Título: A volta das ofertas
Autor: Cotias, Adriana
Fonte: Valor Econômico, 28/05/2007, EU & Investimentos, p. D1

Lucrar com a venda de ações adquiridas em ofertas públicas iniciais (IPO, na sigla em inglês) logo na estréia virou uma loteria e o aplicador pessoa física já percebeu isso. Depois dos primeiros tropeços nas distribuições realizadas em março - com a queda de 12,5% de JBS Friboi ON na largada - a participação dos investidores individuais diminuiu consideravelmente. Agora, será a vez da Tarpon Investimentos, da incorporadora Inpar, da Log-In Logística Intermodal, subsidiária da Vale do Rio Doce, além da SLC Agrícola testarem a quantas anda o apetite desses aspirantes a acionistas minoritários por papéis novos.

O número de CPFs nas 21 operações realizadas este ano saiu de um pico de 24,4 mil no IPO da São Martinho, do setor sucroalcooleiro, no início de fevereiro, para os 5,3 mil na oferta da Agra Incorporadora, no fim de abril. Depois de quase dois meses de jejum de estréias na Bovespa, a nova rodada de IPOs coincide com um momento de volatilidade na bolsa, após o Ibovespa beirar os 53 mil pontos.

O prazo de reservas para a compra de Brazilian Depositary Receipts (BDRs, certificados de ações) da Tarpon termina hoje, numa operação que pode movimentar cerca de R$ 480 milhões. Já a Inpar vai acessar o mercado após a derrapada de concorrentes como a Even, JHSF Participações e CR2, com a venda de aproximadamente R$ 610 milhões em ações ordinárias (ON, com direito a voto). As reservas vão até sexta-feira. Desde que a Cyrela se repaginou para ingressar no Novo Mercado, em setembro de 2005, já são 20ª as ofertas públicas do setor imobiliário. Na sexta, também começa o período para participar dos lançamentos da Log-In (cerca R$ 690 milhões) e da SLC Agrícola (R$ 426 milhões).

Se há excesso de opções, mais criterioso tem de ser o investidor nas suas escolhas, porque o sucesso ou fracasso de uma oferta não significa necessariamente que as seguintes seguirão na mesma toada, diz o professor de finanças da Faculdade de Economia e Administração (FEA/USP) Rafael Paschoarelli. "As pessoas ficam impressionadas com a pujança da bolsa e entram no IPO sem fazer uma seleção técnica", afirma ele. "Mas a decisão de comprar ações nunca pode ser fruto da opinião do amigo, isso acabou.". Em tese, acrescenta, toda informação da empresa está resumida nos preços e, se há dúvidas se os papéis foram justamente avaliados, é melhor ficar fora e comprar depois, quando o mercado já fez a depuração.

A Even, que captou R$ 400 milhões no início de abril, é um exemplo. Foi a primeira a detectar o arrefecimento da demanda do estrangeiro em meio a uma emissão paralela de debêntures conversíveis em ações em favor de um dos sócios que venderia parte do controle no IPO. Depois de cancelar a venda secundária (de papéis do acionista vendedor) e diminuir a faixa de preços, as ações caíram 3,48% na estréia, mas hoje apresentam uma das maiores valorizações entre as ofertas públicas do ano, de 40,87%. A JHSF seguiu o mesmo caminho, cancelando a oferta de ações dos sócios e reduzindo o preço da ação no IPO e ganha 50%. Na liderança está, entretanto, a GVT, com 61,67%.

Avaliar o preço das debutantes com uma visão fundamentalista não tem sido tarefa das mais corriqueiras, diz o chefe de análise da GAS Investimentos, Roberto Knopfelmacher. "As premissas de crescimento que os bancos (coordenadores) colocam têm sido um pouco mais agressivas do que a gente se sentiria confortável para justificar a compra para os nossos fundos", diz. "É difícil enxergar com alguma margem de segurança se há mesmo potencial de valorização."

A depender daquilo que os múltiplos podem revelar, as empresas que estão chegando à bolsa continuam caras. O Preço/Lucro (P/L, a relação entre o valor de mercado e o resultado, que pode ser uma medida do prazo de retorno do investimento) da Inpar está em 103,55 anos, o da Tarpon em 82,59 anos, enquanto o da Log-In em 34,7 anos, segundo levantamento da Value Consultoria. "Os preços vão continuar altos, pois há ainda muito dinheiro sobrando na economia mundial e as opções de investimentos em renda variável no mercado brasileiro não são tantas assim", diz o sócio Rodrigo Pasin.

Na média, o investidor estrangeiro continua levando a maior fatia do bolo, com 71% dos quase R$ 12 bilhões em IPOs deste ano. Os pontos fora da curva foram os lançamentos da PDG Realty, com 93%, e do Banco Pine, com 90%. No IPO da Even e da São Martinho, o capital externo levou 53%.

Com o Brasil às vésperas de ganhar o "investment grade" (o selo de economia não especulativa) das agências de classificação de risco de crédito, mais aguçado fica o apetite do estrangeiro por empresas de crescimento na bolsa, diz o sócio da Integral Trust Francisco Turra. "E falta desenvolver a demanda dos fundos de pensão locais, ainda aplicados em títulos públicos, mas que terão de cumprir metas atuariais num outro ambiente (de juros mais baixos)."

A lista de IPOs não pára por aí. Em análise na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) há mais 25 operações, dos mais variados setores: há pelo menos mais quatro do ramo de construção civil, seis bancos, outra operadora logística, administração de shopping center, processadora de cartões, varejo e representantes da área industrial.