Título: Criar empregos por meio da tecnologia e inovação
Autor: Luiz Fernando Furlan e Roberto Jagu
Fonte: Valor Econômico, 28/12/2004, Opinião, p. A10

Hoje, a adequada seleção de políticas públicas sobre o uso e o acesso às tecnologias é determinante na definição do êxito de nossas sociedades. Essas políticas devem intervir em duas dimensões inter-relacionadas. A primeira refere-se à imperiosa necessidade de uma ampla "inclusão digital". A segunda, ao fortalecimento de nossa capacidade de gerar e desenvolver no Brasil as tecnologias de informação e comunicação, de aumentar a competitividade e o vigor da produção nacional de software e serviços correlatos, e de aproveitar o processo de expansão exponencial de comércio internacional associado. Para assegurar a obtenção desses resultados, a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE) incluiu software e semicondutores entre seus quatro setores prioritários, o que atesta a relevância atribuída as tecnologias de informação e comunicação (TICs). Sabemos que a inadequada distribuição do acesso às TICs provoca a aceleração e exacerbação dos diferenciais econômicos e sociais, no que vem sendo qualificado como "lacuna digital" ou "divisor digital". Esse diferencial se verifica tanto no âmbito internacional, entre países, como internamente em cada país, com os mais desiguais, como o Brasil, sendo os mais atingidos. A persistência desse diferencial provoca distanciamento crescente no nível de informação, educação e aptidão tecnológica entre países e entre cidadãos de um mesmo país. O Brasil está atento a essas transformações e seus impactos nas dimensões nacional e internacional. A primeira dimensão é mais relevante, porque contribui para acentuar a segunda. É absolutamente indispensável que o Brasil proceda a um rápido e abrangente processo de inclusão digital. Deixar às forças de mercado o equacionamento e operacionalização da "inclusão digital", por meio da ampliação da provisão de serviços e equipamentos é idéia tentadora, mas claramente insuficiente. O governo tem de agir em duas áreas fundamentais: assegurar infra-estrutura de ampla conectividade, e propiciar acesso aos excluídos. O desafio da ampla conectividade parece mais complexo e oneroso do que efetivamente é, pois o país já dispõe de diversas redes de alta capacidade - públicas, privadas e mistas-, com elevado índice de ociosidade, e que podem perfeitamente servir de eixos centrais ou backbones do sistema. Assim, as questões que se colocam, e sobre as quais se estão debruçando os Ministérios das Comunicações e do Planejamento e a Anatel, são duas: 1) encontrar o marco regulatório adequado para seu aproveitamento, que deve simultaneamente assegurar seu pleno uso, o adequado retorno aos investimentos privados e minimizar custos; e 2) complementar o sistema secundário, de forma a conectar a esmagadora maioria da população com a qualidade, confiabilidade e amplitude necessárias. A primeira questão, ainda que possa requerer algum investimento adicional, é fundamentalmente de natureza regulatória e contratual. A segunda, tampouco deve exigir gastos significativos, pois há diversas tecnologias disponíveis, já testadas em outros países, que permitem seu equacionamento a custos reduzidos, quando comparados aos benefícios gerados. Há estimativas de que se pode implementar essa rede complementar, de forma a assegurar amplo acesso a 93% da população brasileira, com investimentos inferiores a US$ 400 milhões.

Deixar para o mercado o equacionamento da "inclusão digital" é idéia tentadora, mas claramente insuficiente

A segunda parte da equação refere-se ao acesso da população mais carente, sem perspectivas realistas de ser atendida em termos de mercado. Para esses, há várias iniciativas em curso da sociedade civil, do setor privado e do setor público, nas esferas federal, estadual e municipal. O eixo das iniciativas é a rede telecentros. No âmbito federal, a Presidência da República coordena diretamente diversas iniciativas nesse sentido, como a Casa Brasil e o computador conectado. O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior também operacionaliza iniciativa relevante nessa área, mandatada pelo Fórum da Microempresa e Empresas de Pequeno Porte. São os Telecentros de Informação e Negócios (TINs). A iniciativa visa reduzir a indisponibilidade de acesso à computação, à internet, e à informática como um todo, dos microempresários, de forma a aumentar sua competência e competitividade e reduzir a tão acentuada taxa de mortalidade dessas empresas. É também uma fonte sustentável de ampliação acelerada do processo de inclusão digital, pelo poder multiplicador dessas empresas em sus comunidades. Os TINs são viabilizados por uma extensa rede de parcerias, que se estendem ao poder público, à iniciativa privada e às organizações não-governamentais. Essas parcerias refletem a necessidade de um amplo engajamento nacional, um mutirão ampliado, para superar o problema. Entre as parcerias já estabelecidas, nos dá grande satisfação a que entabulamos com o Exército Nacional, para a instalação de telecentros em 150 quartéis da corporação. No momento, estamos viabilizando, juntamente com a Suframa, o Ministério da Ação Social e outros parceiros, a instalação de telecentros em postos de fronteira do Exército na Amazônia, iniciativa que, além de seu impacto econômico-social, se reveste de grande relevância estratégica. Sem uma ação governamental decidida, a (r)evolução das TICs pode ampliar o fosso que separa países, nações e cidadãos. Com a adoção de políticas adequadas, contudo, temos um extraordinário instrumento de aceleração de capacitação individual, coletiva e nacional, que pode facilmente se constituir num atalho, numa aceleração de nosso processo de construção de uma nação mais próspera e equilibrada, social e economicamente.