Título: UE vê momento decisivo na sua relação com Brasil
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 25/05/2007, Internacional, p. A13

A Comissão Européia (UE), o braço executivo da UE, submeteu aos 27 países-membros e ao Parlamento Europeu a comunicação conferindo parceria estratégica ao Brasil, que deverá ser aprovada formalmente na próxima quarta-feira, dia 30.

O documento, ao qual o Valor teve acesso, avalia que a parceria ajudará a avançar a negociação do acordo de livre comércio UE-Mercosul e a estabilidade da América Latina. Para Bruxelas, a conclusão do acordo birregional está "intrinsecamente ligado" a progressos na integração política e econômica do bloco do cone sul, um processo no qual considera que o Brasil deve ter liderança importante.

A comunicação representa a visão européia da futura parceria. O Brasil apresentará sua própria visão. Parece claro que surgirão diferenças, as quais devem levar a um documento comum dentro de alguns meses. Na comunicação européia, até por aparente pressão de alguns países, sumiu o termo "agricultura". Em 12 páginas, não há uma só menção, apesar de o diálogo setorial ter sido praticamente acertado pelos dois lados, além de Bruxelas confirmar mais cooperação sanitária e fitossanitária.

A União Européia não poupa elogios e reconhecimento da importância do Brasil. Diz que sob a liderança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva o país emergiu como "um campeão do mundo em desenvolvimento" nas Nações Unidas e na Organização Mundial do Comércio (OMC). Chama o país é um "aliado vital" para a UE para resolver desafios globais como mudança climática, direitos humanos, questões econômicas e sociais.

Até agora, o principal foco do diálogo passava pelas questões UE-Mercosul. Mas, para Bruxelas, "chegou o momento de ver o Brasil tanto como potencial parceiro estratégico quanto como grande ator econômico latino-americano e líder regional".

O encontro de cúpula no dia 4 de julho próximo, em Lisboa, será um "momento decisivo" (turning point, no original em inglês) na relação bilateral. A parceria estratégica "significará assumir uma abordagem cooperativa nas relações econômicas e comerciais'', o que inclui um "forte compromisso" em direção à integração regional.

O reforço das relações econômicas e comerciais é um dos temas centrais da agenda comum proposta por Bruxelas, tanto mais que o Brasil é o mercado mais importante para seus exportadores, representando um terço do comércio da União Européia com a região.

Nota também que, embora não tenha ainda acompanhado as taxas de crescimento econômico da China ou da Índia, o Brasil tem potencial, "com enormes recursos naturais, renomados cientistas e excelentes acadêmicos, ampla diversidade industrial e um vasto mercado interno".

A UE é ainda o maior parceiro comercial do Brasil, com 22% do comércio total do país. No entanto, o Brasil só conta por 1,8% das trocas da UE. Dos Bric, o Brasil é o que atraiu mais investimentos diretos europeus, que totalizam 76,3 bilhões de euros no país.

A UE quer ampliar os negócios tanto através da Rodada Doha como pela negociação UE-Mercosul. Aponta alto nível de proteção nos mercados de bens e serviços no Brasil, mas não comenta as críticas brasileiras sobre o protecionismo agrícola europeu.

Bruxelas "encoraja" o Brasil a reduzir as barreiras tarifárias e não tarifárias, a fazer reformas econômicas e a estabelecer um quadro regulatório estável para as suas empresas.

A futura parceria parceria UE-Brasil é assim vista por Bruxelas como uma oportunidade para discutir questões que complementarão o debate UE-Mercosul. Por exemplo, nas áreas de propriedade intelectual, política industrial, cooperação nas áreas de regulamentações e também na área sanitária e fitossanitária (SPS).

Evitando como a peste mencionar o termo "agricultura", a Comissão Européia quer também ampliar consultas sobre condições sanitárias e fitossanitárias, que podem afetar o comércio. Assim, reforçar a relação política com o Brasil, que representa quase 80% de todo o PIB do Mercosul, "só pode ser benefício para ampliar a relação União Européia-Mercosul", o que considera especialmente relevante porque o o bloco do cone sul passa por "fase difícil".

Bruxelas nota que o Mercosul ainda tenta completar aspectos da integração econômica, como a própria união aduaneira, e constata "o crescente sentimento nos formadores de opinião" em todos os países do bloco de que este precisa reforçar sua ambição e efetividade para desenvolver sua dimensão política externa.

Articulações de setores industriais na Europa também já se refletem no documento. A União Européia confirma que a primeira "EU-Brasil Business Round Table" está prevista em paralelo ao encontro de cúpula político em Lisboa. Os empresários querem colocar mais substância econômica na parceria.