Título: Múltis investem em eólica no Brasil
Autor: Capela, Maurício
Fonte: Valor Econômico, 24/05/2007, Especial, p. A16

O estudo tem alguns anos, mas seus números ainda são bastante atuais. Concluído em 2001, o Atlas do Potencial Eólico Brasileiro, elaborado pela consultoria Camargo-Schubert para o Ministério de Minas e Energia, não deixa dúvidas de que o país possui um gigantesco potencial de energia eólica. Afinal, são 143,4 gigawatts (GW) distribuídos pelas cinco regiões do Brasil, o que, em outras palavras, equivaleria a cerca de dez usinas hidrelétricas de Itaipu, tomando por base sua nova capacidade de 14 GW.

Mesmo sendo difícil imaginar que todo este potencial vire usinas eólicas por aqui, o fato é que a iminência de o Brasil viabilizar 1,1 GW a partir da energia dos ventos (potencial que faz parte do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica, o Proinfa, coordenado pelo Ministério de Minas e Energia), já mexe com o mercado. E atrai investimentos porque 60% dos equipamentos precisam ser de produção local.

"Potencialmente, colocar esse 1,1 GW de pé consumiria R$ 5 bilhões de investimentos, sendo que 80% desses recursos seriam usados na aquisição de equipamentos e tecnologia", diz Odilon Camargo, sócio-diretor da Camargo-Schubert. Os 20% restantes seriam consumidos pelos gastos em infra-estrutura.

Portanto, é justamente o Proinfa, e não o potencial desse tipo de energia no país, que tem despertado o apetite de algumas multinacionais de equipamentos pelo mercado brasileiro. Cientes de que existe uma carência de fabricantes instalados na América Latina, algumas companhias já começaram a prospectar a região. O Valor apurou, por exemplo, que a argentina Impsa e a alemã Fuhrländer já estão construindo operações no país.

Até agora, somente a alemã Wobben Windpower, com sede em Sorocaba (SP), atuava por aqui. Isso, levando em consideração o equipamento completo, ou seja, das pás às torres. Com 11 anos de presença no Brasil, a companhia tem duas fábricas em operação - uma em Sorocaba (SP) e outra no Ceará, inaugurada em 2002.

"Sem dúvida, o Proinfa é importante", afirma Eduardo Lopes, gerente de vendas da Wobben. "Além disso, o panorama do mercado mudou e era o que precisava acontecer para o investidor se animar, com definição de tarifa e garantia de compra pela concessionária", completa o executivo.

Para a Wobben, contudo, o tempo de solidão acabou. Nuno Sá, diretor comercial do grupo alemão Fuhrländer para América do Sul, contou que a companhia está investindo R$ 20 milhões para erguer uma unidade na zona industrial de Pecém, no Ceará. A idéia é produzir equipamentos que equivalem a uma capacidade de energia eólica entre 300 megawatts (MW) e 600 MW.

José George Lima, assessor técnico da Fuhrländer no país, informou que a idéia é também atender os parques da companhia, sendo três em Aracati, com capacidade de 31,5 MW, 50 MW e 57 MW, e um na praia da Taiba, de 16,5 MW. Há também prospecção para projetos no Estado da Paraíba.

"Em uma fase inicial, vamos produzir as torres no Brasil e levaremos alguns componentes da Europa para o país. A nossa previsão é que a unidade esteja pronta ainda em 2007", afirma Sá. No mundo, a companhia espera faturar perto de 300 milhões de euros neste ano.

Na Impsa, a exemplo do concorrente alemão, a idéia também é não apenas produzir equipamentos, mas ter projetos eólicos no país. A companhia argentina estuda ter empreendimentos para gerar energia desse tipo de fonte no Ceará e também em Santa Catarina. O primeiro terá uma capacidade de 100 MW, enquanto que a segunda empreitada beira os 217 MW.

A empresa, que além de ter tecnologia própria, também mantém acordos de cooperação com companhias européias, está erguendo uma unidade no Recife (PE). A idéia é que a operação produza 200 máquinas por ano, o que equivale a uma capacidade de 300 MW por ano. A Impsa, contudo, não revelou o investimento, mas o mercado aponta que a fábrica deverá consumir ao redor de R$ 20 milhões. O objetivo é atender inicialmente o Brasil, Argentina e América Latina, havendo uma possibilidade futura de se exportar para América do Norte e Ásia.

Já a Wobben instalou mais de 200 aerogeradores até hoje no Brasil, o que significa um total de 236 MW. Foram cinco usinas dentro do Proinfa, ou 209 MW, e a intenção é erguer mais duas neste ano e outras três em 2008.

Antes da criação do Proinfa, contudo, a Wobben praticamente só exportava a partir da sua operação local. Negociou equipamentos para a Argentina, Turquia, Índia e até Alemanha. Hoje, a tendência é que os negócios externos e no mercado local se igualem, mas a empresa não revela os dados.

O executivo da Wobben não tem dúvidas de que se o Brasil investisse com mais vigor em energia eólica, certamente teria toda sua capacidade já instalada. "O potencial eólico, levando em conta ventos iguais ou superiores a 7 metros por segundo é de 144 GW", diz, citando o Atlas do Potencial Eólico Brasileiro. "Trata-se, portanto, de um potencial absurdo", classifica. (Colaboraram Daniela Chiaretti e Samantha Maia, de São Paulo)