Título: Desconcentração industrial pouco afeta poder sindical do ABC
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Fonte: Valor Econômico, 15/06/2007, Política, p. A10

São Paulo perdeu a hegemonia na indústria automobilística. A representatividade do Estado na produção nacional de veículos, principal base de sustentação dos metalúrgicos, saiu de mais de dois terços há 15 anos para menos da metade. Mas o núcleo sindical paulista, concentrado no ABC, continua sendo o mais forte do país e o que dita as diretrizes seguidas pelos metalúrgicos nas demais regiões.

"O nível de organização do ABC está muito à frente de qualquer outro lugar", analisa o diretor executivo da Confederação dos Metalúrgicos da CUT Valmir Marques da Silva, o Biro Biro. "Eles conseguiram eleger o presidente Lula e as grandes lideranças de hoje vieram do ABC. As organizações de lá remontam aos anos 70 e ainda são referência no país", analisa.

Para alguns dirigentes metalúrgicos, a percepção é de que o movimento vive uma espécie de "entressafra" de novas lideranças. "Estamos passando por um momento de reciclagem. Há espaços vagos, criados pelos dirigentes que foram assumir o ministério, secretarias, cargos no governo. Outras lideranças estão sendo formadas", diz Biro Biro. O sindicalista, com 25 anos de Ford e atual presidente do sindicato de Taubaté, no interior paulista, cita como exemplo dirigentes de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul. "Mas será muito difícil surgir um novo dirigente com o porte de Lula".

A participação paulista na produção de carros do país tende a encolher mais ainda nos próximos meses, a partir do avanço do parque industrial do Paraná e Rio Grande do Sul. Isso significa que haverá mais metalúrgicos fora de São Paulo.

A descentralização industrial do setor automotivo ganhou força em meados da década de 90 quando, junto com a guerra fiscal entre os Estados, surgiu o regime automotivo, um programa do governo de Fernando Henrique Cardoso que atraiu novos investimentos das montadoras.

Empresas que já tinham fábricas no país e novas montadoras ergueram mais instalações no Rio Grande do Sul, Paraná, Bahia, Minas Gerais e Goiás. É nas fábricas mais modernas, regiões onde a mão-de-obra também é mais barata, que as multinacionais do setor desviaram boa parte dos investimentos.

"O ABC, de fato, sempre foi um celeiro no movimento metalúrgico, mas já há lideranças em regiões como Minas Gerais e Rio Grande do Sul", afirma o ministro da Previdência, Luiz Marinho.

Marinho é do ABC. Despontou como sindicalista ao participar de mobilizações quando trabalhava na linha de montagem da Volkswagen de São Bernardo do Campo. Para ele, "Lula foi um fenômeno", mas não significa que não possam surgir novas lideranças.

A força dos representantes de São Paulo está expressa no comando da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT: eles têm mais de um terço das cadeiras da Executiva e ocupam os três principais cargos: presidência, vice-presidência e secretaria geral. A nova direção, que será divulgada hoje, na conclusão do 7º Congresso da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT, manterá a força paulista.

O presidente da confederação, Carlos Alberto Grana, será reeleito e o Estado continuará com a maioria das cadeiras. "A direção nem reflete todo o peso de São Paulo. Temos um número inferior ao que poderíamos. São 800 mil metalúrgicos no Estado, de um total de 1,8 milhão", afirmou o secretário geral da confederação, Valter Sanches. Representante do sindicato do ABC, ele continuará na função de secretário-geral.

Com a migração das empresas que saíram de São Paulo para Estados como Paraná, Rio Grande do Sul, Bahia e Rio de Janeiro, houve descentralização da base sindical, mas isso não foi suficiente para tirar de São Paulo os principais cargos de direção.

Essa foi uma das questões debatidas no congresso dos metalúrgicos, que reuniu dirigentes de todo o país. "É claro São Paulo concentra força, pela influência do ABC e de seu tamanho na CUT. Mas existe também um movimento para tentar aumentar a divisão e tornar a direção mais regionalizada", aponta José Wagner Morais de Oliveira, secretário de administração e finanças da confederação nacional e secretário geral da federação de metalúrgicos Minas Gerais. "É preciso respeitar as diferenças regionais e as condições locais, até para dar autonomia aos sindicatos", diz.

A nova direção acomodará mais dirigentes de outros Estados. Os gaúchos devem ficar com a vice-presidência e continuarão com a segunda maior concentração de dirigentes. O Rio Grande do Sul, que aumentou a produção automobilística de 0,2% da nacional em 1990 para 5,6% em 2005 será um dos Estados, ao lado do Paraná, que mais deve receber ampliação industrial.

Minas Gerais também briga por mais espaço. Duas novas secretarias poderão ser criadas para contemplar os sindicatos de Minas e os do Rio de Janeiro, engrossando a força do Sudeste nas decisões. Na atual direção, Bahia tem um cargo, assim como o Amazonas. (CA e MO)