Título: Câmara busca alternativa à lista para viabilizar financiamento público
Autor: Jayme, Thiago Vitale e Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 15/06/2007, Política, p. A8

A lista fechada e pré-ordenada pelos partidos está descartada da reforma política, cuja votação a Câmara pretende retomar na próxima semana. O Plano B dos que defendem a mudança é a chamada lista flexível, cuja ordem definida pelos partidos pode ser alterada pelo eleitor. A adoção do sistema de listas é considerado fundamental, pois só assim será aprovado o financiamento público das campanhas, o que boa parte do Congresso considera indispensável ao caixa 2 das campanhas eleitorais.

"É o movimento totalflex. A lista pode ser com gasolina, com etanol, com querosene ou qualquer combustível, mas temos de aprová-lo para chegarmos ao financiamento público de campanha", disse o vice-líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS). O problema é que a flexibilização amplia o risco da prática de caixa 2. "Será preciso ampliar os mecanismos de fiscalização para evitar o caixa dois", disse o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO), relator da proposta.

A questão do dinheiro, na realidade, é dos fatores que pesam contra a adoção do sistema de listas, pois o projeto beneficia as grandes legendas em detrimento das menores. O projeto prevê que 1% do total dos recursos, estimados em 880,2 milhões, pelo eleitorado de hoje, será repassado a todas as siglas registradas na Justiça eleitoral. No momento, elas são 29, e cada uma receberia cerca de R$ 303 mil. Outros 14% seriam destinados aos partidos com representação na Câmara. Eles são 19. Cada sigla receberia cerca de R$ 6,4 milhões. Os 85% restantes seriam divididos proporcionalmente ao número de deputados que cada partido elegeu para a Câmara.

PMDB e PT ficariam com a maior fatia, com algo em torno de R$ 130 milhões para distribuir entre os diretórios regionais. Siglas intermediárias, como o PDT e o PL, ficariam com cerca de R$ 36 milhões, e aquelas menores, como o P-SOL, que elegeu apenas três deputados, com aproximadamente R$ 4 milhões, ou seja, cerca de R$ 148 mil para cada Estado, sendo que aqueles que não elegeram deputados federais receberiam menos ainda.

É uma limitação ao crescimento do partido. Por outro lado, é fato que o P-SOL tem dificuldades para arrecadar dinheiro. Nas eleições de 2006, Heloísa Helena, candidata a presidente, declarou arrecadação e gastos de R$ 266 mil. "Com essa distribuição, as novas lideranças vão sempre procurar os partidos grandes, porque são os que recebem mais dinheiro. Haverá uma cristalização dos partidos e impediremos o surgimento de novas lideranças e partidos", disse o deputado Flávio Dino (PCdoB-MA). A mudança nos percentuais é uma concessão que pode ser feita pelos grandes partidos, para viabilizar a aprovação do projeto.

As negociações para a votação da reforma foram reabertas ontem na Câmara, ainda sob a ressaca do dia anterior quando os defensores da lista fechada, embora majoritários nos grandes partidos, não conseguiram impor a mudança. Grande parte pelo recuo do PSDB, por razões eleitorais e para não se apresentar dividido na votação, parte pelo receio dos deputados de uma mudança radical no sistema e parte por causa da divisão do bolo do financiamento público.

Caiado pediu um dia de prazo para fazer um novo texto. Ele analisará as mais de 300 emendas feitas ao texto original. Ontem, o deputado adiantou que é possível flexibilizar a lista fechada. A proposta mais próxima de ser aceita é da deputada Rita Camata (PMDB-ES). Por ela, o eleitor votaria duas vezes. Primeiro, escolheria a lista pré-ordenada do partido de sua preferência. Em seguida, destacaria um dos candidatos da lista "Essa possibilidade é a que se tem discutido", disse o deputado Henrique Fontana, o principal negociador do PT na reforma.

"O que não se pode fazer é uma reforma Frankenstein, pois é preciso uma proposta que tenha coerência sistêmica e lógica", advertiu o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia. "O Congresso é que tem representação do povo brasileiro. O que estamos fazendo aqui é dando força à chamada democracia participativa, de uma maneira organizada através do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social para contribuir", disse o ministro Walfrido dos Mares Guia (Relações Institucionais), num debate do CDES para discutir a reforma.

Enquanto alguns deputados tentam fazer modificações ao texto para viabilizar a votação da reforma, outro grupo tenta derrubá-la de vez. Em manobra inesperada, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, Leonardo Picciani (RJ), votou um parecer declarando o texto da reforma inconstitucional. Mas logo depois a presidência da Câmara anulou a decisão da CCJ, tomada em reunião rápida sem a presença da maioria dos integrantes da comissão. O DEM ainda pediu para a Mesa Diretora que analise se Picciani quebrou o decoro parlamentar ao afrontar o regimento interno da Casa.