Título: Futuro do plantio de milho no Paraná divide produtores
Autor: Lima, Marli
Fonte: Valor Econômico, 28/05/2007, Agronegócios, p. B12

Dilvo Grolli ocupou 30% de sua propriedade com o plantio de milho na última safra de verão, e pretende reservar 40% das terras para o grão na temporada 2007/08. Outro produtor, Décio Arnhold, decidiu ampliar o espaço dedicado à cultura de 40% para 50% de sua área. Atílio Maróstica vai na mesma direção, e o aumento previsto é de 25% para 30%.

Os três vivem no Paraná, maior produtor de milho do Brasil, e moram em cidades vizinhas no oeste do Estado. Mas, apesar da intenção comum de incrementar a aposta no milho, eles têm motivações distintas e traçam cenários também diferentes ao programar a safra. Um vê na "febre do etanol" uma ótima oportunidade para ganhar dinheiro. Outro se sente forçado a plantar mais para garantir ração em conta para os animais que cria. Para o terceiro, trata-se de uma questão de vocação.

Tendo em vista a notória desarticulação da cadeia do milho no país, o horizonte aberto pela valorização da commodity - com a maior demanda para a fabricação de etanol nos EUA as cotações internacionais subiram 80% no primeiro quadrimestre em relação ao mesmo período de 2006, enquanto no Paraná os preços estão 30% mais altos - pode, segundo especialistas, fortalecê-la e torná-la um produto regular de exportação. Nesse processo, que prevê maior integração entre produtores, cooperativas, agroindústrias e tradings, também a oferta doméstica poderia ser melhor programada e negociada, com o incremento de vendas antecipadas da produção e maior interesse em mercados futuros.

O Valor identificou esse otimismo em vários produtores paranaenses visitados na última semana. Mas também encontrou muitos que, vacinados contra o "agora vai!", estão desconfiados. Se para alguns o aumento de 33% da área destinada ao milho safrinha (cultivado no inverno) no Estado este ano indica que a aposta no grão tende a crescer, para outros significa o contrário. Para esse grupo, qualquer queda brusca de preços causada pelo aumento da oferta pode tirar o fortalecimento da cadeia dos trilhos, e assim os produtores continuariam a sobreviver de "soluços" muitas vezes ligados a valorizações ligadas ao clima.

Dilvo Grolli é presidente da Coopavel, cooperativa de Cascavel. Ele cultiva 180 alqueires (435,6 hectares) e considera que o milho é "a bola da vez", porque está com preço melhor, teve aumento de liquidez e tem mais espaço para elevar a produtividade. Segundo pesquisas apresentadas pelo produtor e dirigente, com tecnologia é possível aumentar a produtividade média do grão de 6,6 mil quilos por hectare para 12,9 mil na região. Em idênticas condições, a da soja só poderia passar de 3,3 mil quilos por hectare para 4,1 mil.

A Coopavel usa 70% do milho que recebe para a produção de ração destinada a seus criadores associados. Hoje o excedente é vendido no mercado interno, principalmente para agroindústrias do Paraná e Santa Catarina, mas o início da exportação não está descartado. E Grolli não teme aumento no custo de produção de aves e suínos com essa concorrência. "O preço da carne também vai reagir", acredita. De acordo com ele, na safra de verão a área de milho deve crescer de 10% a 15% no entorno de Cascavel, com recuos do cultivo de soja e da pecuária. "A produção de soja vai crescer no Centro-Oeste, mas na região Sul o aumento será de milho", afirma.

Décio Arnhold, dono de 10 alqueires e arrendatário de outros 2 na vizinha Toledo, pensa de outra forma. No verão passado, ele plantou 4 alqueires de milho e 6 de soja. Para o inverno, usou toda a área para o milho safrinha, mas também terá de comprar de terceiros, já que é suinocultor e tem vaca leiteira. "Estou penando e tive de ir esses dias ao médico, porque estou pagando para produzir suínos", contou. "Para mim, o aumento do preço do milho piorou a situação".

Foi esse aumento que estimulou Atílio Maróstica a destinar 50 de seus 285 alqueires em Cascavel ao milho safrinha. No ano passado, toda a área foi ocupada com aveia. Ele nunca plantou mais milho do que soja na safra de verão, mas na temporada 2007/08 dividirá sua área em partes iguais. No ciclo 2005/06, o milho ficou com 25%, e em 2006/07 com 30%. Mesmo assim, garante que essa intenção nada tem a ver com as projeções atuais dos analistas. "O milho é uma paixão do produtor, é uma cultura linda", derrete-se.

Na disputa por terras no Paraná, contudo, há outros fatores na equação que resulta no plantio de milho ou soja no verão. O fator clima, por exemplo, tem especial relevância, e é preciso lembrar que o milho não é muito amigo de noites quentes. "A transição da soja para o milho, se existir, será lenta", afirma Nelson Paludo, presidente do Sindicato Rural de Toledo. Para isso, ressalta, também é preciso ampliar investimentos em novos equipamentos, sobretudo para a colheita, e acabar de vez com as incertezas que cercam os transgênicos no Paraná, já que o governo estadual é frontalmente contra os organismos geneticamente modificados (OGMs).

O coordenador técnico da regional de Toledo do Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria da Agricultura do Paraná, João Luis Nogueira, é outro especialista que não acredita em grandes alterações no perfil da safra estadual nos próximos anos. Na região de Toledo, que inclui 20 municípios, está 26% da área destinada ao milho safrinha paranaense: são 356 mil hectares, de um total de 1,38 milhão plantados no Estado. O incremento foi de 64% na comparação com o ano passado.

Na opinião de Nogueira, além de preço melhor do milho, o agricultor colheu a soja de verão mais cedo neste ano, não encontrou razões para plantar trigo por falta de política e decidiu usar terras que no inverno passado ficaram em pousio, e por isso aumentou a área de safrinha. "Só teremos mudanças significativas em 2007/08 se houver frustração na safrinha e o preço do milho melhorar muito". Na última safra de verão, 443 mil hectares na região foram ocupados com soja e 39 mil hectares com milho.

Já nas empresas que vendem sementes e recebem grãos, as fichas estão no avanço do milho. "Nossos técnicos estimam que a área de milho aumentará cerca de 50% em relação ao ano passado", contou o agrônomo Humberto Sacchi, da Sperafico Agroindustrial, de Toledo. Jorge Shimomura, que trabalha na cooperativa Coamo e preside a Associação dos Engenheiros Agrônomos do município, também acredita em redução da área de soja e pecuária, mas fala em aumento de 10% a 15% do milho. "Muitos que não plantaram milho no verão vão plantar em 2007/08. Os clientes que atendo pedem semente de soja e um pouquinho de milho", disse. "O pequeno produtor sempre planta milho para uso próprio, quem está mudando é o maior".

Mas nem isso pode ser usado como regra. Enquanto toma chimarrão na varanda, o produtor Celso Klein diz que vai plantar soja nos 8 alqueires que tem. "O agricultor não vai ganhar nada com o biocombustível", afirma. Noutra propriedade não muito distante, André Kunzler comenta que "tem muito milho plantado e o preço vai baixar". Seu "quase" vizinho, Marcelo Heck, não plantava milho no verão havia cinco anos. Ele cultivou 10 alqueires na temporada passada e 26 na safrinha. Gostou da experiência e vai repeti-la, mas também garante que não tem nada a ver com as projeções mundiais. "Não dá para se entusiasmar com o etanol, ainda".