Título: Mesmo com uma taxa de juro menor, Brasil segue atraente
Autor: Fariello, Danilo
Fonte: Valor Econômico, 24/05/2007, EU & Investimentos, p. D2

O mercado financeiro no Brasil aproveitou o momento de bons retornos e alta liquidez das bolsas de valores nos últimos anos para avançar alguns degraus no seu grau de desenvolvimento. Com isso, atingiu destaque entre os emergentes na oferta de ativos financeiros diferenciados, como ações de empresas com garantias de governança corporativa, papéis de mercado futuro com elevada complexidade e artifícios que permitem aos investidores peripécias impensáveis em outros emergentes. Esse novo ambiente institucional garante o Brasil como mercado atrativo mesmo com taxas de juros menores, diz Peter Douglas, fundador e principal sócio da GFIA, empresa de consultoria e gestão de "hedge funds" em Cingapura. Ele é especializado em mercados emergentes, mirando principalmente os mercados latino-americano e asiático.

O executivo virá ao Brasil no fim do mês para uma apresentação sobre riscos e desenvolvimento dos "hedge funds" globalmente, no 4º Congresso de Fundos da Associação Nacional de Bancos de Investimento (Anbid). Ele falou com exclusividade ao Valor por telefone, de Tóquio.

Douglas reconhece que os mercados emergentes funcionam em ciclos, que seguem a liquidez mundial, e que, em algum momento, poderá haver uma reviravolta e o período de alta será interrompido. No entanto, ele destaca que o Brasil ainda leva vantagem ante outros emergentes, porque a alta do preço das commodities ainda estão distantes de uma desvalorização. Além disso, o Brasil é a única economia emergente com juros ainda em queda, enquanto todas as outras estão elevando suas taxas. Isso aumenta o potencial de alta das ações do mercado interno. Na América Latina, a GFIA observa de perto também os mercados da Argentina e do Chile, mas Douglas diz que dá preferência ao Brasil, até por ser o maior mercado na região.

Com a queda maior da taxa Selic e o aumento da renda do brasileiro, Douglas prevê que os investidores nacionais poderão passar a investir globalmente. No início do mês, Banco Central e Comissão de Valores Mobiliários (CVM) regularam a possibilidade de fundos nacionais investirem em ativos no exterior. Por enquanto, os clientes da GFIA procedem apenas dos EUA e da Europa.

Douglas explica que os hedge funds são mais sofisticados que os fundos mútuos, ou seja, buscam papéis mais diferenciados, além de apenas ações e títulos de renda fixa, por exemplo. Portanto, para ele, os hedge fundos têm ocupado o lugar dos bancos em financiar setores produtivos em mercados emergentes. "Estamos nos tornando o novo sistema bancário, injetando recursos em operações agrícolas, comerciais e factoring, que os bancos não cobrem."

No Brasil, os fundos hedge externos e os multimercados locais costumam adquirir papéis como Cédula do Produto Rural (CPR), títulos futuros de produção agrícola ou mesmo títulos de securitização, que oferecem o financiamento à produção.

Há cinco anos, os "hedge funds" estavam interessados apenas em papéis mais líquidos dos mercados emergentes, para onde era destinada apenas uma pequena parte dos recursos disponíveis, conta o fundador da GFIA. "Esse cenário mudou", diz. Agora, os mercados passam por um período de bonança, com muita liquidez, e estão aproveitando esse momento para se sofisticar, principalmente no Brasil.

Ao citar em português os multimercados, mas com um sotaque inglês bem carregado, Douglas comenta que essa categoria de fundo apresenta desenvolvimento e características de gestão comparáveis aos "hedge funds" internacionais. O risco financeiro permanece o mesmo do passado, mas os riscos institucionais e regulatórios caíram bastante, avalia ao ser questionado sobre as normas do mercado brasileiro.

Douglas explica que dos US$ 43 milhões que a GFIA administra atualmente, US$ 20 milhões são investidos diretamente no Brasil. Ele aplica principalmente via fundos offshore, mas administrados por gestores locais, que considera bastante especializados. "Os controles de risco são extremamente bons e, para ganhar dinheiro no Brasil, é preciso olhar para isso e não descuidar."

O congresso da Anbid terá como tema a internacionalização do mercado brasileiro, abordando o fluxo de recursos estrangeiros para cá e o futura migração de dinheiro no caminho inverso.