Título: Montadoras buscam aliança para combater a China
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 04/06/2007, Brasil, p. A7

Sob o guarda-chuva da aliança política entre Brasil e Índia na Organização Mundial do Comércio (OMC), as empresas automobilísticas dos dois países negociam uma atuação conjunta na atual rodada de liberalização comercial, conhecida como Rodada Doha. O objetivo é enfrentar uma ameaça comum: os automóveis chineses. "A Rodada Doha vai abrir as portas para a China na América do Sul, afirma a vice-presidente da Associação Nacional dos fabricantes de Veículos Automotivos (Anfavea), Elizabeth Carvalhaes.

"Os chineses já fizeram contratos para começar a vender veículos prontos à África do Sul e mesmo pagando a tarifa de 30% vão oferecer as picapes e utilitários esportivos (S.U.V.s) mais baratos do país", diz, alarmada, Elizabeth Carvalhaes. "Não será difícil tentarem o mesmo na América Latina", diz ela, como argumento para impedir uma maior redução de tarifas de importação para produtos automotivos nas negociações da OMC.

Embora o mercado automobilístico seja ocupado por empresas multinacionais, hoje, tanto as montadoras européias quanto as americanas operam na América Latina, a partir de suas bases na Europa, segundo a executiva da Anfavea. Essa situação torna atrativa a abertura dos mercados do Mercosul para a União Européia, com maior integração entre as cadeias produtivas dos dois blocos econômicos.

A Anfavea e sua contraparte argentina, a Adefa, já estabeleceram uma lista comum de até 70 tipos de autopeças que poderia ter suas tarifas reduzidas a zero no prazo de implementação do acordo. Essa oferta seria feita assim que forem retomadas as discussões do acordo de livre comércio entre Brasil e Mercosul, o que pode ocorrer assim que se definir a rodada da OMC. "Estamos prontos para um acordo com os europeus, não queremos Doha, da forma como se vem discutindo", diz Elizabeth Carvalhaes. "Em troca da abertura em agricultura, o que está em jogo é, principalmente, a redução das tarifas na indústria automobilística", acredita. A aproximação com a Índia permitirá posições conjuntas na OMC e acordos de troca de autopeças, prevê.

Pragmática, a Marcopolo, hoje maior exportadora de carrocerias de ônibus do país, também vê na Índia uma possível aliada contra competidores chineses. O acordo firmado entre a brasileira e a indiana Tata Motors, da bilionária família Tata, deve fazer da Índia a maior produtora de carrocerias Marcopolo, com uma produção anual, a partir de 2012, de 25 mil ônibus com carrocerias Marcopolo e chassis Tata. Hoje, todas as unidades da Marcopolo, inclusive no Brasil, produzem anualmente 17 mil unidades. A partir de 2008, deve começar a produção da fábrica, no Norte do país, com cerca de mil unidades por dia. É uma participação ainda pequena no mercado indiano, que absorve 60 mil unidades por ano, na maioria com carrocerias de fabricação artesanal.

"Com o custo baixo de uma fábrica aqui, se formos atacados pela China podemos concorrer com vendas a partir da Índia", prevê o vice-presidente da Marcopolo, José Martins. O acordo com a Tata prevê exportações a terceiros mercados, após consulta entre os sócios. Detalhistas, os indianos levaram um ano nas negociações para o acordo, que, ao fim, garantiu para a Tata 51% das ações da nova empresa. A Marcopolo, que havia pensado, de início em cotas iguais para cada sócio, ainda assim considera vantajosa a sociedade. (SL)