Título: Países querem postura firme de Brasil e Índia
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 12/06/2007, Brasil, p. A3

Alianças reunindo cerca de 100 países em desenvolvimento insistiram, ontem, para que Brasil e a India finquem o pé na defesa de seus interesses nas negociações cruciais - agrícola e industrial - com os Estados Unidos e a União Européia (UE) pelas próximas duas semanas.

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, disse que foi dito e repetido pelos grupos de países que o corte real nos subsídios agrícolas dos Estados Unidos "é a chave para a rodada (ser concluída)". Ele conclamou Washington a aceitar as propostas do G-20, a aliança liderada por Brasília.

Na área industrial, os países repetiram demandas para um corte "equilibrado" nas tarifas de importação de maneira que evite a "desindustrialização" de suas economias. Um ministro asiático se declarou inquieto pelo "endurecimento" das posições entre as nações em desenvolvimento, antecedendo as reuniões vistas como "vai ou racha" na Rodada Doha.

A negociação atualmente está nas mãos do G-4, que reúne o Brasil, EUA, UE e India, atores-chave da rodada. De hoje até quinta-feira, em Paris, altos funcionários desses países esboçam alternativas para os ministros, que se reunirão durante toda a semana que vem em Potsdam (Alemanha) para bater o martelo sobre um acordo preliminar. Daí a importância das reuniões com ministros, ontem, para definir "contornos" da posição para o G-4. O Brasil defenderá a posição do G-20, procurando ter flexibilidade para negociar.

O ministro indiano do Comércio, Kamal Nath, na liderança do G-33, que defende mecanismos para frear importações agrícolas, disse na reunião desse grupo que, diante de muita divergência, só parece possível um "acordo modesto", e ainda assim EUA e UE estão cobrando contrapartida alta demais.

Nath voltou a dar a impressão de que está pronto a atrapalhar um acordo, ainda mais que a Índia tem pouco ou nada a ganhar com a rodada. Ele agora defende que os EUA precisam limitar o total de seus subsídios agrícolas distorcivos para cerca de US$ 11 bilhões, o que é visto como "chute na lua", porque nem o G-20 pede tão pouco. Atualmente, Washington tem direito a dar US$ 49 bilhões de subvenções que distorcem o comércio, e estaria disposto a baixar o montante para US$ 17 bilhões, enquanto negociadores importantes acham que US$ 15 bilhões com teto nos subsídios por produto já seria um bom acordo.

O representante da Índia insiste também em só negociar indicadores para definir "produtos especiais" agrícolas que nações em desenvolvimento poderão proteger com corte tarifário menor, o que significa limitar a possibilidade de exportações brasileiras. Para o indiano, o mandato da negociação não prevê limitar o número desses produtos, como querem os outros países. Ao mesmo tempo, Nath insiste publicamente em "apostar" na rodada, aparentemente para jogar a culpa em outros em caso do fiasco da negociação global.

A postura indiana é bem diferente da do Brasil, engajado para concluir o acordo, até porque só tem a ganhar na área agrícola. Nath e Amorim rejeitaram, porém, divergências. "A unidade é total no G-20"', repetiram.

Um embaixador sul-americano entendeu que "acordo modesto" em agricultura e indústria significa consolidar a situação atual das tarifas e subsídios realmente aplicados. Ou seja, "cortar a água", ou fosso, entre alíquota consolidada (o máximo permitido pela OMC) e a taxa realmente aplicada.

Para certos negociadores, um acordo será melhor do que acordo nenhum, diante das cifras que estão na mesa, que seriam "bem melhores" do que em qualquer outra fase da negociação para cortar subsídios e tarifas nos países industrializados. Para o Brasil, no entanto, só haverá acordo com "impacto econômico".

No comunicado do G-20 com as outras alianças em desenvolvimento, ministros e altos funcionários disseram ver crescente apoio às posições do G-20. Elas constituem o centro de gravidade nas negociações agrícolas e, "em verdade, a única zona possível de convergência".