Título: Sem liminar, venda da Ferteco volta à discussão
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 18/06/2007, Brasil, p. A4

A Companhia Vale do Rio Doce está, desde a sexta-feira, sem decisões judiciais que a protejam contra as restrições impostas pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) do Ministério da Justiça. Com isso, o Cade irá escolher, em sua próxima sessão de julgamentos, marcada para o próximo dia 27, pela aplicação de uma entre as duas restrições impostas à Vale: a venda da mineradora Ferteco ou a perda do direito de preferência na compra de minério de ferro de Casa de Pedra, mina de propriedade da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN).

É provável que o Cade opte pela venda da Ferteco, pois esta seria uma determinação de mais fácil aplicação. Se o órgão antitruste optar pelo fim do direito de preferência, a Vale pode alegar que deveria ser ressarcida pela CSN. Essa alegação poderia inviabilizar, de imediato, a implementação da determinação, já que teria início um novo processo para a discussão sobre uma eventual indenização a ser recebida pela Vale da CSN.

O Cade impôs à Vale a escolha de uma dessas restrições ao julgar a compra de oito mineradoras pela companhia, em 10 de agosto de 2005. Mas, a Vale optou por recorrer à Justiça contra a decisão do Cade e, portanto, não fez escolha alguma.

A Vale obteve liminar que a desobrigava a seguir as determinações do conselho. Mas, a liminar caiu. Em março passado, a 6ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) de Brasília negou apelação feita pela Vale para anular as condições que lhe foram impostas pelo órgão antitruste. A Vale recorreu, então à presidente do TRF, desembargadora Assusete Magalhães. Ela suspendeu os efeitos da decisão do Cade apenas enquanto decidia se a companhia poderia recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Na sexta-feira, foi publicado no "Diário Oficial" o despacho em que a presidente do TRF responde à questão. Nele, Assusete conclui que a companhia não pode recorrer ao Supremo porque, segundo ela, a disputa com o Cade trata de aspectos infraconstitucionais.

A companhia questionou na Justiça o fato de as restrições terem sido impostas após um empate em três votos a três no julgamento do Cade. Para chegar a uma decisão final, o Cade computou o voto de sua presidente, Elizabeth Farina, como voto de desempate. A Vale sustenta que deveria ser convocado um novo conselheiro para votar. Mas, a discussão sobre o voto de desempate não é, na visão da desembargadora, uma questão que envolve a Constituição Federal e, por isso, não caberia ao STF julgar o assunto.

Por outro lado, a desembargadora entendeu que é cabível recurso da Vale ao STJ. Logo, a companhia deverá tentar suspender, no STJ, a determinação do Cade. E tentará fazê-lo até o dia 27, quando o conselho deverá escolher entre uma das duas restrições e pedir a sua imediata aplicação. O conselheiro Ricardo Cueva confirmou que, como a Vale não optou por uma entre as duas restrições, é o Cade quem irá decidir.

A Procuradoria do Cade calcula que a Vale está há mais de 500 dias descumprindo a decisão do órgão, tomada em 10 de agosto de 2005. Por isso, irá cobrar a multa junto à companhia, que deve ultrapassar R$ 50 milhões.

O procurador-geral do Cade, Arthur Badin, afirmou que, como a liminar que desobrigou a Vale a seguir as restrições caiu, é como se essa decisão nunca tivesse existido. Assim, para ele, a Vale deveria ter cumprido as restrições em 10 de dezembro de 2005, 30 dias depois de o Cade publicar a sua decisão no "Diário Oficial". O descumprimento gera multa de R$ 100 mil por dia. Daí, os R$ 50 milhões estimados por Badin.

Bolívar Moura Rocha, advogado da Vale neste caso, questionou a possibilidade de o Cade decidir pela empresa sobre a venda da Ferteco ou a perda do direito de preferência de Casa de Pedra. "Se o Cade quiser fazer isso, deve recorrer ao Judiciário", afirmou. Ele também criticou a aplicação de multa retroativa a 2005, o que para ele não faz sentido, já que a mineradora estava protegida por decisões judiciais que a desobrigavam a cumprir as determinações do Cade.

A Vale ainda poderá ingressar com outras medidas para evitar o cumprimento imediato das restrições. Ela poderá recorrer ao Judiciário contra a negativa do Cade a um pedido de reapreciação do caso. A negativa foi dada na quarta-feira passada. A companhia também pode pedir ao próprio Supremo para rever o entendimento de Assusete Magalhães e julgar o seu recurso. E há o recurso ao STJ. (Colaborou Francisco Góes, do Rio)