Título: EUA resistem a limitar subsídios em US$ 15 bi
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 20/06/2007, Brasil, p. A6

Os Estados Unidos disseram ontem ser "politicamente inviável" limitar os subsídios agrícolas que mais distorcem o comércio em US$ 15 bilhões por ano, e que já fariam "um grande sacrifício" com limite em US$ 17 bilhões. Esse é basicamente o resumo do primeiro dia de negociação crucial do G-4 - grupo que reúne Brasil, Estados Unidos, União Européia e Índia --, que pode definir o futuro da negociação global para liberalização, conhecida como Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC).

"Os Estados Unidos não chegaram onde a gente quer", afirmou o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, que disse ter insistido nas posições do G-20 e ouvido "refutações".

A representante americana Susan Schwab, ao final de uma jornada que começou às 13h30, com um almoço, e terminou quase às 22h, com jantar entre os ministros, fez as declarações de circunstância. Depois de falar de "semana crítica", disse que houve "algum progresso" e que os EUA estão prontos a fazer o possível para que a negociação seja bem-sucedida.

Na reunião sob o manto do segredo e com ordem para ninguém falar, o primeiro tema foi subsídios domésticos agrícolas, que o Brasil e os países em desenvolvimento em geral consideram como a chave para conduzir a um acordo global. Até ontem, os americanos faziam sinalizações, mas não diziam claramente os números. Susan Schwab tomou a iniciativa de abordar a cifra de US$ 15 bilhões, que muitos países consideram como o mínimo para um entendimento e para fazer concessões por sua parte.

Schwab alegou que esse número não pode ser aceito pela administração Bush. Observou que, nesse caso, os Estados Unidos já teriam ultrapassado o limite em sete dos últimos nove anos, sofrendo ameaças de condenações na Organização Mundial do Comércio (OMC). Ela mostrou, em contrapartida, que os EUA poderiam se conformar com limite de US$ 17 bilhões, mesmo sendo obrigados a fazer reformas em seus programas agrícolas. Schwab calculou que, com esse limite, os EUA teriam ultrapassado o montante em cinco dos últimos nove anos.

Para certos negociadores, porém, o montante de US$ 17 bilhões poderia fechar um acordo no ano passado. Hoje, não mais. O agronegócio brasileiro, por exemplo, deu carta branca ao governo para fechar um entendimento com no máximo US$ 15 bilhões para os americanos, desde que Washington aceite disciplinas e tetos de subsídio por produto. No entanto, Susan Schwab disse durante a reunião que o atendimento dessas exigências significaria corte adicional nos subsídios e os EUA assim tampouco podem aceitá-las.

Após a jornada de negociações, o ministro Celso Amorim retrucou indiretamente a americana. Disse que o número que o Brasil quer, sem citá-lo, "tem toda a legitimidade política e é perfeitamente razoável à luz do que foi gasto nos últimos anos nos Estados Unidos".

Além do mais, acrescentou o ministro, a partir da descrição dos programas americanos, o corte pedido pelo Brasil é viável tecnicamente para Washington. "Na negociação, não estamos jogando números na parede, são raciocínios e é o ponderável que está assumindo aspecto mais favorável", disse Amorim, na tentativa de explicar o que aconteceu ontem.

Outro tema de discussão foram os subsídios à exportação. Amorim considerou que "o progresso está se consolidando" para fazer com que a ajuda alimentar seja verdadeiramente ajuda e não subsídios. Além disso, estará na mesa de negociação em Potsdam um mecanismo de monitoramento do acordo agrícola, sugerido pelo Brasil, pelo qual as denúncias à OMC poderão se acelerar, caso as regras sejam violadas.

Os argentinos, porém, não estão convencidos. Anteontem, em Genebra, aliados ao Uruguai, tentaram modificar bastante um texto do G-20 sobre acesso ao mercado na área agrícola. O embaixador Clodoaldo Hugueney reagiu, dizendo que a idéia era "ter flexibilidade'' e não endurecer a posição num momento crucial da negociação.

Em Potsdam, Amorim reiterou que o Brasil está atento às posições da Argentina e dos outros parceiros do G-20 e em sintonia com elas. Já a Índia só quer uma coisa: abrir o menos possível seu mercado agrícola.