Título: Renan dirá que denúncia é pessoal para esfriar crise
Autor: Costa, Raymundo e Jaime, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 28/05/2007, Política, p. A7

O discurso marcado para as 15h30 de hoje será decisivo para determinar o futuro político do presidente do Senado, Renan Calheiros, acusado de usar recursos de uma empreiteira para o pagamento de uma pensão alimentícia. Os líderes dos partidos no Congresso avaliam que precisa dar respostas convincentes, o que não teria ocorrido com a primeira nota que divulgou ainda na sexta-feira passada. Do contrário será inevitável que tenha sua autoridade como presidente do Congresso questionada e até sofra um processo no Conselho de Ética por quebra de decoro.

O líder do DEM no Senado, José Agripino Maia (RN), classificou as denúncias como "graves" e pediu uma "resposta urgente" de Renan. "Ele pode dar a resposta no fórum que achar mais apropriado, seja no Congresso, seja na Justiça. Mas é preciso fazer isso rapidamente, porque as denúncias atingem-no pessoalmente e, por conseqüência, atingem o Congresso Nacional", afirmou.

O senador não pensa na possibilidade de um afastamento de Renan da presidência do Senado. "Não vou nem entrar nessa hipótese. Confio e espero que Renan dê uma resposta convincente", disse. Mas Agripino julgou a nota divulgada por Renan na sexta-feira "insatisfatória". Nela o presidente do Senado afirmou que nunca recebeu dinheiro de terceiros para pagar suas contas pessoais e familiares. "A nota não foi esclarecedora. É preciso que o discurso tenha elementos para encerrar este assunto, que é desgastante para ele e para a imagem do Congresso".

Cautela é o que recomenda também o líder do outro principal partido de oposição no Senado, o tucano Artur Virgílio. Ele também quer ouvir primeiro o que Renan tem a dizer, para avaliar os próximos passos do PSDB. O Palácio do Planalto também considera cedo para fazer uma avaliação sobre o futuro de Renan, um aliado estratégico do governo, mas não aposta que o incidente possa desestabilizar sua base de sustentação política no Senado. No PMDB, mesmo o senador Pedro Simon (RS), que ameça levar o caso para o Conselho de Ética do partido, também prefere esperar sob o argumento de que a revista autora da denúncia já errou em outras ocasiões.

Edição desta semana da revista Veja publica que a empreiteira Mendes Junior, por meio do lobista Carlos Gontijo, pagara R$ 16,5 mil a uma jornalista de Brasília com a qual Renan teve uma filha, atualmente com três anos, a título de pensão alimentícia (R$ 12 mil) e do aluguel de um apartamento. Além disso, Gontijo manteria um apartamento em um hotel da cidade para encontros reservados de Renan. Na sexta, Renan divulgou a nota que os senadores consideraram "insatisfatória"; no sábado, declarações de renda, que confirmam rendimentos de R$ 201 mil em 2005 e de R$ 435 mil em 2006 provenientes de atividade agropecuária. A reportagem afirmava que Renan não dispunha, com o salário de pouco mais de R$ 12 mil de senador, de rendimentos suficientes para pagar os R$ 16,5 mil recebidos pela jornalista até o inicio deste ano.

A estratégia de defesa de Renan deve ser a de tentar caracterizar a questão como um problema de natureza pessoal, ou seja, despolitizar o assunto. O presidente do Senado já ensaiou essa linha de raciocínio ao declarar ser " intolerável que de uma turbulência circunscrita à minha mais íntima privacidade se queira extrair ilações desarrazoadas e conclusões perversas."

É justamente por envolver uma questão pessoal que o assunto provoca tanta cautela entre os senadores. Além disso, ao contrário de antecessores seus no cargo, como os senadores Jader Barbalho (PMDB-PA) e Antônio Carlos Magalhães (DEM-BA), Renan não tem inimizades pessoais no Senado, como aliás eram ACM e Jader, que entraram numa disputa pessoal que levou à renúncia de mandato dos dois. Pelo contrário, Renan tem trânsito fácil em todos os partidos. No governo, o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um telefonema de solidariedade a Renan, no fim de semana, embora não tenha se comprometido a ajudar em sua defesa no Senado.

O temor dos aliados de Renan é com reações individuais, seja de concorrentes internos no PMDB, como o senador Pedro Simon (RS), ou insatisfeitos com a maneira como ele conduz os assuntos do partido, como Mão Santa (PI). Ou de "franco-atiradores", como classificam os senadores Jefferson Pérez (PDT-AM) e Eduardo Suplicy (PT-SP), sempre inflexíveis quando o assunto em pauta é a ética. Na quarta-feira, o Senado instala e elege os dirigentes de seu Conselho de Ética

Na Câmara, o tom é bem menos ameno. "É uma denúncia muito grave. O senador merece que nós tenhamos cuidado na análise. Mas o Democratas não tem compromisso com o erro e a resposta precisa ser muito convincente", disse o líder do DEM naquela Casa, deputado Ônix Lorenzoni (RS). "Se as denúncias se confirmarem, elas são incompatíveis com a manutenção do cargo de presidente do Congresso Nacional, pelo menos", disse o parlamentar.

O líder do PSOL na Câmara, Chico Alencar, segue a mesma linha de Ônix. "A reportagem mostra relações perigosas que deixam em dúvida a isenção do senador. É necessária uma investigação cuidadosa. Ou o Renan demonstra logo que tudo não passa de invenção, ou não tem mais sustentação para continuar na presidência do Congresso, no mínimo, durante a investigação", disse o parlamentar.

Agripino, Ônix e Alencar concordam que o episódio de Renan fortalece ainda mais a necessidade de abertura de uma CPI para investigar as denúncias envolvendo a Operação Navalha. "Essa denúncia se soma às demais. Depois que o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), trouxe a crise para dentro do Congresso, quando pediu o inquérito da Polícia Federal, a CPI se impôs", afirmou o senador. "Não tenho dúvida de que aumenta a necessidade de fazermos a CPI. É imperioso que ela seja instalada", disse Ônix. "O local para se fazer uma investigação sobre essa questão é em uma CPI mista de deputados e senadores. A comissão que inquérito se torna mais clara a cada dia que passa", completa Alencar.