Título: ONU discute 'cyberguerra' em encontro no Brasil
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 24/05/2007, Empresas, p. B3

A ameaça da "cyberguerra" estatal, os chamados ataques informáticos deflagrados por um país contra outro, será um dos temas do segundo Fórum para Governança da Internet (IGF, como é conhecido em inglês), que as Nações Unidas vão promover no Rio de Janeiro entre os dias 12 e 15 de novembro.

O pano de fundo do encontro do Rio continuará a ser o confronto entre o Brasil e os Estados Unidos sobre a governança da rede mundial de computadores. Mas a recente troca de acusações entre a Estônia e a Rússia envolvendo a rede trouxe à atualidade um tema que inquieta o Brasil e boa parte da comunidade internacional: ser desligado da internet.

A Estônia está convencida de ter sido a primeira vítima de uma "cyberguerra" estatal. O governo dessa pequena ex-república soviética acusa a Rússia de ter deflagrado, na semana passada, ataques informáticos em massa contra seus principais sites de internet, incluindo os de instituições governamentais e financeiras, que quase deixaram o país fora da rede por um bom tempo.

Os ataques de "hackers", os piratas informáticos, multiplicaram-se nos últimos anos, desfigurando, saturando e substituindo sites de internet; propagando vírus etc. Mas esta é a primeira vez que um país acusa outro desse crime. A OTAN, a aliança militar atlântica, foi acionada pela Estônia para avaliar a situação.

O suíço Markus Kummer, secretário-executivo do Fórum para Governança da Internet, informou que o tema será examinado no Rio neste ano. No entanto, em reunião realizada ontem, em Genebra, fracassou a tentativa de fechar a agenda do encontro.

O Fórum para Governança da Internet é resultado da enorme briga ocorrida entre os Estados Unidos e boa parte do resto do mundo na Tunísia, em 2005. Todos saíram satisfeitos, incluindo o Brasil, achando que essa organização poderia conduzir a seus interesses.

O secretário-geral da ONU deu prazo de cinco anos para o IGF fazer "recomendações" aos países sobre o controle da rede. No primeiro fórum, realizado em Atenas em novembro do ano passado, a agenda incluiu muita coisa, menos a governança da rede mundial de computadores, para irritação de vários países em desenvolvimento.

Agora, a secretaria executiva do Fórum propõe que no Rio o debate continue concentrado em aspectos mais técnicos da governança, como abertura da internet, segurança (combate ao spam), diversidade (inclusão de outras línguas) e acesso (redução de custos). Os EUA e a União Européia apóiam essa agenda.

Ontem, porém, o Brasil, a China, o Irã, o grupo latino-americano e a Arábia Saudita disseram que está na hora de discutir a essência do Fórum.

A delegação brasileira reiterou que a gestão internacional da internet deve ser multilateral, transparente e democrática, com total envolvimento dos governos, do setor privado, da sociedade civil e de organizações internacionais. Para o Brasil, todos os governos devem ter papel e responsabilidade iguais para a governança internacional da internet e para assegurar a estabilidade, a segurança e a continuidade da rede.

Já os EUA mantiveram seu apoio à "liderança do setor privado na inovação e expansão da internet". Washington estima que o interessante pela rede se deve justamente ao fato de que ela tem sido descentralizada e impulsionada pelo setor privado, encorajando a criatividade individual, o acesso e o valor agregado.

O indiano Nitin Desai, assessor especial do secretário-geral da ONU para a questão, admite que está aumentando a pressão pelo debate político sobre o controle da internet, ao invés de limitar os encontros a discussões periféricas.

Ontem, o Brasil propôs a instalação de outro secretariado do Fórum, com representantes de todas as partes envolvidas, substituindo a organização atual, dirigida pelo suíço Kummer.

Além disso, o país quer que o encontro do Rio amplie a participação das nações em desenvolvimento no debate sobre a internet. Na reunião de Atenas, os representantes da América Latina e do Caribe representavam apenas 5% dos participantes.

Uma equipe das Nações Unidas irá ao Rio na semana que vem para acelerar as questões logísticas. A expectativa é de que mais de 1, 2 mil pessoas participarão do encontro. Resumindo os debates de ontem, Kummer disse que nada mudou, mas "os debates tiveram melhor qualidade" - ou seja, ninguém gritou contra o outro.