Título: Negócio poderia render US$ 5 bilhões à mineradora
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 18/06/2007, Brasil, p. A4

A venda da Ferteco pela Companhia Vale do Rio Doce poderia injetar entre US$ 4,5 bilhões e US$ 5 bilhões no caixa da mineradora, segundo estimativas de fontes do setor. Para esses observadores, não seria um mau negócio para a Vale caso ela seja obrigada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a se desfazer da empresa, uma mineradora integrada com ferrovia e porto comprada, em 2001, da ThyssenKrupp Stahl, por US$ 566 milhões.

Mesmo sendo uma boa opção na hipótese de a Vale ser colocada no "corner" pelo Cade, a venda da Ferteco poderá trazer para o Brasil um novo concorrente para a mineradora. Na avaliação das fontes, a disputa pela Ferteco tende a ser acirrada, envolvendo mineradoras, siderúrgicas e fundos de investimento em participações. Um consultor disse que, se for obrigada, o ideal para a Vale seria vender a Ferteco para a BHP Billiton ou RTZ, grandes mineradoras que controlam o mercado junto com a empresa brasileira.

O maior problema seria se a Ferteco fosse adquirida por um novo concorrente que entre para disputar mercado com a Vale, caso da MMX Mineração e Metálicos, empresa que tem parceria com a Anglo American. Uma fonte da siderurgia disse que a venda da Ferteco é mais interessante para o setor do que a perda do direito de preferência da Vale sobre os excedentes da mina de Casa Pedra, assunto que interessa mais à Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), dona da mina.

Os interessados, nesse caso, poderiam ser Gerdau, Arcelor Mittal e a própria CSN. A fonte disse que grandes grupos siderúrgicos estão verticalizando a produção para garantir acesso ao minério de ferro, matéria-prima na produção de aço. É o caso da Arcelor Mittal que tem meta de produzir 60% do minério que consome no mundo. A CSN, que vem brigando com a Vale em relação à Casa de Pedra, também teria interesse.

Há dúvidas se a siderúrgica de Volta Redonda (RJ) não enfrentaria restrições legais do próprio Cade ou de legislações em vigor, como a Lei dos Portos, se decidisse comprar a Ferteco. A CSN já tem um terminal para exportação de minério no porto de Sepetiba, no Sul fluminense, onde também há um terminal da Ferteco, e a lei proíbe que uma mesma empresa opere dois terminais no mesmo porto.

Outro ponto a ser considerado é o fato de que a CSN já é sócia da MRS Logística, a antiga malha Sudeste da RFFSA, e se comprasse a Ferteco, que também participa do grupo de controle da ferrovia, poderia ser obrigada a "esterilizar" (tirar o poder de voto) as ações da Ferteco na MRS, assim como a Vale já foi obrigada a fazê-lo.

Com duas minas de minério de ferro em Minas Gerais (Fábrica e Feijão), a Ferteco participa do grupo de controle da MRS, da qual tem cerca de 18% do capital votante. A MRS tem ligação direta para Sepetiba, onde a Vale é dona da Companhia Portuária Baía de Sepetiba (CPBS), usada para exportar minério. A empresa foi adquirida pela Vale quando da compra da Ferteco da Thyssenkrupp.

Uma fonte ligada à mineração disse que a venda da Ferteco estaria fora de questão. "Se tivesse que perder os anéis, não seriam esses [os ativos da Ferteco], embora Casa de Pedra também seja importante para a Vale." A escolha entre a venda dos excedentes de minério de Casa de Pedra ou da Ferteco faz parte de uma decisão do Cade, de 2005, que aprovou aquisições de mineradoras feitas pela Vale, mas impôs restrições. A Vale conseguiu liminares na Justiça e vem adiando a decisão determinada pelo Cade.

O advogado que representa a Vale no caso do Cade, Bolívar Moura Rocha, do escritório Levy & Salomão Advogados, reconheceu que o despacho da presidente do TRF de Brasília deixou a Vale desprotegida de liminares contra as restrições impostas pelo Cade, mas avaliou que a situação é transitória. A Vale aguarda a apreciação de um recurso especial no Superior Tribunal de Justiça (STJ) por meio do qual poderá ser reestabelecido o efeito suspensivo da decisão do Cade.

Segundo Rocha, a Vale ainda avalia se recorrerá ao Judiciário para ver atendido o seu direito de ter o assunto reapreciado pelo Cade, o que foi negado pelo órgão. Rocha disse que a empresa também poderia cumprir a decisão do Cade, embora reconheça que esta hipótese é remota enquanto a Vale entender que há caminho para defender seus direitos e de seus acionistas.

O advogado afirmou que a siderurgia brasileira está melhor servida com os excedentes de Casa de Pedra na mão da Vale do que em poder da CSN, "que já anunciou que exportará o minério". Um analista de siderurgia avaliou que, para a Vale, seria melhor abrir mão do direito de preferência sobre Casa de Pedra porque "o que a CSN produzir, [a Vale] terá que comprar ao preço de mercado. Ao passo que, com a Ferteco, obtém substancial margem de lucro em termos de geração anual de caixa".

Fonte da siderurgia avaliou que seria difícil mensurar um valor a ser recebido pela Vale, em caso de quebra do contrato de Casa de Pedra, já que, se a mineradora exercer a preferência sobre os excedentes da mina, terá que pagar o mesmo preço ofertado pelo cliente da CSN.