Título: Câmbio ainda pode ter novas medidas
Autor: Romero, Cristiano e Travaglini, Fernando
Fonte: Valor Econômico, 14/06/2007, Finanças, p. C1

O governo estuda a adoção de novas medidas para tentar segurar a apreciação do real frente ao dólar. Uma possibilidade é reduzir ainda mais o limite de exposição de capital dos bancos a câmbio. Na última sexta-feira, o Banco Central (BC) baixou circular diminuindo esse limite de 60% para 30% do patrimônio de referência. Mais adiante, deverá baixar esse percentual para 20%.

Embora elaboradas no Banco Central e no Ministério da Fazenda, as medidas com efeitos na taxa de câmbio e, portanto, na competitividade das empresas exportadoras vêm sendo discutidas no Palácio do Planalto, com a participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo estimativa apresentada a Lula pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, deverá haver um enxugamento de US$ 4 bilhões a US$ bilhões no mercado só com o pacote do BC na semana passada.

O BC teria constatado, segundo fontes ouvidas pelo Valor, que, na média, o grau de exposição média dos bancos a câmbio já estava, antes da decisão de sexta-feira, em torno de 30%. Ainda assim, alguns bancos vêm operando com limites bem superiores. O que estiver acima do novo limite está sendo retirado do mercado neste momento, uma vez que a medida entrou em vigor na segunda-feira.

O governo sabe, porém, que o efeito disso sobre a taxa de câmbio será pequeno. Já uma nova redução - para 20% - no limite de exposição dos bancos a moeda estrangeira teria um impacto maior.

Nas reuniões o presidente do BC, Henrique Meirelles, explicou que as recentes medidas tiveram um caráter mais "prudencial" do que propriamente de estímulo à valorização do dólar frente ao real. A preocupação foi diminuir a exposição dos bancos a posições em moeda estrangeira e exigir capital para cobrir riscos de descasamento entre posições em moeda dentro e fora do país.

Na avaliação do BC, há uma aposta "unidirecional" no mercado de câmbio - investidores insitucionais, "hedge funds" e investidores nacionais acreditam apenas na valorização do real. Como os fundamentos econômicos do país são muito positivos e não há previsão de turbulência no horizonte, essa é uma aposta lógica, por isso, o BC está agindo para preparar o mercado para possíveis mudanças súbitas de humor. É uma forma de evitar o que aconteceu no início de 1999, quando a maxidesvalorização abrupta do real quebrou algumas instituições financeiras.

O presidente Lula, segundo assessores, não está preocupado com a apreciação do real frente ao dólar. A moeda americana, disse o presidente numa reunião, perdeu o valor em todo o mundo graças ao megadéficit dos Estados Unidos em conta corrente. Além disso, o bom momento vivido pela economia brasileira está atraindo uma enxurrada de dólares ao país, em forma de investimentos e de superávit na balança comercial, derrubando a cotação da moeda americana. "O presidente está menos preocupado com o câmbio do que o ministro Guido Mantega", brinca um auxiliar de Lula.

Nos últimos tempos, Lula tem conversado muito com seus auxiliares sobre economia. No governo, seus principais interlocutores são o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e os ministros Guido Mantega e Dilma Rousseff (Casa Civil), além do presidente do BNDES, Luciano Coutinho.

Lula voltou a conversar também com economistas de fora do governo. Entre eles, os principais são o ex-ministro Antonio Palocci, hoje deputado pelo PT de São Paulo, o economista Luiz Gonzaga Beluzzo, da Unicamp, e o senador Aloísio Mercadante (PT-SP), que voltou a freqüentar o Palácio do Planalto.

Para o diretor da NGO Corretora de Câmbio, Sidnei Nehme, a mudança pode ser um instrumento normativo para colocar uma ponta de risco para o especulador baseado no elemento surpresa. Segundo ele, a redução já definida, "não foi pouca coisa" e já teve alguma influência no quadro atual. "Hoje foi um dia de euforia, mas o câmbio ficou estável. Talvez os investidores tenham parado um pouco para pensar", pondera o executivo.

Dessa forma, explica Nehme, o Banco Central pode ter percebido que tem um trunfo e que pode ser ainda mais duro. "O Brasil não tem uma estratégia operacional eficaz, só para períodos de crise. Agora, o BC descobriu que normativamente tem um instrumento muito ágil e que pode afetar tanto o mercado físico quanto a BM&F", avalia. Além disso, criaria uma sinalização de risco que o especulador não tinha. "De uma penada no fim da tarde o BC pode mudar a regra do jogo".

O gerente de câmbio do Banco Prosper, Jorge Knauer, concorda que os bancos já haviam reduzido a posição. "Nos pregões que antecederam a medida, o dólar subiu de um patamar próximo a R$ 1,90 para cerca de R$ 1,95. Mas quem estava vendido em dólar no mês de maio teve um ganho de 5,5% e seria justificável e prudente que fizessem uma redução para realizar lucro", explica.