Título: Coutinho inicia mudanças no BNDES, mas mantém perfis ligados à Cepal
Autor: Santos, Chico
Fonte: Valor Econômico, 21/06/2007, Brasil, p. A2

As mudanças na cúpula do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) após a chegada do economista Luciano Coutinho à presidência da instituição começaram ontem após uma expectativa de 50 dias com uma troca no âmbito da comunidade cepalina concentrada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O economista Antônio Barros de Castro, 69, um dos líderes no Brasil do pensamento desenvolvimentista germinado na Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal), cede a diretoria de Planejamento do banco estatal para João Carlos Ferraz, 54, vindo diretamente dos quadros da Cepal. Ambos são professores da UFRJ.

Castro foi convidado por Coutinho para permanecer no banco, ocupando o cargo de assessor-sênior, com a missão de formular estratégias para o banco e diretamente para o governo brasileiro. "O Luciano fez um convite excepcional e eu vou considerar com muito carinho", disse Castro ao Valor, ressaltando que, por enquanto, vai sair de férias sem prazo para retorno. Foi a segunda passagem do economista carioca pela diretoria do BNDES, a qual presidiu em 1992/1993.

Ferraz, que tirou licença sem vencimentos da Cepal no último dia 18, a pedido do governo brasileiro, para assumir o planejamento do BNDES, ressaltou a identidade com seu antecessor: "O Castro é, junto com a Conceição (a economista Maria da Conceição Tavares), o Lessa (Carlos Lessa, ex-presidente do BNDES) e o Serra (José Serra, governador de São Paulo), um dos cepalinos-mor do Brasil. Estou chegando da Cepal. Então, zero problema. É parceria da boa", afirmou. De 1998 a 2003, Ferraz dirigiu o Instituto de Economia (IE) da UFRJ, período no qual Castro era editor do Boletim de Conjuntura do IE.

Entre os técnicos do BNDES o que se diz é que a troca vai representar maior liberdade para que Castro possa pensar estratégias a respeito do seu principal foco de curiosidade intelectual neste momento: "O reposicionamento do Brasil no mundo sinocêntrico" - o mundo liderado pela China.

O economista disse que tem conversado sobre o tema com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, por cujas mãos foi conduzido a esta sua segunda passagem pela diretoria do BNDES, e, mais recentemente, com o novo ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge. Embora aposentado da UFRJ, é provável que Castro volte à origem, na posição de professor emérito. Além do Brasil versus o avanço chinês, o economista está mergulhado no fenômeno dos biocombustíveis e no estudo do PIB potencial do Brasil na nova conjuntura que o país vive

Ao recorrer à Cepal para pinçar seu novo diretor de Planejamento, Luciano Coutinho deixa claro que o tema da competitividade da indústria brasileira, hoje cada vez mais em questão, seja pelo fenômeno chinês, seja pela prolongada valorização do real, será o foco da sua gestão. Afinal, ele trouxe do Chile (sede da Cepal) um velho parceiro exatamente nesta temática. Em 1993, sob encomenda do Ministério da Ciência e Tecnologia, os dois coordenaram uma grande equipe, majoritariamente da UFRJ e da Unicamp, na produção de um estudo profundo sobre "A Competitividade da Indústria Brasileira".

Em rápida conversa com o Valor , Ferraz não quis fazer qualquer comentário sobre temas do presente, reservando-se para depois que sua nomeação for formalizada. Por e-mail, disse que em julho de 2003 foi para a Cepal como diretor da Divisão de Desenvolvimento Produtivo e Empresarial, cargo que ocupou até a segunda-feira passada. "Minha divisão tem como missão estudar e avaliar o estado de avanço do desenvolvimento produtivo na América Latina e do Caribe e prestar assistência técnica para fortalecer a capacidade dos países de melhor desenhar, implementar e avaliar as políticas públicas relacionadas", informou.

Para o atual diretor do IE, o economista João Sabóia, a possível união dos trabalhos de Castro e de Ferraz no BNDES é "positiva" e complementar, embora, na sua opinião, sejam pessoas com perfis diferentes no que se refere aos campos de estudos. Sabóia destacou o profundo conhecimento de Castro sobre o tema inovação e o conhecimento de Ferraz sobre cada setor da indústria. E destacou também a forte afinidade entre o novo diretor e Coutinho.