Título: G-4 mantém divergências importantes para retomada de Doha, avalia Itamaraty
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 01/06/2007, Brasil, p. A5

O Brasil saiu com "otimismo moderado" de negociação com os Estados Unidos, União Européia e Índia, porque, apesar de alguns avanços, persistem "divergências importantes" para levar a um acordo na Rodada Doha. Foi como o subsecretário de Assuntos Econômicos do Itamaraty, ministro Roberto Azevedo, resumiu a reunião de quase três dias de altos funcionários do G-4, encerrada ontem em Paris. Foi a primeira de duas, preparando o terreno para a ministerial de 19 a 22 de junho, considerada decisiva para o futuro da negociação global de comércio.

Azevedo disse confiar em um entendimento até o fim de junho que leve ao desbloqueio da negociação global na OMC. "Não posso dar garantia de resultado, mas de empenho", afirmou, prudente. "Estamos trabalhando duro para que os ministros tenham a possibilidade de concluir o entendimento do G-4 em junho."

O representante brasileiro disse que o grupo está buscando o "melhor acordo possível", em meio ao crescente sentimento entre outros países de que só vai sair mesmo algo modesto em termos de liberalização agrícola e industrial. "Acordo modesto é aquele que não traz benefício para as partes", retrucou Azevedo. "Nenhum país vai conseguir o acordo que considera ideal, mas estamos na busca de um acordo possível, que traga o máximo de benefício para todos, e com o máximo de ambição."

O subsecretário deixou claro que "o Brasil não vai fechar acordo apenas para virar a página, queremos melhorar o sistema multilateral e diminuir as assimetrias que prejudicam os países em desenvolvimento". Azevedo insistiu que o Brasil trabalha unicamente com o cenário de entendimento em junho com os EUA, UE e Índia. Outros negociadores admitiram que houve algum avanço nas áreas agrícola e industrial, mas que os grandes números de cortes de subsídios e tarifas vão mesmo ser discutidos na reunião dos ministros.

Em Bruxelas, o presidente da Comissão Européia, José Durão Barroso, deixou uma mensagem clara: sem compromisso do Brasil e de outros emergentes de aceitar cortes reais nas tarifas aplicadas nas importações de produtos industriais, a UE não terá condições de submeter um acordo agrícola a seus 27 Estados membros para aprovação. Por sua vez, certos negociadores estimam que a UE, na impossibilidade de melhorar as concessões na área agrícola, procura desviar o foco da negociação para a área industrial, na busca de outros culpados.

Para Barroso, Bruxelas precisa obter vantagens importantes nas áreas industrial, de serviços, de indicações geográficas e de patentes, para que um acordo equilibrado ocorra em Doha. "Espero mais comprometimento do Brasil", disse Barroso. Ele acena com "esforço suplementar"' na negociação agrícola, desde que os parceiros façam a reciprocidade nos outros temas de interesse dos europeus.

Para Barroso, o grande problema atual de Doha é a resistência dos EUA em aceitar limitar mais os subsídios domésticos agrícolas. Segundo ele, o problema na área industrial também precisa ser resolvido, e aí são os emergentes que precisariam se mover. Ele acha que o Brasil "só tem a ganhar" com corte real nas tarifas de importação de produtos industriais, porque aumentaria a competitividade e reduziria ineficiência na economia.

A tarifa média industrial aplicada no Brasil fica por volta de 10% comparado ao que o país pode realmente adotar, que é 35%. Os europeus notam que a China investe cada vez mais em tecnologia, e é por aí que o Brasil também deveria estimular importações. Em Bruxelas, dirigentes não escondem o temor com o avanço chinês. Barroso parece ter ficado surpreso em suas viagens ao Brasil com o nível da resistência à abertura na área industrial, pelo que pode perceber em debate na Fiesp. (AM)