Título: Segurança é o elo mais fraco
Autor: Rizzo, Alana
Fonte: Correio Braziliense, 28/12/2010, Política, p. 6

Dilma Rousseff promete investir no setor, considerado uma das falhas do atual governo. Mas políticas devem ser repeteco das ações de Lula

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva encerra esta semana a sua passagem pelo poder, após oito ano no Palácio do Planalto, com índice recorde de popularidade. Segundo pesquisa CNI/Ibope divulgada em 16 de dezembro, 87% dos entrevistados aprovam a gestão do presidente, enquanto 80% classificam o governo de ótimo ou bom. Os significativos avanços na área social e na economia, por exemplo, puxaram esses índices para o alto. Mas alguns setores representaram pontos fracos do governo, como a segurança pública, que, segundo os institutos de pesquisa, é o campo mais mal avaliado da gestão petista. E caberá a Dilma Rousseff, que assume a chefia do Executivo federal a partir de sábado, cumprir a promessa de campanha e ampliar as ações voltadas para a área.

¿Entre os temas gerais que mobilizam aqueles que se preocupam com o país, poderíamos citar o meio ambiente, a imigração, a segurança, a judicialização, a educação, as tecnologias e a inovação produtiva. Nenhum deles, no entanto, opera de forma tão dramática um conjunto de externalidades quanto a segurança em seu viés público¿, afirma o presidente da Fundação Getulio Vargas (FGV), Carlos Ivan Simonsen Leal, no livro Segurança e cidadania. Para ele, o tema vincula-se à própria soberania do Estado e a seu monopólio sobre o uso legítimo da força.

E durante os oito anos que esteve à frente do país, Lula foi confrontado com crises sucessivas no campo da segurança pública, nas quais esse ¿uso legítimo da força¿ por parte do Estado foi testado nas ruas. Na mais recente, a operação no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, foram mobilizadas tropas federais, estaduais e municipais, numa luta pela retomada de territórios até então dominados por criminosos. A investida à comunidade estava sendo planejada há anos e foi antecipada com a onda de ataques que bandidos promoveram na capital fluminense há um mês.

A força-tarefa que atuou no Rio foi bem-sucedida, mas, em vários outros episódios, o aparato estatal revelou suas próprias fraquezas. Como na derrubada de um helicóptero da Polícia Militar, metralhado em 2009, no Morro dos Macacos, também no Rio, quando três policiais morreram. O caso foi emblemático para mostrar o arsenal em poder dos traficantes cariocas.

Os problemas com segurança, entretanto, não ficaram restritos ao Rio. Em 2006, a cidade de São Paulo ficou aterrorizada com os ataques da organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). No Ceará, um ano antes, uma quadrilha conseguiu roubar R$ 164,7 milhões do cofre do Banco Central em Fortaleza. E o Pará evidenciou, em 2007, a falência do sistema carcerário do país. No estado, uma menina ficou presa com 20 homens em uma cela, onde foi violentada sucessivamente. A superlotação carcerária no país, aliás, é questão crucial para o próximo governo.

Pronasci Em meio aos problemas espalhados por todo o território nacional, em março de 2007, dois meses após o início do segundo mandato do presidente Lula, Tarso Genro substituiu Márcio Thomaz Bastos no Ministério da Justiça e articulou o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci). ¿Foi preciso definir a intervenção do ministério numa questão nacional de extrema importância, que é a questão da segurança pública. Embora já se tivesse começado um trabalho positivo nesse sentido à época do ministro Márcio Thomaz Bastos, o governo não tinha uma proposta de renovação do paradigma da segurança pública no país¿, conta Genro, hoje governador eleito do Rio Grande do Sul.

O Pronasci se tornou bandeira para a disputa eleitoral de outubro. O orçamento do programa supera R$ 1 bilhão por ano, e, de uma série de iniciativas propostas, o modelo das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) adotado no Rio foi o que ganhou maior destaque.

¿Não somos ingênuos de achar que projetos como o Mulheres da Paz e o Reservista Cidadão vão resolver tudo. Eles são fundamentais, mas precisamos também ter o rigor técnico para poder enfrentar o crime organizado¿, pondera o secretário executivo do Pronasci, Ronaldo Teixeira.

Paralelamente à implantação do Pronasci, outro desafio do Ministério da Justiça foi reorganizar a Polícia Federal. ¿A PF estava hipervalorizada pela mídia, enquanto fazia ações contra pessoas do PT e do governo, e aquilo conferiu um caráter de espetáculo, do qual a mídia não só reclamava, como também estimulava. Mais tarde, quando a PF começou a prender mais pessoas, houve uma reclamação contra essa espetacularização. Correta, inclusive. Só que tardia¿, afirmou. Nos anos seguintes, a atuação da PF ficou mais discreta, exceto, segundo o ex-ministro, na Operação Satiagraha, que investigou o desvio de recursos públicos e prendeu vários banqueiros em 2008.

As crises acordaram o governo para a necessidade de se reestruturar as forças de segurança, e Dilma chega à Presidência requentando algumas iniciativas do governo Lula: ataque ao crime organizado, implantação de UPPs e de uma política penitenciária, entre outras medidas. Mas promete tomar para si a questão, reforçando o orçamento do Ministério da Justiça nos próximos anos. Resta saber se, ao fim da gestão de Dilma, a segurança pública continuará sendo um dos calcanhares de aquiles do governo federal.