Título: CNI pede ao Congresso que tire Venezuela do Mercosul
Autor: Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 27/06/2007, Brasil, p. A3

Entidades empresariais estão fazendo lobby no Congresso Nacional para impedir a entrada da Venezuela no Mercosul nos termos até agora negociados. Apesar da crescente exportação do Brasil para o país, a resistência tem duas razões. As indústrias temem que as posições políticas do presidente Hugo Chávez atrapalhem o bloco nas negociações com grandes mercados, como União Européia e Estados Unidos, e há dúvidas sobre o tamanho do possível ganho econômico com a entrada da Venezuela no bloco, porque o ritmo e o cronograma da abertura venezuelana ainda não foram definidos. Para que o país de Chávez se torne membro pleno do Mercosul, falta apenas a aprovação dos congressos brasileiro e paraguaio.

Em carta enviada aos senadores que fazem parte da comissão de Relações Exteriores do Senado, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) formalizou a preocupação com o tema. A entidade se prepara agora para explicar aos congressistas detalhadamente suas objeções ao ingresso da Venezuela, já que o assunto é bastante técnico. A estratégia de abordagem dos senadores deve ser definida em breve. A CNI também enviou cartas sobre o tema para os ministros das Relações Exteriores, Celso Amorim, e do Desenvolvimento, Miguel Jorge.

"Não é uma questão de contradizer a posição política do governo, mas de explicar que para aderir ao bloco os países precisam ao menos cumprir as etapas necessárias", diz Soraya Rosar, gerente-executiva da unidade de negociações internacionais da CNI. Ela diz que o objetivo não é interromper o fluxo comercial e ressalta que o aumento das exportações do Brasil para a Venezuela está relacionado com a conjuntura macroeconômica e não com a entrada do país no Mercosul.

De janeiro a maio deste ano em relação a igual período de 2006 as exportações do Brasil para a Venezuela cresceram 31%. No ano passado, as empresas nacionais venderam US$ 3,6 bilhões aos venezuelanos, alta de 60% comparada com 2005. Desse total, mais de US$ 3,2 bilhões correspondem a produtos industrializados. O superávit do Brasil com a Venezuela atingiu US$ 2,97 bilhões em 2006.

O governo já enviou o protocolo de adesão para a aprovação do Congresso, mas a Venezuela ainda não finalizou as negociações para aderir à Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul nem adaptou sua legislação às regras do bloco. A data da abertura do mercado venezuelano para os países do Mercosul está marcada para 2014, um prazo de sete anos, mas o que preocupa os empresários é que o país de Hugo Chávez ainda não explicou qual será o ritmo dessa liberalização e em que momento cada grupo de produtos será incorporado à TEC. Não se sabe, por exemplo, em que momento de hoje até 2014 os carros exportados pelo Brasil poderão entrar na Venezuela com tarifa zero.

A Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) também seguiu a movimentação da CNI e enviou carta a quatro senadores e três deputados. No documento, a entidade afirma que está preocupada com os "aspectos comerciais e financeiros", sugere que Amorim seja convidado a explicar as razões de uma adesão tão "rápida e incompleta", e diz estar certa que os deputados "saberão defender os interesses nacionais, não aprovando a entrada da Venezuela no Mercosul nos termos negociados até o momento".

"Sou totalmente favorável ao ingresso da Venezuela no Mercosul, mas é um absurdo pagarmos o preço do ingresso da Venezuela sem uma vantagem efetiva", diz Humberto Barbato, presidente da Abinee. De 2005 para 2006 o setor praticamente dobrou suas exportações para a Venezuela, atingindo US$ 987 milhões. Desse total, US$ 700 milhões correspondem a telefones celulares.

A Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit) quer sensibilizar o Congresso para a importância dos acordos bilaterais. Na semana passada, empresários do setor se reuniram com deputados para explicar as dificuldades de competir com a China sem acordos preferenciais. "A Venezuela é um mercado importante para o setor têxtil, mas não pode criar dificuldade para a abertura de mercados mais amplos", diz Fernando Pimentel, diretor-executivo da Abit.

Enquanto o lobby contra a Venezuela funciona a todo vapor no Congresso, os setores que são favoráveis à entrada do país no bloco preferem não explicitar suas posições. A avaliação dos empresários é que está cada vez mais complicado defender Hugo Chávez, devido a suas declarações polêmicas. O setor automotivo, que é o mais importante para o intercâmbio no Mercosul hoje, não se pronuncia oficialmente e não está conversando diretamente os senadores e deputados.

A Venezuela é um mercado importante para as montadoras, que exportaram 44,5 mil veículos para o país em 2006, 14% a mais que no ano anterior. O potencial de crescimento é ainda mais significativo, já que a venda de veículos na Venezuela em 2006 chegou a 340 mil unidades, alta de 50% em relação a 2005. No entanto, o setor está preocupado com a oposição de Chávez a acordos com mercados como a União Européia. As montadoras também querem que o governo seja mais transparente nas informações sobre a abertura do mercado venezuelano para o Brasil. "Existe uma zona cinzenta muito grande", diz uma fonte.

De acordo com Carlos Cavalcanti, diretor-adjunto do departamento de comércio exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a entidade está avaliando o assunto e não tomou uma posição. Ele diz que, no longo prazo, o ingresso da Venezuela, terceiro maior mercado do continente sul-americano, é importante para o Mercosul. O problema é a influência de Hugo Chávez no curto prazo.