Título: UE inclui a agricultura na parceria com o Brasil
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 23/05/2007, Internacional, p. A12

A União Européia (UE) definiu a sensível área da agricultura como um dos dez setores onde quer aumentar a cooperação com o Brasil, pelo estatuto de "parceiro estratégico privilegiado" que pretende conferir ao país. Já o comércio não foi incluído na parceria, pois os europeus procuram indicar que o tema continuará coberto pela negociação UE-Mercosul, que deve prosseguir de maneira paralela.

A inclusão da agricultura não significa negociação, mas o estabelecimento de um diálogo político de alto nível e mais estruturado, inclusive para prevenir crises diante do volume de exportações agrícolas do Brasil para o mercado comunitário.

A UE reconhece a agricultura como um aspecto crucial e sensível da relação bilateral. Para Bruxelas, o maior acesso dos produtos brasileiros ao mercado europeu vai implicar também cumprir ou ter padrões sanitários e fitossanitários (SPS, como são conhecidos em inglês) equivalentes aos europeus.

Os outros setores onde a UE propõe o diálogo, para que os dois lados cooperem mais também na cena internacional, são energia, políticas regionais, desenvolvimento sustentável e mudança climática, desarmamento e não-proliferação, temas sociais, transporte marítimo, educação e cultura, ciência e tecnologia e sociedade da informação.

Os termos finais do documento sobre a parceria estratégica continuavam sob escrutínio dos burocratas de Bruxelas (sede da UE). Pelo menos dois países queriam fazer mudanças, segundo uma fonte, que não quis entrar em detalhes.

O documento não fixa ainda a periodicidade das reuniões de cúpula entre as duas partes e nem as bases do diálogo mais estruturado na agricultura. Isso vai depender da resposta do Brasil, que virá depois do encontro de cúpula de 4 de julho próximo, em Lisboa, quando o presidente da Comissão Européia, José Manuel Durão Barroso, abordará o novo nível nas relações com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Por outro lado, o documento "Country Strategic Paper Brazil 2007-2013", que define a ajuda financeira da UE para o país, propõe adotar uma política "inovadora", com ênfase nas áreas ambiental e social.

O documento para os próximos sete anos, em exame pelos Estados-membros, constata que o modelo tradicional de cooperação mostrou seus limites, ainda mais distante do pouco volume de ajuda destinado ao Brasil.

Agora, em vez de enviar dinheiro - já pouco para projetos individuais -, a UE quer apoiar amplos programas que podem ter "efeito multiplicador" no país.

Bruxelas concentrará 30% dos fundos para a área ambiental, com prioridade na ajuda à redução do desmatamento da Amazônia. Para isso, a UE prefere se juntar a outros doadores internacionais, seguindo o princípio adotado para o Programa Piloto para Proteção das Florestas Tropicais do Brasil (PPG-7), que é considerado o melhor exemplo de cooperação internacional para encontrar soluções a um problema ambiental de dimensões globais.

Até o final de 2005, os recursos para o PPG-7 totalizaram US$ 470 milhões, numa experiência bem-sucedida, "apesar das dificuldades que o governo [brasileiro] mostra para definir-lhe as vias precisas de consolidação".

Os outros 70% serão destinados a estimular "trocas, contatos e transferência de know-how" entre a UE e o Brasil. Está prevista a criação de um Instituto de Estudos Europeus no Brasil.

A UE quer também atrair logo o Brasil para seu Programa Galileo, sistema de navegação por satélite concebido para fins civis, aberto à cooperação internacional e explorado em regime comercial. O Brasil já decidiu há cerca de um mês que vai participar, mas ainda não definiu em que bases. O programa passa por crise de financiamento.

No total, a UE destinará ao Brasil 61 milhões de euros para o período 2007-2013. Esse montante será complementado com recursos destinados ao Mercosul e à América Latina. O valor é irrelevante, mas os ministérios no país consideram suficientemente importante para certos projetos.

No total, a ajuda oficial de países ricos ao Brasil só representava 0,06% de seu Produto Interno Bruto (PIB) em 2003, segundo a própria União Européia.

Nos últimos tempos, alguns deputados europeus reclamaram que Bruxelas não deveria dar dinheiro ao Brasil, por ser a oitava economia do planeta e um enorme concorrente agrícola dos europeus. Mas a UE retruca que a cooperação precisa ser reforçada com um "país que é uma economia estável com espaço para melhoras, um poder político emergente tanto na cena regional como internacional, ainda uma sociedade desigual, embora os indicadores sociais tenham melhorado, e um país com um meio ambiente rico, mas frágil".

Para o professor Roberto Vecchi, da Universidade de Bolonha e membro da associação EU-Brasil, a UE procura a otimização dos recursos exíguos, que devem ser combinados por projetos de cooperação pensados em uma nova moldura. Luigi Gambardella, presidente da associação, destaca o projeto de criação no Brasil de um Instituto Universitário Europeu, para desempenhar uma função de difusão da cultura e dos conhecimentos europeus e também para afinar novas políticas de cooperação.