Título: Aos 70, com a corda toda
Autor: Fariello, Danilo
Fonte: Valor Econômico, 23/05/2007, EU & Investimentos, p. D1

Outrora considerados um fardo do ponto de vista financeiro para a família, os idosos de classe média e alta agora aparecem cada vez mais como colaboradores importantes no orçamento dos filhos e dependentes. Uma pesquisa mundial do Oxford Institute of Ageing, em parceria com o HSBC, mostra que, de alguma forma, os aposentados contribuem com a família enquanto podem. Motivações pessoais e culturais fazem com que, no Brasil, 93% dos brasileiros queiram ajudar com a renda familiar ao se aposentar. No mundo, essa parcela é de 70%. Segundo a pesquisa, o Brasil perde apenas para o Canadá em preocupação com o bem-estar das famílias. A pesquisa revela que 25% das pessoas próximas da aposentadoria ou já aposentadas, entre 40 e 79 anos, já dão algum suporte financeiro para amigos ou parentes.

Esses são alguns resultados do terceiro levantamento "Futuro da Aposentadoria", divulgado anualmente pelo HSBC. A pesquisa abordou 21 mil pessoas entre 40 e 79 anos, de classe média para cima. No Brasil, foram ouvidas 1001 pessoas nos grandes centros urbanos. "Percebemos que essas pessoas são ativas na aposentadoria e precisam de recursos para usufruir a vida nessa idade", diz Emilson Alonso, presidente do HSBC no Brasil.

Pelo levantamento, 71% das pessoas gostariam de trabalhar enquanto se sentirem aptas, conta Richard Jones, diretor global de previdência complementar do HSBC. "Não fazer nada é chato", resume ele. Segundo estimativas do IBGE, há atualmente cerca de 2 milhões de brasileiros com mais de 80 anos, número que chegará a 5,9 milhões em 2030 e a mais de 13 milhões em 2050. "O avanço da longevidade é algo que novo e o Brasil terá de se adaptar a isso mais rapidamente", diz Jones.

A intenção de continuar a auxiliar a família na terceira idade exige na prática maior preparo e planejamento hoje. As estimativas das empresas de previdência para a renda futura necessária para manter o padrão de vida do aposentado consideram uma redução nas despesas na fase de recebimento dos benefícios justamente porque o investidor não teria de arcar com gastos de filhos ou netos. Portanto, se quiser continuar auxiliando a prole, o participante terá de aumentar as contribuições antes.

Pessoas buscam saídas para as dificuldades dentro das famílias, lembra Renato Russo, diretor da Federação Nacional de Previdência e Vida (Fenaprevi) e vice-presidente de Previdência da SulAmérica, ao comentar a participação dos idosos no orçamento familiar. "A família reorganiza o equilíbrio de renda que o Estado não consegue manter sozinho."

Hoje vemos quatro gerações convivendo e se auxiliando mutuamente, comenta Russo. Os filhos saem de casa cada vez mais tarde e as família convivem com os mais idosos por mais tempo, diz o diretor da HSBC Vida e Previdência, Marcelo Teixeira. "A família ainda é um importante pilar na realização do brasileiro."

Favorece essa disposição o fato de as pessoas mais velhas estarem mais sadias do que nunca, lembra o diretor global do HSBC. "Os 70 anos são os novos 50", afirma Jones. Com esse aumento da expectativa de vida, se as pessoas com mais de 60 anos não participassem da renda, as comunidades e famílias como conhecemos desapareceriam, acredita.

Jones acha até mesmo que, com algum auxílio, a maioria das atividades exercidas por pessoas na faixa dos 30, 40 anos atualmente poderão ser executadas também pelas de 70 anos. "As pessoas mais velhas se sentem bem e aptas a executar diversos trabalhos." Pela pesquisa, 86% das pessoas com idade entre 60 e 79 anos se descrevem predominantemente como tendo uma saúde razoável, boa ou muito boa. Além disso, a maioria dos homens e mulheres de 70 anos não tem qualquer problema em exercer atividades diárias.

Conseqüência disso é o fato de muitos empreenderem trabalhos voluntários. Pelo levantamento, quase uma em cada dez pessoas no mundo entre 60 e 79 anos exerce algum tipo de contribuição voluntária à sociedade.

Curiosamente, o estudo revela que, antes de se aposentar, os brasileiros se preocupam mais com dinheiro do que depois. Na pré-aposentadoria, 50% dos entrevistados afirmaram que não têm grande preocupação com a disponibilidade de dinheiro. Depois de se afastarem do trabalho, aumenta para 60% a parcela dos despreocupados com o quesito.

Mas eles admitem que o padrão de vida diminui quando saem do mercado de trabalho. Conforme o levantamento, comparado a países como Estados Unidos, Canadá e México, o Brasil é o país que mais sente a redução do padrão de vida após a aposentadoria. "Precisamos gerenciar melhor nossas expectativas", diz Teixeira, do HSBC.

Conforme envelhecem com mais saúde, os idosos querem ter cada vez mais opções ao se aposentar, diz Jones. "Por isso a necessidade de se preocupar cedo com a aposentadoria", comenta.

Com base no aumento da expectativa de vida e na percepção de que as pessoas querem trabalhar por mais tempo, os responsáveis pelo estudo prevêem que as pessoas tenderão a se aposentar mais tarde do que se pensam atualmente. Talvez depois dos 70, 75, dizem. "Aposentar-se cedo com uma renda parcial não é vantagem para ninguém", diz Jones. Se alguém se aposentar cedo, será porque quer buscar outro trabalho, ou seja, permanecerá em situação relativamente similar, observa Teixeira. (colaborou Bianca Ribeiro, do Valor Online)