Título: Licença para usinas do Madeira está na "reta final", diz secretário
Autor: Rittner, Daniel e Romero, Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 01/06/2007, Brasil, p. A4

Sob pressão do Palácio do Planalto, o Ibama está a um passo de conceder a licença que atesta a viabilidade das usinas hidrelétricas do rio Madeira. Tanto a coordenação política do governo quanto a área ambiental deram todos os sinais de que o aval do Ibama pode sair a qualquer momento. "As negociações estão muito bem", afirmou o ministro das Relações Institucionais, Walfrido dos Mares Guia. O secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, confirmou que o processo "está na reta finalíssima" e disse que "a tendência é pela viabilidade" das hidrelétricas.

Para contornar a resistência do Ibama a emitir a licença prévia das usinas, pré-condição para colocá-las em leilão e construí-las a tempo de entregar energia a partir de 2012, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva envolveu-se diretamente no assunto. Na sexta-feira da semana passada, ele recebeu em seu gabinete técnicos contratados pelo consórcio Furnas/Odebrecht e pelo Ministério de Minas e Energia para discutir soluções aos problemas que inviabilizaram um parecer favorável do Ibama, em abril: o processo de sedimentação no leito do rio e a reprodução de peixes.

Lula ouviu atentamente as explicações, entre outros, dos pesquisadores José Galizia Tundizi e do indiano Sultan Alam (autoridades em sedimentação e reservatórios de hidrelétricas) e de um especialista de Itaipu que contou sobre a experiência da usina binacional com escadas artificiais que garantem a sobrevivência dos peixes. O presidente saiu convencido de que os ajustes feitos pelo consórcio responsável pelos estudos de impacto ambiental foram satisfatórios.

O Ibama e o Ministério do Meio Ambiente mostraram-se menos convictos e chegaram a sugerir a contratação de consultoria da USP para oferecer nova avaliação. Irritado, Lula encarou a proposta como ação protelatória da área ambiental e manteve a pressão.

Na área ambiental do governo, a avaliação predominante é de que seguidas declarações de Lula e as críticas do setor elétrico levaram a opinião pública a um engano quanto ao mérito da análise do Ibama. Não se trata, de acordo com fontes do Meio Ambiente ouvidas pelo Valor, de definir questões secundárias nem relativas pura e simplesmente a sedimentos e vida dos peixes.

Se a sedimentação for maior do que a prevista, explicaram essas fontes, pode haver risco de inundações do lado boliviano da fronteira em períodos de fortes precipitações, levando a problemas políticos. Já a questão dos peixes é mais ampla. Segundo técnicos, as duas espécies supostamente ameaçadas pela construção das usinas representam 70% do consumo de pescado na região.

A preocupação com o fornecimento de energia após 2010, no entanto, tornou-se prioritária dentro do governo. Para permitir a construção das hidrelétricas do Madeira a tempo de entrarem em funcionamento em 2012, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, deu o fim de maio ou o início de junho como limite. Juntas, as usinas em Rondônia - Jirau e Santo Antônio - terão capacidade de 6.450 megawatts.

O malabarismo para contornar os riscos de racionamento no início da próxima década ficou claro no edital do leilão previsto para 26 de junho, que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) divulgou ontem. Será vendida energia para atender as necessidades do país para 2012 e apenas duas novas hidrelétricas irão à licitação. Pior: trata-se de dois empreendimentos no Rio de Janeiro - Barra do Pomba e Cambuci - que totalizam apenas 130 MW de potência e "micaram" no leilão realizado em outubro do ano passado.

Orientada pelo Ministério de Minas e Energia, a Aneel colocou novamente em concessão o projeto das duas hidrelétricas. Houve alteração mínima de preço - que passou de R$ 125,41 para R$ 126 - e a incerteza ainda é grande: a licença ambiental prévia que permitia a entrada de Barra do Pomba e Cambuci no leilão de 2006 foi cassada e tem que ser renovada até hoje para que se possa incluí-las no próximo leilão.

Pelo menos uma boa notícia foi confirmada ontem pelo governo. A Advocacia-Geral da União (AGU) conseguiu derrubar liminar da Justiça Federal de Imperatriz que impedia o andamento das obras para a construção da usina hidrelétrica de Estreito, na divisa do Tocantins com o Maranhão.

Em sua decisão de liberar as obras, a desembargadora Assusete Guimarães, do Tribunal Regional Federal da 1 Região, alertou que o empreendimento é importante para "afastar novas crises no setor elétrico" e que não construir a hidrelétrica poderia "acarretar prejuízo ao meio ambiente, caso o governo federal tenha que lançar mão de energia termoelétrica". (Colaboraram Paulo de Tarso Lira e Thiago Vitale Jayme)