Título: Em outros países, Justiça interfere menos nas decisões antitruste
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 18/06/2007, Brasil, p. A3

O Cade e o Judiciário precisam se aproximar e chegar a um entendimento sobre o papel que desempenham no julgamento de cartéis, fusões e aquisições. A conclusão é da presidente do Cade, Elizabeth Farina, que apresentou um estudo sobre o assunto durante a conferência da Rede Internacional de Concorrência, em Moscou, há duas semanas.

Para Farina, órgãos de defesa da concorrência de vários países estão mais atentos para o poder do Judiciário de rever suas decisões. Ela coordenou um estudo sobre a atuação da Justiça sobre as decisões dos organismos similares ao Cade em sete países: Brasil, Canadá, Chile, El Salvador, México, Espanha e Turquia. E verificou que a política de defesa da concorrência é resultado da relação entre os órgãos de defesa da concorrência e a Justiça local. "O Judiciário tem um importante papel no desenvolvimento da defesa da concorrência em várias jurisdições", afirmou a presidente do Cade, no estudo.

A Justiça pode auxiliar os "cades" a aperfeiçoar os seus processos de tomada de decisões, evitando irregularidades processuais, diz o estudo. "A interação com o Judiciário é mais efetiva quando todos os procedimentos judiciais são seguidos e as decisões (dos órgãos antitruste) são baseadas em análises econômicas claras e sólidas", afirmou a presidente do Cade.

Por outro lado, Farina fez um alerta: quanto maior o número de multas impostas às empresas e com o aumento de fusões polêmicas que desafiam os órgãos de concorrência, mais próxima será essa relação entre o Cade e o Judiciário. E, por conseqüência, maiores as oportunidades de o Cade se fazer compreender perante a Justiça e, com isso, defender suas decisões.

Os ministérios da Fazenda e da Justiça fizeram uma análise da possibilidade de recursos contra decisões dos "cades" em outros países e a conclusão é que o sistema brasileiro é o que mais favorece a demora na implementação das decisões antitruste.

Na Argentina, as decisões da Comission de Defensa de la Competencia só podem ser revistas na 2ª instância da Justiça e, de lá, apenas pela Suprema Corte.

Nos Estados Unidos, a Federal Trade Commission, quando conclui que uma fusão deve ser vetada, pede diretamente à Justiça para fazê-lo. A legislação americana permite a possibilidade de acordo entre as autoridades e as empresas. Se não há acordo, o caso vai necessariamente ao Judiciário, onde é possível recurso até a Suprema Corte.

Na Europa, as decisões são tomadas pela Diretoria Geral da Concorrência da Comunidade Européia. Há recurso ao Conselho da Comunidade apenas em casos excepcionais. As empresas podem recorrer ao Tribunal de 1ª instância das Comunidades Européias. E, deste tribunal, cabe novo recurso ao Tribunal de Justiça das Comunidades.

No Brasil, as fusões chegam ao Cade após análises das secretarias de Direito e de Acompanhamento Econômico dos ministérios da Justiça e da Fazenda. As empresas podem recorrer à Justiça durante toda a análise destas fusões e também para impedir os julgamentos pelo Cade. Após o julgamento do Cade, as empresas podem recorrer à Justiça Federal de Brasília (1ª instância). De lá, o caso pode ser levado à 2ª instância (TRF) e, depois, ao Superior Tribunal de Justiça. O Supremo Tribunal Federal nunca julgou uma decisão do Cade, o que não impede as empresas de levarem os seus casos à última instância da Justiça no país. (JB)