Título: Desmutualização cria expectativa sobre o preço das bolsas brasileiras
Autor: Torres, Fernando e Camaroto, Murillo
Fonte: Valor Econômico, 18/06/2007, Finanças, p. C2

Na esteira do processo de desmutualização e de abertura de capital da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) e da Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), crescem os questionamentos sobre quanto valeriam as duas principais bolsas brasileiras. Como ocorre em todo IPO, o número exato só será conhecido no momento em que elas lançarem suas próprias ações no mercado. A alta superior a 500% observada no preço dos títulos patrimoniais da Bovespa nos últimos 12 meses, por exemplo, indica que a bolsa de ações paulista valeria hoje cerca de R$ 5,2 bilhões. No entanto, a utilização do indicador de preço sobre o lucro (P/L) de empresas estrangeiras do mesmo setor revela cifras ainda maiores.

No exterior, as ações das bolsas de valores, de futuros e de mercadorias, como Nyse Euronext, Chicago Mercantile Exchange, Chicago Board of Trade (CBOT) e Nasdaq são negociadas com múltiplos de P/L que variam entre 34,59 a 55,07 vezes o valor de seus lucros, o que resulta em uma média de 45,96. Se utilizado este índice médio como parâmetro, o valor de mercado da Bovespa ficaria em cerca de R$ 9,2 bilhões, bem próximo ao da BM&F, de R$ 8,32 bilhões. Um ponto fora da curva entre as empresas do setor, a Nymex, que recentemente abriu o capital, é negociada com um múltiplo de P/L ainda maior, de 147,61.

O cálculo sobre o potencial valor das bolsas locais leva em consideração o superávit líquido das bolsas, que hoje são entidades sem fins lucrativos. A principal receita das bolsas são as taxas de emolumentos, cobradas a cada negociação. Embora tenham percentuais reduzidos, o volume final é grande, por conta do elevado número de negócios. Em 2006, a Bovespa registrou superávit de R$ 199,75 milhões, com incremento de 51%. Já a BM&F mostrou superávit de R$ 181,06 milhões em 2006, com avanço de 39,2% ante 2005.

Apesar de servirem apenas como referência - já que as empresas brasileiras costumam ter valor de mercado menor que as similares estrangeiras -, o uso dos múltiplos P/L das bolsas internacionais pode ser um bom parâmetros "para se ter um ordem de grandeza" sobre o valor das bolsas brasileiras. Quem afirma é o vice-presidente da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid), Luis Fernando Resende.

Segundo ele, é normal que o preço das bolsas brasileiras tenha defasagem em relação às estrangeiras - assim como ocorre com empresas de outros setores. Porém, essa diferença nunca é absurda. "Naturalmente, no mercado local, costuma haver um desconto em relação aos múltiplos das empresas estrangeiras", afirma Resende. "Mas esse desconto também não chega 50%". Ele lembra ainda que a participação dos investidores externos nos IPOs brasileiros têm ficado entre 60% e 70%.

Outro ponto que pode contribuir para a convergência da avaliação do valor de mercado das bolsas é o processo de consolidação pelo qual este mercado passa neste momento. Recentemente, a Nyse comprou a Euronext, a Nasdaq anunciou a aquisição da OMX, e a Chicago Mercantille Exchange e a CBOT negociam os termos finais de uma fusão.

Vistas como empresas, as perspectivas, que também pesam na hora de avaliar o valor de uma companhia, parecem positivas tanto para Bovespa quanto para BM&F. Do lado da Bolsa de Valores, os números de negociação mostram crescimento consistente nos últimos anos. Entre 2002 e 2006, o número de negócios com ações no mercado à vista teve crescimento anual médio de 36,5%, atingindo 14,68 milhões de operações no ano passado. Tal movimento tem sido impulsionado também pela onda de IPOs observada no mercado local. Desde maio de 2004, quando a Natura abriu a porteira, 64 novas empresas lançaram ações na Bovespa, com volume acumulado de R$ 40,1 bilhões (considerando apenas IPOs).

Na BM&F, as negociações também crescem vigorosamente ano a ano. De 2002 a 2006, o crescimento anual médio do número de contratos foi de 27,95%, para 283,257 milhões de negócios em 2006. Para este ano, o orçamento anual da BM&F previa um mínimo de 950 mil contratos diários para que a entidade gerasse receita o suficiente para cobrir os custos. Até maio, no entanto, a média diária de negociação já está na casa de 2 milhões de contratos por dia. Como perspectiva para o futuro, a BM&F ainda disputa com bolsas estrangeiras a posição de centro mundial para negociação de contratos futuros de etanol. O crescimento do uso do biocombustível em nível mundial pode gerar um potencial extraordinário de negócios neste setor, o que elevaria a demanda por hedge de parte dos produtores de cana.