Título: O futuro é agora
Autor: Cristino, Vânia; Bonfanti, Cristiano
Fonte: Correio Braziliense, 02/01/2011, Economia, p. 18

Diante de uma previdência pública prestes a implodir, os mais jovens já planejam o futuro e descobrem os planos do sistema privado, que cresce 20% ao ano

A presidente Dilma Rousseff mal assumiu o cargo e já tem uma bomba-relógio nas mãos. O Brasil está no auge do seu período produtivo e, em pouco tempo, se tornará um país de velhos. A mudança será visível a partir de 2030, quando a média de idade da população será de 38 anos diante dos 29 atuais. Se, por um lado, a nova realidade demográfica abre uma chance única para o país ser alçado ao grupo dos mais ricos e industrializados do planeta, por outro, alimenta uma situação dramática. No futuro, não haverá mais crianças e jovens suficientes para financiar as pensões dos aposentados.

Previdência pública brasileira, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) apresenta um deficit anual da ordem de R$ 45 bilhões e não poderá garantir o bem-estar e a renda necessária para a velhice dos brasileiros, cada vez mais longevos. Dada a situação caótica, com rombos crescentes, Dilma e os próximos governos terão de assumir o ônus e implementar medidas nada populares. Não há outro caminho, senão o de uma reforma no setor. Por outro lado, as pessoas terão que aprender a poupar, adiando um consumo imediato por um ganho de qualidade de vida no futuro, e recorrer à previdência privada, que tende a crescer cerca de 20% ao ano nesta década.

Hoje, 130 milhões de cidadãos estão na idade entre 15 e 65 anos, fase em que mais contribuem para a economia do país. ¿Quando essa população se aposentar, teremos um grande problema. Vejo o governo com um comportamento oportunista, de mostrar os benefícios da atual fase econômica, sem se preocupar com o futuro¿, critica o economista da Universidade de São Paulo (USP) Ricardo Madeira. Estão entre as mudanças defendidas por especialistas o aumento da idade mínima para aposentadoria, o controle da elevação dos salários, novas regras de pensão por morte e a criação de um plano de previdência complementar para servidores públicos que quiserem encerrar a carreira com benefícios acima do teto do INSS, de R$ 3,6 mil.

Mais cedo ¿Hoje, 7% da população têm mais de 65 anos e esse índice deve chegar a 23% em quatro décadas. Se a Dilma não iniciar a reforma, outro governo terá que fazer¿, analisa o economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Marcelo Abi-Ramia Caetano. ¿Mais para frente, o próprio governo vai estimular mecanismos de poupança privada¿, aposta. Para o diretor da Caixa Vida & Previdência, Juvêncio Braga, os brasileiros começaram a se conscientizar sobre a necessidade de planejar o futuro por conta própria. A transformação da cultura de consumidor para poupador tem levado cada vez mais os jovens a buscarem os planos de previdência complementar.

Nos cálculos do diretor executivo do Bradesco Vida e Previdência, Eugênio Liberatori Velasques, até há pouco tempo 80% dos planos de seguro de vida eram contratados por pessoas acima de 40 anos. Hoje, essa faixa etária responde por apenas 30% desse tipo de seguro, procurado cada vez mais cedo. Precavida, a advogada Paula Andressa Moreschi, 26 anos, é um exemplo da mudança de mentalidade dos brasileiros. Ela decidiu que não quer problemas com a aposentadoria no futuro. Em novembro, fez um plano de previdência para ela e os dois filhos, com 1 e 4 anos de idade. Paula começou a aplicar R$ 250 por mês no plano gerador de benefício livre (PGBL), que permite deduzir as contribuições da previdência no imposto de renda até 12% da renda bruta anual.

Quando chegar aos 60 anos, Paula poderá pendurar as chuteiras ganhando R$ 5 mil por mês. ¿Pretendo deixar para a aposentadoria, mas, se eu precisar, posso resgatar em qualquer momento, com rentabilidade maior que a da poupança¿, diz. Na conta de cada filho, a advogada deposita R$ 130 por mês. ¿É uma reserva para a educação deles¿. O exemplo da advogada ajuda a engordar as estatísticas que apresentam um incremento de 20% no setor de previdência privada em 2010.

Reflexo As projeções apontam para uma arrecadação total de R$ 44 bilhões este ano, com um total de provisões superiores a R$ 215 bilhões. O vice-presidente de Seguros de Pessoas e Previdência da SulAmérica, Renato Russo, observa que os principais planos disponíveis na previdência privada ¿ além do PGBL, há plano vida gerador de benefício livre (VGBL), que não permite a dedução no Imposto de Renda ¿ se consolidam como excelentes soluções de planejamento do futuro individual e familiar.

O servidor público aposentado Rudi Finger, 60 anos, está convicto disso. Para ele, o retorno da previdência vai representar muito mais do que uma renda adicional. Finger começou a aplicar há 20 anos, quando poucas pessoas tinham essa preocupação. Ao longo do tempo, aumentou o valor destinado e, hoje, transfere cerca de R$ 1,6 mil por mês para dois planos. Ele calcula que, em cinco anos, poderá sacar cerca de R$ 800 mil. ¿Na época em que contratei os planos, pouco se falava em previdência. Se as pessoas querem tranquilidade, elas devem planejar¿.

O aumento do mercado de previdência privada é um dos reflexos do incremento de renda dos brasileiros, intensificado nos últimos cinco anos. Mola propulsora do Produto Interno Bruto (PIB), o consumo das famílias cresceu 5,9% no terceiro trimestre de 2010, comparado ao mesmo período do ano passado. A participação dos gastos das famílias é de quase 60% de todas as riquezas do país. Com mais dinheiro no bolso, além de satisfazer as necessidades básicas, a população passa a ter novas aspirações e a investir em entretenimento, cultura, lazer e, é claro, no próprio futuro.