Título: Emprego aumenta mais na grande indústria
Autor: Salgado, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 31/05/2007, Brasil, p. A3

A conjunção de câmbio valorizado, concorrência de importados e aquecimento do mercado interno está fazendo com que as grandes empresas aumentem seu peso dentro da estrutura do mercado de trabalho da indústria. Segundo estudo da LCA Consultores, com base no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), 23,3% dos 147,3 mil empregos formais abertos estão concentrados nas empresas com mais de 500 funcionários. Em 2006, esse valor era de 10,6%. Em contrapartida, as micro e pequenas empresas, com até 99 empregados, perderam participação no bolo. Ao invés de terem 54,7% dos novos empregados, como ocorreu em 2006, o percentual foi para 47,2%.

As empresas de maior porte, normalmente, têm mais mecanismos de proteção, como facilidade de acesso ao crédito, maior possibilidade de investimentos, maior poder de barganha com seus fornecedores e maior acesso a importações, o que tende a torná-las mais eficientes em um cenário de apreciação cambial.

Por conta disto, em alguns setores industriais em que as vendas externas representam boa parte do faturamento, existe uma boa possibilidade de, em um cenário de apreciação prolongada do câmbio, as maiores empresas apresentarem mais fôlego e aumentarem sua participação no fluxo de mão-de-obra. E quando as pequenas não são exportadoras - caso de grande parte das empresas brasileiras - elas acabam também sofrendo com o câmbio, por meio da concorrência com importados.

O setor calçadista exemplifica esse cenário. Muitas empresas, especialmente do Sul do país, têm demitido funcionários e até mesmo fechado as portas. No entanto, nesse começo de ano, os dados do Ministério do Trabalho, que contabilizam apenas o emprego com carteira assinada, mostram que foram criadas 15,3 mil vagas neste setor entre janeiro e abril. É mais do que o dobro das 7,4 mil vagas geradas em igual período de 2006.

"Esses empregos não representam um aquecimento desse ramo, mas já há um processo de recuperação desde o último semestre do ano passado", explica Fábio Romão, economista da LCA. E essa melhora está concentrada nas grandes empresas.

Em 2006, a situação nas fábricas de calçados que empregavam mais de 500 pessoas era bastante ruim e sua contribuição para a geração de vagas foi negativa em 45%. Neste ano, o sinal se inverteu e elas foram responsáveis por 17% dos novos empregos. Já as microempresas vivem situação oposta. Mesmo tendo quase 50% de participação na abertura de vagas, é um número bem abaixo dos 98,8% verificados em 2006.

Em um outro setor, o de material de transporte, bem menos intensivo em mão-de-obra e pouco ancorado na demanda externa, a realidade é semelhante. As empresas produtoras de automóveis, caminhonetas e motos aumentaram em 285% a contratação de empregados nos quatro primeiros meses deste ano.

Ao mesmo tempo, o ramo desse setor que fabrica peças e partes para as montadoras - as autopeças - estão com um ritmo de contratação mais fraco. De janeiro a abril, abriram 7,1 mil postos. Foi um número superior aos 4,4 mil dos fabricantes de automóveis, mas significou um ritmo menos intenso, já que a alta em relação a 2006 foi de 69%.

Na divisão por tamanho de estabelecimento, as micro e pequenas empresas de autopeças tiveram, no começo de 2006, uma contribuição de 39,5% no fluxo de emprego, que despencou para 17,4% neste ano. Já as grandes aumentaram sua fatia de 32% para 62%. Uma das explicações para o desempenho pior das empresas menores desse setor está também no câmbio valorizado. Romão lembra que a quantidade de peças importadas nos produtos finais têm aumentado. "Ou seja, parte da produção nacional está sendo substituída por importados, cada vez mais baratos", explica ele.

Na avaliação de Romão, no curto e médio prazos, a menor participação das pequenas e médias empresas na geração de empregos não é tão preocupante. No entanto, em uma visão de longo prazo, esse movimento acende uma luz amarela para o mercado de trabalho da indústria. Se de um lado as grandes empresas estão contratando mais e vendendo mais produtos finais, alguns elos das cadeias produtivas (como o caso das autopeças) começam a se enfraquecer. Para ele, "essa impressão é fortalecida quando se olha para as projeções de crescimento da indústria e da economia brasileira." Enquanto a LCA espera uma alta de 4,4% no PIB em 2007, projeta expansão de 3,8% para a indústria. Além disso, ele lembra que as grandes empresas do país são poucas e embora unitariamente contratem muito, no total dos empregos, o peso das pequenas é maior.