Título: Investidor mais consciente
Autor: Cotias, Adriana
Fonte: Valor Econômico, 31/05/2007, EU & Investimentos, p. D1

Diante do desafio de criar mais competição nos investimentos voltados para o varejo, proposto pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a Associação Nacional dos Bancos de Investimentos (Anbid) escolheu a via da auto-regulação. Ontem, o presidente da entidade, Alfredo Setúbal, entregou ao presidente da CVM, Marcelo Trindade, um conjunto de medidas que têm o objetivo de munir o investidor da rede bancária de informações para uma escolha mais consciente de como fazer a sua poupança, seja por meio de fundos, caderneta ou certificados de depósitos bancários (CDB).

A criação de centrais de atendimento exclusivas para investimentos, tanto para o gerente das agências quanto para o cliente de varejo, é uma das propostas que serão redigidas nos próximos meses pela recém-criada Comissão de Distribuição de Produtos de Varejo da Anbid. Os funcionários dessas centrais terão de ser certificados com uma nova série de exame, o CPA-30, que vai qualificá-los como "especialistas em investimento". A exemplo do quadro de tarifas bancárias, as agências terão de fixar cartazes com a descrição de todos os seus produtos de investimentos, incluindo informações como taxas de administração e valores mínimos de aplicação. E, na internet, os sites dos bancos terão uma área reservada ao tema, como uma quantidade mínima de informações.

"Muitos bancos já têm centrais dedicadas a investimentos e informações no site relativas ao assunto, mas a idéia é levá-las para o nível mais alto", disse Setúbal. Ontem, em contato com os diretores de distribuição das dez maiores instituições financeiras do país durante o 4º Congresso da Anbid, o executivo, também vice-presidente do Itaú, informou haver consenso sobre as medidas e que alguns bancos já estão trabalhando nas propostas. A previsão é de que, no acender das luzes de 2008, as regras estejam em vigor. O CPA-30 começa como recomendação, para depois virar exigência.

Se tais iniciativas vão contribuir para desconcentrar a atividade de gestão e administração de recursos em uma dezena de instituições, só o tempo dirá. Mas esse é um fenômeno que não é exclusividade do mercado brasileiro, alertou Trindade, da CVM. "Só nos países ricos, onde os investidores são mais conscientes, a concentração é um pouco menor." No fim de 2006, os dez maiores bancos brasileiros detinham 75% dos recursos administrados, replicando a concentração existente na atividade bancária tradicional. "Uma indústria concentrada costuma ser mais cara do que o necessário", disse. "No varejo, grande parte dos investidores prefere a placa do banco, por confiança, não dá para ir contra isso."

Mas se a credibilidade na marca não estimula a mobilidade, a informação talvez provoque alguma reação, argumentou Trindade. O lançamento do portal do investidor da CVM, na semana passada, com a comparação de taxas de administração, rentabilidade e valores de aplicação de 6 mil fundos é uma ferramenta que foi criada com esse intuito. É possível, por exemplo, estabelecer parâmetros como a aplicação mínima inicial com a taxa de administração máxima que o aplicador quer pagar. "Baixar as taxas cobradas é um processo de longo prazo, mas tendo informação o cliente pode acessar outros administradores e testá-los, aplicando um pouco aqui e ali."

A competição no setor de fundos se dará ainda pelo novo aparato regulatório, a partir da edição da instrução 450 da CVM, que já permite a aplicação de 10% do patrimônio em ativos no exterior (20% no caso dos multimercados) e também pelo cenário macroeconômico. Segundo Trindade, os gestores terão de estar afinados para lidar com um ambiente mais complexo que, em meio à redução dos juros, irá muito além do feijão-com-arroz dos papéis federais. "Eles aplicaram em títulos públicos durante anos cobrando 3% de administração, mas agora vão ter de fazer mais para obter resultados e ganhando menos."

A internacionalização permitida pela 450 abre ainda um canal para os gestores internacionais ciscarem no terreno brasileiro. Trindade informou ontem que a regulamentação para criação de fundos 100% investidos no exterior, tema já examinado em audiência pública, deve sair em algumas semanas, ampliando o processo. "Os estrangeiros vão aportar por aqui, lançando fundos espelhos, o que vai acirrar a competição e testar a qualidade de gestão da indústria brasileira", disse Trindade.

Num primeiro momento, a 450 não deve representar grandes mudanças na vida dos gestores, avaliou Setúbal, porque o mercado brasileiro ainda oferece boas oportunidades. "Em um, dois anos, a queda de juros ainda propiciará ganhos em títulos longos e a bolsa tem potencial de valorização, pois o Brasil está entrando num novo ritmo de crescimento, saindo da média de 2,5% para algo entre 4% e 5%." Ele pondera que, enquanto esse ambiente perdurar, a alternativa de diversificação lá fora será pela compra de cotas de fundos estrangeiros ou de ativos que permitam fazer hedge de posições locais.