Título: Uso racional de energia ganha corpo
Autor: Pavani, Vilma
Fonte: Valor Econômico, 05/06/2007, Caderno Especial, p. F4

A redução do consumo de energia elétrica é uma medida que vem ganhando corpo nas empresas dos mais diversos setores. O exemplo começa pelas grandes, que possuem departamentos e profissionais específicos para gerir ações de sustentabilidade. Multinacionais como a Siemens, gigante no segmento de eletroeletrônicos, ou a farmacêutica Roche, têm programas de âmbito mundial para o meio ambiente, nos quais energia é sempre um item importante.

O consumo racional é uma preocupação antiga da Siemens, mas neste ano, especificamente, a companhia traçou metas para as áreas fabris, com o objetivo de reduzir o consumo de energia elétrica em 20% no prazo de cinco anos, a contar de 2007. "Há tempos já fazemos ações pontuais, como o controle do uso do ar condicionado de acordo com a temperatura do dia, iluminação variável conforme as necessidades do ambiente, etc", conta Wagner Giovanini, diretor de gestão da qualidade e gestão ambiental da Siemens do Brasil.

Agora, entre outras medidas, a empresa vai substituir alguns equipamentos por outros mais eficientes, bem como utilizar a energia perdida naturalmente, nos compressores, para aquecer a água das caldeiras. "Vamos ainda fazer uma campanha de sensibilização de toda a empresa, mostrando que a racionalização da energia não é uma ação isolada, mas um fator crítico de sucesso", diz Giovanini.

Além de buscar eficiência energética dentro da empresa, a Siemens procura desenvolver produtos - como as turbinas a vapor com ciclos combinados - que também ajudem seus clientes a extrair melhor rendimento com menor quantidade de energia. Todo o portfólio da empresa segue o mesmo princípio. "Desde o momento da concepção de um produto, nossos engenheiros têm como norma procurar o material mais eficiente e com maior grau de proteção ao meio ambiente", garante Wagner.

Na Roche, a questão da energia também é tratada com rigor. A multinacional tem até uma diretriz nesse sentido, a K-18, fixada pela matriz em Basiléia. Seguindo essas regras, no ano passado a Roche do Brasil obteve diminuição de 11% no consumo de energia elétrica na sede da empresa, em São Paulo. Segundo Maurício Tinello, gerente de serviços da empresa e um dos responsáveis pela implantação do programa, a ação se desenvolveu em duas frentes, uma técnica e outra educativa. "Pelo lado técnico, trocamos lâmpadas convencionais por fluorescentes e controlamos as demandas por meio de um software que cria um target para cada horário: se um departamento ou equipamento ultrapassa o limite convencionado, a energia é derrubada", conta.

Também foi implantado um sistema desenvolvido para o ar condicionado, pelo qual este é automaticamente desligado conforme a temperatura, e que capta o ar de fora para dentro do prédio, reduzindo o uso do equipamento e poupando energia. Pelo lado educativo, foram tomadas várias medidas, como a colocação de selos nos interruptores, com dizeres do tipo "Por favor, desligue a luz". Palestras em eventos de segurança do trabalho também abordam a questão.

Tinello diz que a matriz mantém auditores nos mais de 120 sites da empresa em todo o mundo para acompanhar o cumprimento das metas. O programa envolve mais criatividade do que gastos. Ele cita a manutenção de equipamentos como oportunidade de mudança: "Quando uma lâmpada incandescente queima, aproveitamos para trocar por uma fluorescente".

A pesquisadora e professora de pós-graduação em energia pelo Instituto de Eletrotécnica e Energia (IEE), da Universidade de São Paulo, Virgínia Parente, entende que as pequenas e médias empresas podem seguir esse caminho, trocando lâmpadas e equipamentos tradicionais por outros mais eficientes. Mas lembra que o consumidor, em geral, reage a incentivos - sejam de prêmio ou penalidade. Ela sugere que o governo adote pequenas medidas de grande contribuição, como tributação menor para os produtos mais eficientes e maior para os ineficientes. Como exemplo, cita geladeiras e chuveiros, os grandes vilões do consumo de energia, e presentes tanto em residências, como escritórios ou indústrias. "Na hora da troca de equipamentos, certamente o produto mais eficiente, com preço competitivo, seria o escolhido", avalia. Os fabricantes, por seu lado, teriam maior interesse em investir em pesquisa e desenvolvimento de produtos eficazes.

Outra possibilidade levantada pela especialista é a troca ou mistura de sistemas de geração de energia. As indústrias de alimentos e bebidas, que precisam usar processos de esterilização (pelo calor) e de conservação (pelo frio) ao mesmo tempo, poderiam utilizar sistemas de co-geração, com um misto de energia elétrica e solar. Mas além da boa vontade das empresas, diz Virgínia, é essencial haver políticas públicas que mirem a eficiência energética, com metas para a troca de equipamentos antiquados. "Nossas medidas para a área de energia são ainda muito tímidas e voltadas mais para aumentar a oferta do que para educar a demanda", ressalta.

Mudar a matriz energética é um processo mais complicado, mas dá bons resultados. A AmBev (Companhia de Bebidas das Américas) está substituindo gradativamente combustíveis fósseis por outros menos poluentes. Hoje, apenas 12% da matriz energética da empresa é composta por óleo combustível, enquanto 88% da energia utilizada vem de biogás, biomassa e gás natural. Em relação à energia elétrica, as 30 unidades da AmBev no Brasil consumiram, no ano passado, 8,64 kwh/hl (kilowatt-hora por hectolitro de bebida produzido). Isso representa redução de 10,19% frente a a 2001, quando esse número era de 9,51 kwh/hl.