Título: Tarifa da Eletropaulo pode cair 9%, mas consumidor acha pouco
Autor: Maia, Samantha
Fonte: Valor Econômico, 15/06/2007, Brasil, p. A3

Grandes e pequenos consumidores marcaram presença na audiência pública sobre o processo de revisão tarifária da AES Eletropaulo, ontem, no auditório da Faculdade de Administração da Fundação Getúlio Vargas (FGV), na cidade de São Paulo. Os representantes de grandes empresas reclamaram da falta de rigor nas exigências da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) na avaliação dos desempenhos da concessionária, e os cidadãos subiram na tribuna com suas contas de luz para reclamar de preços e impostos.

Representantes de bairros periféricos da capital paulista, e até da favela do Paraisópolis, zona Sul, expuseram suas preocupações diante do grande número de ligações irregulares nas suas vizinhanças, os chamados "gatos", que acarretam o aumento das tarifas por causa das perdas da distribuidora. O argumento levantado pela maioria desses pequenos consumidores foi de que seria necessário diminuir drasticamente as tarifas para estimular a entrada na legalidade e diminuir a inadimplência.

A lógica parece clara, mas mesmo assim o ambiente da audiência pública evidenciou o buraco existente entre o dia-a-dia da população e as decisões tomadas pelas autoridades. Não era uma solução para dividir em mais de um medidor a leitura de luz em uma casa habitada por várias famílias - uma forma das contas passarem a uma faixa de consumo sobre a qual incide menos impostos -, que estava sendo analisada ali, e sim critérios de referência adotados pela agência do setor para definir a receita necessária ao equilíbrio financeiro da Eletropaulo.

Os termos para essa discussão são mais conhecidos pela outra parcela de consumidores, os grandes. Pronunciamento feito pela representante da Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia (Abrace) Denise Teixeira foi reiterado por porta-vozes da Votorantim, Gerdau e Braskem.

Para julho, a redução média na tarifa de energia cobrada pela Eletropaulo pode chegar a 9%. Esse percentual (provisório e calculado pela Aneel) inclui uma revisão tarifária de menos 5,43% (oriunda principalmente de ganhos de produtividade obtidos nos últimos quatro anos) e mais um percentual relativo à uma "devolução" de custos que foram superestimados em 2006, como a tarifa de energia comprada de Itaipu, barateada em decorrência da queda do dólar.

A base de eficiência usada pela Aneel (e que levou à queda de 5,43%) foi criticada pelos consumidores industriais. Para eles, ela não apresenta muito avanço em relação à primeira revisão, feita em 2003. Caso a Aneel fosse mais exigente na cobrança de ganhos de eficiência da concessionária, eles acreditam que seria possível reduzir mais a tarifa. Ainda não está definido qual será o percentual de cada classe de consumidor, e os grandes não devem usufruir da queda de 9%.

Segundo a porta-voz da Abrace, não há estudos, por exemplo, que comprovem que 85% dos consumidores da Eletropaulo são metropolitanos, conforme estimativa da Aneel. O custo de atendimento de consumidores classificados como metropolitanos é mais alto do que o de urbanos, devido à dificuldade de locomoção em grandes centros. "Não queremos critérios subjetivos para estimar custos da concessionária", diz ela.

Se as empresas consideram brandas as exigências do órgão regulador, a Eletropaulo reclama de excessos. Diferente de 2003, quando a concessionária passou por sua primeira revisão tarifária, sua maior divergência com a Aneel esse ano não gira em torno do percentual do reajuste, e sim de alguns índices usados como referência pela reguladora na hora de determinar esse reajuste, como o nível de inadimplência e número de funcionários em cada equipe.

Segundo o vice-presidente para assuntos regulatórios da distribuidora, Carlos Brandão, é impossível atingir uma inadimplência de 0,5% dos consumidores, índice considerado pela Aneel ideal para uma empresa com as características da Eletropaulo. "Temos feito todos os esforços de redução de perdas e de combate à inadimplência, e chegamos ao máximo possível para manter níveis baixos", diz Brandão. Hoje, o não-pagamento de contas de luz é de cerca de 1,3%.

"Não ignoramos a realidade da empresa, mas não necessariamente a aceitamos", diz o diretor da Aneel Romeu Rufino. Para ele, o fato dos resultados da concessionária não baterem com a da referência estudada pela reguladora significa que há problemas de gestão.

A crítica também se volta para a carteira de funcionários. Segundo o levantamento da Aneel, seria possível a Eletropaulo atuar de forma eficiente com 9.220 trabalhadores. "Estabelecemos um certo número de equipes e sua composição. Se a empresa contrata mais, é um problema", diz o diretor da agência. A Eletropaulo, no entanto, trabalha com cerca de 12 mil funcionários, entre diretos e terceirizados. "Esse é o 'gap' que estamos negociando, pois queremos manter o nível de excelência que atingimos", diz Brandão.

Depois de analisadas as propostas e ponderações da audiência, a Aneel anuncia, no dia 4 de julho, a decisão final sobre o reajuste.