Título: Execução orçamentária da segurança de vôo é decrescente
Autor: Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 08/06/2007, Política, p. A8

Todas as queixas dos envolvidos no sistema de tráfego aéreo brasileiro, quando analisam a crise do setor para a comissão parlamentar de inquérito, recaem sobre a falta de investimentos do governo federal nesta atividade. A oposição ataca a política de contingenciamentos do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Os governistas se defendem e tentam jogar a responsabilidade sobre os ombros dos controladores de vôo e das companhias aéreas. Uma análise sobre os números dos últimos sete anos, porém, mostra que a atual administração pecou no ponto mais sensível da aviação: a segurança de vôo.

O deputado Otávio Leite (PSDB-RJ) levantou os repasses feitos pelo governo federal desde 2000, quando o país era governado por Fernando Henrique Cardoso, até hoje. Dois números são fundamentais para uma análise detalhada dos recursos para o sistema aéreo. O primeiro é o volume de dinheiro reservado para o Fundo Aeronáutico; o outro, dos aportes para o Programa de Segurança de Vôo e Controle do Espaço Aéreo Brasileiro. Os números previstos para o fundo cresceram de forma gradual de 2000 até hoje. Naquele ano, foram reservados R$ 922,3 milhões. Em 2007, R$ 1,2 bilhão.

O problema começa no contingenciamento das verbas. Em relação ao fundo como um todo, o comportamento dos governos tucano e petista é semelhante. Há altos e baixos em relação aos contingenciamentos. O pior ano do governo Fernando Henrique foi o de 2001, quando apenas 52,03% dos recursos foram gastos. No governo Lula, o pior foi 2003, quando 49% foram executados.

Nos três últimos anos do governo FHC, quando o fundo para a segurança de vôo e controle do espaço passou a existir, e no primeiro mandato de Lula, as médias de execução orçamentária foram, respectivamente, de 56,4% e 56,9%.

A diferença entre os dois governos aparece na evolução dos repasses para o programa de segurança de vôo. Nos anos FHC, os recursos cresceram gradativamente até chegar ao ápice, em 2002, com 71,15% utilizados.

No primeiro ano do governo Lula, o valor executado despencou para 53,24%. Em 2004, pulou para 67,85%. A partir dali, decréscimo no gasto até fechar 2006 com 50,33%. A tendência de queda poderia ter sido pior, já que no ano passado, após o acidente do avião da Gol em 29 de setembro, houve um aumento na liberação de recursos para o setor. A aplicação de verbas no fim do ano melhorou o desempenho geral de gastos do ano. Na ocasião, o jato Legacy fabricado pela Embraer se chocou no ar com o Boeing da companhia. A aeronave menor conseguiu se salvar, mas o avião comercial caiu e matou 154 pessoas. A partir do acidente, instalou-se uma crise sem precedentes no sistema aéreo brasileiro, até hoje não resolvida, e a insegurança de vôo permanece, com algumas quase colisões já reveladas depois do acidente.

"Nos números, a questão mais grave é a da segurança de vôo. No setor aéreo, é fundamental ter planejamento. Decisões tomadas hoje, como a construção de uma pista, o treinamento de pessoal e o aperfeiçoamento do sistema só geram melhorias em três ou quatro anos", diz Otávio Leite. "Esse caos que vivemos hoje é reflexo da falta de planejamento do governo desde 2003. O reflexo da falta de investimentos naquela época foi sentido agora", completa.

José Márcio Monsão Mollo, presidente do Sindicato Nacional das Empresas Aéreas (Snea), critica abertamente o contingenciamento dos recursos pelo governo. E fez pedidos para melhorar a infra-estrutura do setor. "Congonhas (SP) precisa de um novo terminal. Guarulhos (SP) necessita de uma terceira pista e o aeroporto de Brasília já não tem mais espaço para estacionar aeronaves", disse.

O contingenciamento exagerado do governo fez com que o ex- ministro da Defesa, José Viegas, reclamasse da falta de recursos. "O contingenciamento sistemático desses recursos vem produzindo dificuldades ao comando da Aeronáutica, comprometendo a execução orçamentária", disse o ministro, durante reunião do Conselho de Aviação Civil (Conac), no dia 30 de outubro de 2003.

A realidade não parece mudar em 2007. Para o Fundo Aeronáutico, o governo destinou R$ 1,2 bilhão. Até o dia 21 de maio, apenas R$ 93,7 milhões foram executados. Para a segurança do vôo, dos R$ 549,8 milhões autorizados, apenas R$ 25,7 milhões foram executados.

O deputado Vanderlei Macris (PSDB-SP) apresentou, na quarta-feira, requerimento para convocar o ministro da Fazenda, Guido Mantega, para explicar o excessivo contingenciamento.