas brigam tanto por essas indicações.

O debate anticorrupção invadiu agora a seara partidária e incluiu o debate sobre a reforma política. É, de qualquer forma, um reconhecimento de que é esse o sistema que move a política brasileira, faz maiorias parlamentares para os governos que se sucedem no poder, financia eleições e também enriquece pessoas. Por trás dele, sempre existem interesses de empresas que prestam serviços a governos.

As questões colocadas na mesa como antídoto para relações políticas promíscuas e corruptas podem, no entanto, se constituir naquelas respostas rápidas que tocam superficialmente o problema. Colocou-se como o bode expiatório da vez as emendas das bancadas. Na época da CPI do Orçamento, uma das medidas tomadas para evitar a manipulação orçamentária foi restringir o valor das emendas individuais e aumentar o das emendas das bancadas, sob o argumento de que o "coletivo" deteria parlamentares corruptos. Os R$ 6 milhões para emendas individuais, dizia-se, não justificaria a ação corruptora de lobbies privados.

Outro tema que veio à tona agora foi a reforma política - com uma aceitação mais ampla do financiamento público de campanha. Seria, sem dúvida, uma forma de desobrigar os partidos de compromissos com empresas que contribuem para os seus caixas eleitorais. Mas, lembre-se, o financiamento público era o que vigorava antes do impeachment do presidente Fernando Collor. O argumento para acabar foi o de que o dinheiro proveniente do financiamento público era irreal e, assim, como era inevitável um caixa dois para que os partidos fizessem frente aos compromissos de campanha, melhor seria legalizar o financiamento privado.

Quando se mexe na seara partidária, o problema também é que existem interesses tão divergentes em jogo, até internamente, que a aposta em qualquer mudança fica muito difícil. E, tomando os exemplos do passado, chega-se à conclusão de que a melhor medida anticorrupção é o controle do dinheiro público, a investigação por instituições profissionalizadas e a punição. Ainda falta muito para um controle efetivo dos orçamentos públicos. E falta agilidade à Justiça para julgar os indiciados nos inquéritos policiais