Título: Impasse entre Receita e empresas dificulta solução para emenda 3
Autor: Ulhôa, Raquel e Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 08/06/2007, Política, p. A8

As conversas entre governo, empresários e sindicalistas para regulamentar a contratação de profissionais por meio de pessoas jurídicas estão emperradas. As dificuldades levaram o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), a reabrir negociações com representantes da Receita Federal e das partes envolvidas. Segundo ele, qualquer texto será um "arremedo", já que a solução deveria vir no âmbito de uma reforma trabalhista mais ampla.

De acordo com Jucá, apesar de ainda haver muita divergência, as conversas caminham na direção para a definição de um "regime especial" - com contribuição previdenciária - para regulamentar esse tipo de relação trabalhista em vez de estabelecer exceções na legislação. Ele admite que, por enquanto, há objeção da Receita Federal, das empresas e das entidades sindicais.

A maior vantagem da criação desse modelo, segundo Jucá, é a proteção da relação entre empresa e pessoa jurídica, o que afastaria a ameaça da desconsideração desse contrato para efeitos tributários: "Havendo um modelo especial, o fiscal perde o poder para desconsiderar a relação contratual. Passaria a fiscalizar apenas se o pagamento dos tributos respeita a norma do novo regime".

O relator do projeto que tramita na Câmara, Milton Monti (PR-SP), informou que a definição de um regime especial "não pode ser descartada", mas considera complicado encontrar o modelo ideal. "Coisas que parecem soluções às vezes não são factíveis", afirmou.

Há vários nós a serem desatados. O maior impasse entre governo e empresas é a fiscalização. A Receita não abre mão do poder de fiscalizar as relações contratuais, enquanto as empresas não aceitam submeter-se ao que consideram abusos e arbitrariedades dos auditores.

Com base nas negociações que vem mantendo, Monti afirma que "há convergências, mas o maior problema é traduzir em texto legal uma proposta que concilie todos os interesses". Ele acredita que estará em condições de apresentar um relatório até 15 de julho.

Jucá, por sua vez, acha possível elaborar uma proposta até o final de junho, criando um regime novo ou simplesmente estabelecendo limitadores às contratações por meio de pessoas jurídicas para não prejudicar os trabalhadores que recebem salários mais baixos.

Governo e empresas ainda estão distantes de um consenso porque o Executivo federal não quer perder arrecadação e o setor privado pressiona para pagar menos tributos. As centrais sindicais e os sindicatos, por sua vez, colocam obstáculos às negociações porque não querem abrir mão do poder de mobilização das categorias nem deixar de receber contribuições pagas por trabalhadores assalariados.

No meio da confusão, os parlamentares buscam uma solução que não torne mais precárias as relações trabalhistas, estimulando as empresas a substituírem, cada vez mais, a carteira assinada pelas pessoas jurídicas.

Na terça-feira, Jucá vai reunir em seu gabinete representantes da Receita, das empresas e tributaristas ligados ao PSDB - com os quais teve uma primeira conversa na terça-feira passada - para a elaboração de um "esqueleto". Naquele encontro, foi elaborada uma lista de problemas a serem sanados pelo texto em discussão.

O primeiro desses obstáculos é evitar a precarização do trabalho e defender os trabalhadores com salários baixos. Em segundo lugar, é preciso regularizar a situação dos trabalhadores que, atualmente, só encontram trabalho como pessoa jurídica. O terceiro ponto é evitar perdas de arrecadação para o governo. O quarto desafio é fugir do confronto com entidades sindicais. Por fim, também é preciso encontrar meios de impedir a concorrência desleal entre empresas, já que o emprego celetista é mais caro para o empregador.

De acordo com Monti, está ganhando força a tese de não regulamentar o artigo 116 do Código Tributário Nacional porque isso é "muito controverso". A regulamentação desse artigo seria um dos objetivos do projeto de lei que ele relata. "O governo mandou um projeto muito mais amplo para substituir a "emenda 3", - dispositivo da lei que criou a Super Receita que impedia os auditores fiscais de desconsiderar as pessoas jurídicas antes de uma sentença definitiva da Justiça do Trabalho. Essa norma foi vetada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Assim como Jucá, Monti acha que o assunto discutido no âmbito da "emenda 3" deveria ser tratado numa discussão mais ampla, dentro de uma reforma trabalhista.

No Ministério da Fazenda, o impasse está revelado pelo descumprimento de todos os prazos que foram estabelecidos para que um texto de consenso fosse levado ao Congresso. As prioridades são preservar os poderes de fiscalização da Super Receita e evitar renúncia fiscal relevante.

Em 9 de maio, o governo cedeu e aceitou que profissionais dos setores artístico e cultural, na nova legislação, fossem contratados por meio de pessoas jurídicas, mesmo que a relação de trabalho seja prestada com subordinação e habitualidade. Nesse regime excepcional, a alíquota da contribuição previdenciária seria de 10% sobre o faturamento. Mas teve vida curta esse acordo selado entre os ministros Guido Mantega e Walfrido dos Mares Guia (Relações Institucionais) e líderes dos partidos.

Mantega ficou irritado ao saber que, naquele mesmo dia 9, Walfrido deu entrevistas admitindo que a nova contribuição previdenciária poderia baixar de 10% para 5%.