Título: Troca de postos acirra crise no BID
Autor: Leo, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 25/05/2007, Brasil, p. A4

Em meio a séria crise política com o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Luiz Alberto Moreno, o governo brasileiro fará uma troca de cadeiras nos postos que tem nos dois bancos multilaterais de desenvolvimento dos quais é sócio. Após garantir uma vice-presidência no BID para o economista Otaviano Canuto, hoje representante do país no Banco Mundial, o Brasil indicará, para o lugar de Canuto, o diretor do país no BID, Rogério Studart. Para a diretoria no BID será nomeado o atual secretário de Assuntos Internacionais do Ministério do Planejamento, José Carlos Miranda.

Moreno é apontado em Brasília como opositor da nomeação de um brasileiro para a vice-presidência do banco. O nome de Canuto foi definido após a rejeição, pelo presidente do BID, de outros nomes apontados pelo governo brasileiro. Os atritos em torno da vice-presidência começaram no fim do ano passado, logo após a saída de Joaquim Levy da vice-presidência de Finanças e Administração do banco, em processo desgastante no qual autoridades brasileiras viram o dedo de Moreno.

A diretoria de Finanças e Administração havia sido ocupada por outro brasileiro, João Sayad, que disputou com Moreno a presidência do BID. Com a saída de Levy, o presidente do BID anunciou uma reformulação nos órgãos de direção, o que significou a divisão de poder na vice-presidência. E anunciou que ocuparia o cargo com indicados por "head hunters". O anúncio foi recebido com irritação em Brasília, onde foi interpretado como sinal de que Moreno planejava fazer nomeações sem incluir nenhum brasileiro entre os vice-diretores.

A insatisfação brasileira foi comunicada a Moreno e ao governo dos EUA, maior acionista do banco. Emissários do presidente Luiz Inácio Lula da Silva argumentaram com Moreno - e com suas contrapartes no governo americano - que o peso do Brasil como o maior país da América do Sul e maior receptor de empréstimos do banco tornariam inconcebível a ausência de um nome ligado ao país em alguma futura vice-presidência.

Segundo um interlocutor do presidente Lula, nas conversas com representantes do governo George Bush, entre eles o embaixador dos EUA no Brasil, Clifford Sobel, autoridades brasileiras chegaram a apontar as ações de Moreno sem consulta aos governos dos sócios como uma das razões a impulsionar a idéia de criação de um Banco do Sul, proposta pelo presidente da Venezuela, Hugo Chávez.

Um exemplo de ação do presidente do BID, com reflexos sobre os interesses do Brasil na região, mas tomada sem comunicação ao governo brasileiro foi o anúncio, por Moreno, em abril, de que o banco lançaria um programa de financiamento à produção de etanol de cana-de-açúcar na América Central. O anúncio pegou de surpresa os ocupantes do Palácio do Planalto, porque coincidiu com o lançamento do Fórum Nacional dos Biocombustíveis, do qual se espera extrair um programa multilateral de investimentos e estudos para o uso do álcool combustível.

Moreno chegou a citar os esforços de cooperação do Brasil na região, o que não impediu que, em um encontro com a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, ouvisse uma crítica severa à decisão de lançar esforços paralelos do BID nesse campo, sem articulação com o governo brasileiro. Em Brasília, a iniciativa de Moreno chegou a ser vista como um esforço para credenciar-se com o Departamento de Estado americano - aliança fundamental para as pretensões do presidente do BID em eventual candidatura à presidência da Colômbia, seu país de origem.

O estilo gerencial centralizador do presidente do BID é criticado no governo brasileiro, que tem ameaçado reduzir a participação do Brasil nas operações financiadas pelo banco. O país é o maior mutuário do banco, a quem hoje paga mais pelos empréstimos passados do que recebe em créditos novos. No fim de 2005, chegava a US$ 9,6 bilhões o total da carteira ativa (financiamentos a projetos) do BID com o setor público no Brasil, e quase US$ 700 milhões os empréstimos ao setor privado.