Título: Pais tem 1 milhão de abortos por ano, diz estudo
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Fonte: Valor Econômico, 31/05/2007, Brasil, p. A5

Complicações decorrentes de abortos ilegais provocaram a hospitalização de cerca de 1,2 milhão de brasileiras nos últimos cinco anos, segundo relatório divulgado ontem pela Federação Internacional de Planejamento Familiar (IPPH, na sigla em inglês). De acordo com a pesquisa, as mulheres nordestinas recorrem ao aborto com o dobro da frequência na comparação com as mulheres que vivem no Sul do país.

"A proibição legal não elimina a prática do aborto, todo mundo sabe disso", afirmou Carmem Barroso, diretora da IPPF para o Hemisfério Ocidental. A lei brasileira só autoriza o aborto em poucos casos, como estupro e risco à vida da gestante. O relatório da entidade, baseado em dados do Ministério da Saúde, é divulgado duas semanas depois de o papa Bento XVI condenar a prática do aborto durante a visita ao Brasil.

O relatório estima que ocorram 1 milhão de abortos por ano no Brasil -incluídos os espontâneos e as interrupções ilegais da gravidez. A cada 100 mil crianças nascidas vivas, cerca de cinco mulheres morrem devido a procedimentos inseguros.

Todos os anos, cerca de 230 mil mulheres buscam atendimento do SUS devido a complicações como hemorragias e perfuração do útero ou da parede vaginal. Mulheres negras, indígenas e pobres recorrem ao aborto em níveis desproporcionais, segundo a médica Maria José Araújo, participante da comissão de especialistas que apresentou o relatório.

O número de procedimentos inseguros em adolescentes e mulheres muito jovens também está crescendo, disse Maria José. Quase 3 mil meninas de 10 a 14 anos foram hospitalizadas com complicações pós-aborto em 2005, segundo o estudo. Entre as mulheres de 15 a 19 anos, mais de 46 mil precisaram de atendimento.

Carmem disse que a IPPF é a favor de um programa que ofereça informação e aconselhamento a grávidas, mesmo que o aborto permaneça ilegal no Brasil.

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, renovou esta semana seu apelo para que o tema seja amplamente debatido. "Essa questão tem que estar inserida em política mais ampla de planejamento familiar. Caberá ao Congresso Nacional definir se haverá mudança na legislação sobre o tema", disse Temporão segunda-feira, durante a cerimônia de lançamento do novo programa de planejamento familiar, que reduz os preços de anticoncepcionais e incentiva os homens a aproveitarem a vasectomia gratuita na rede pública. "O governo está colocando a questão nos eixos para que as mulheres possam decidir."

Segundo o relatório, 46 milhões de abortos intencionais são realizados mundialmente a cada ano, dos quais 78% em países em desenvolvimento e 22% em países desenvolvidos. Outros 31 milhões de gestações são interrompidas espontaneamente ou resultam em fetos natimortos. Ou seja, 77 milhões de bebês deixam de nascer por causas naturais ou induzidas.

Ao todo, 211 milhões de mulheres engravidam por ano, das quais 87 milhões de forma involuntária. A América Latina concentra 17% dos casos de aborto em todo o mundo, atrás apenas da África, que responde por 58%. Os abortos clandestinos são a quarta causa de morte materna no Brasil, segundo o estudo. (Agências noticiosas)