Título: Congresso aceita uso de terra indígena
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 01/06/2007, Brasil, p. A4

A notícia da finalização de projeto de lei pelo governo para regulamentar a exploração de terras indígenas por mineradoras, a ser encaminhado ao Congresso no segundo semestre, foi bem recebida por aliados, mas gerou disputa pela autoria da idéia. A proposta prevê licitações para mineração nas terras indígenas e o pagamento de royalties de no mínimo 3% do faturamento bruto dos empreendimentos às comunidades.

O senador Aloizio Mercadante (PT-SP), presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, autor de uma proposta de Estatuto das Sociedades Indígenas - elaborada em 1991, quando era deputado federal, e nunca votada no plenário da Câmara - cobrou do governo "respeito" ao trabalho legislativo de quase 20 anos. O texto não trata exclusivamente da exploração das terras indígenas, mas há um capítulo sobre o assunto.

"Se o governo quiser tratar do assunto, deve respeitar um trabalho legislativo de 19 anos. Deve levar em consideração propostas em tramitação, apresentar uma emenda e não simplesmente mandar um novo texto", disse. O petista afirmou que vai "ponderar" para que o governo tenha como base o projeto de sua autoria, ao qual foram apensados outros 18.

O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), ex-presidente da Funai, é autor de um projeto de lei específico sobre a exploração e o aproveitamento de recursos minerais em terras indígenas, aprovado na casa em 1996. Enviado à Câmara, passou por três comissões técnicas, mas também não foi submetido ao plenário.

Com a iniciativa do governo de elaborar e enviar novo projeto ao Congresso, Jucá procurou o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), para discutir a tramitação. Segundo ele, o texto do Executivo deverá tramitar como emenda ao seu projeto. A idéia é que Chinaglia constitua uma comissão especial e o relator altere o texto para encampar as modificações sugeridas pelo governo.

Jucá disse que, depois de tratar do assunto com o secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abromovai, concordou com as propostas do Executivo. A base das propostas é a mesma: licitações públicas, necessidade de autorização do Congresso e pagamento de royalties sobre faturamento bruto.

A principal mudança, de acordo com Jucá, é que a proposta do governo não concede direito de preferência para as solicitações de explorações em terras indígenas feitas antes de 1988, quando foi promulgada a Constituição, que proibiu a atividade. A proposta de Jucá dava preferência aos autores dessas solicitações na negociação com as comunidades indígenas. Não havendo acordo entre as partes, seria feita licitação pública.

Para explicar a necessidade da regulamentação, Jucá cita que as terras indígenas ocupam mais de 10% do território nacional. Ricas em minério, são ocupadas pela exploração predatória e danosa ao ambiente e às comunidades.

"O primeiro passo é submeter a demanda à comunidade. Se não for aceita, ela morre ali. Depois, é preciso um laudo antropológico da Funai e um levantamento ambiental e, por fim, um posicionamento dos órgãos do setor de mineração. Aí vem a licitação pública e a autorização do Congresso, que pode ser suspensa a qualquer momento, se houver riscos à comunidade", afirmou. Na proposta de Jucá, as comunidades afetadas terão poder de veto. No texto em elaboração no governo, não.

O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), que acompanhou a tramitação do projeto de Jucá, defendeu que, se novo projeto for encaminhado, outro debate seja realizado. Gabeira defende a regulamentação da exploração da mineração em terras indígenas, acreditando na existência de "exploração predatória, pela ausência de regras".

O senador Renato Casagrande (PSB-ES) afirmou que a regulamentação é importante para evitar que "gente de má fé explore a boa fé dos índios". O senador Siba Machado (PT-AC) é cauteloso. Segundo ele, há uma resistência grande na liberação da exploração de atividade mineradora em terra indígena, porque ela pressupõe a retirada de 100% da vegetação local.