Título: Casos polêmicos são lição na análise de prospectos
Autor: Valenti, Graziella
Fonte: Valor Econômico, 12/06/2007, Empresas, p. B1

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) está tomando lições de capitalismo na prática, depois de anos de mercado de ações dormente no Brasil. No aprendizado, os casos polêmicos tornam-se experiências para o futuro.

"Os bancos são sempre mais ágeis que o legislador", admite o gerente de registro, Felipe Claret da Mota, que fica à frente das outras quatro pessoas que atuam nessa área. "Faz parte do espírito de auto-regulação do mercado."

Segundo ele, se a CVM tentasse antecipar o que pode e o que não pode ser feito, o que deve ser dito ou que não precisa estar detalhado num prospecto, os participantes de mercado certamente gerariam necessidades novas, não contempladas nas regras existentes.

Donald Baker, advogado do escritório americano White & Case conta que nos Estados Unidos as preocupações com as informações dos prospectos são semelhantes às existentes no Brasil.

Um dos casos que enriqueceram a bagagem de conhecimentos da CVM foi a oferta da CR2, empresa do ramo imobiliário. Os controladores subscreveram quase um terço da oferta de ações, o que só foi descoberto após a estréia na bolsa. A atitude é polêmica pois o preço de estréia na bolsa reflete a demanda pelos papéis. Ao elevar a procura, os sócios puxaram o valor das ações. Diante disso, o coordenador da operação, o Unibanco, teve que abrir a opção de os investidores que participaram da colocação inicial cancelar a compra de papéis, mesmo após uma semana.

A autarquia agora exige que o prospecto deixe claro se os sócios controladores ou as pessoas vinculadas a eles poderão participar do processo de formação do preço para listagem na bolsa, o chamado "bookbuilding".

Outro aprendizado veio com a Brasil Ecodiesel. O fato de o controlador do negócio estar oculto por um fundo de investimento registrado no exterior pesou na formação de preço para a estréia da empresa na bolsa. "Foi um caso emblemático", diz Claret.

Desde então, a CVM não permite que o controlador fique obscuro. "A informação de quem é o controlador é demasiadamente importante para não ser dita. O passado dele é determinante para o investidor", enfatiza o superintendente de registro da autarquia, Carlos Alberto Rebello.

Por isso, nas operações seguintes à Brasil Ecodiesel, a autarquia passou a exigir a abertura dos acionistas até o nível da pessoa física. Caso isso não seja possível, a recomendação é que esse sócio não venda as ações na oferta e que tal informação esteja presente na lista de riscos da operação, dependendo da relevância da posição societária desse investidor.

Embora tenha gerado uma mudança na visão da CVM, a Brasil Ecodiesel entende que sua estrutura de capital é semelhante a de uma companhia controlada por um fundo de investimento, no modelo de private equity, do qual não são revelados os nomes dos cotistas. Consultada, a companhia argumenta, em resposta encaminhada por sua assessoria de imprensa, que sua estrutura societária jamais afetou a condução dos negócios. (GV)