Título: TCU aprova contas do governo com ressalvas
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 20/06/2007, Política, p. A10

O governo deve publicar, até o fim deste mês, um decreto para tentar evitar casos de corrupção nas transferências voluntárias de bilhões de reais a Estados, municípios e entidades privadas. Ao votar as contas do governo Lula, de 2006, o Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu, ontem, que a falta de fiscalização atingiu transferências de R$ 12,5 bilhões realizadas até dezembro de 2005, apenas em convênios. No ano passado, as transferências voluntárias chegaram a R$ 15 bilhões.

Segundo o ministro Ubiratan Aguiar, relator do processo das contas do governo, esses repasses acabam servindo à corrupção. O dinheiro enviado aos municípios é desviado, por exemplo, na compra superfaturada de ambulâncias, que resultou na criação da CPI das Sanguessugas. Por causa dos problemas na fiscalização, o TCU sugeriu, ontem, ao governo a suspensão imediata destes repasses. Mas, o controlador-geral da União, ministro Jorge Hage, é contrário à medida. "Não é uma solução realista", disse Hage. "É como o marido traído mandar tirar o sofá da sala", comparou.

Hage disse que o governo prepara um decreto com medidas para impedir a corrupção nos convênios com a União. Pelo decreto, serão proibidos convênios em valores inferiores a R$ 100 mil. Serão inscritas no Sistema Integrado de Acompanhamento Financeiro (Siafi) todas as transferências acima de R$ 5 milhões e as feitas para municípios com mais de R$ 500 mil habitantes. O decreto deverá prever a prestação de contas via internet e tornará proibido o saque dos repasses na boca do caixa. O dinheiro será depositado numa conta específica, aberta para o convênio.

Hage afirmou que o texto final do decreto será definido pelos ministérios da Fazenda, do Planejamento, pela CGU e pela Advocacia-Geral da União. A expectativa, segundo ele, é que o texto seja publicado até o fim deste mês.

O controlador-geral também se manifestou contra outra sugestão feita pelo TCU. Durante a votação das contas do governo, o ministro Benjamin Zimler pediu a criação de uma agência reguladora específica para fiscalizar estes convênios com estados e municípios. "Os convênios são uma porta aberta às fraudes e à corrupção", criticou Zimler. "A CGU faz o controle através do sorteio de municípios, mas os resultados não são satisfatórios", completou o ministro do TCU.

Para Hage, não é necessária a criação de uma agência reguladora de convênios. Ele disse que o governo prepara concursos para contratar equipes capazes de fiscalizar o passivo destes convênios - os R$ 12,5 bilhões que a União não sabe se foram pagos ou executados. O controlador-geral disse que essas equipes serão destinadas aos ministérios onde a situação dos repasses é mais crítica, como Educação, Saúde, Integração Nacional, Assistência Social e o Departamento de Empresas Liquidadas do Ministério do Planejamento.

O TCU aprovou as contas do governo Lula, mas fez 27 ressalvas a situações que devem ser melhoradas. O tribunal criticou o fato de o governo não conseguir executar R$ 6 bilhões em quatro fundos destinados a ações específicas: os fundos de Universalização dos Serviços de Telecomunicações, Naval, Aeronáutico e Penitenciário Nacional. "O Fust não executa ações desde 2000", afirmou Aguiar. O ministro Augusto Nardes lamentou que o governo não conseguiu gastar verbas destinadas à Aeronáutica em plena crise no setor aéreo. "O Fundo Aeronáutico teve execução inexplicavelmente nula, apesar de dotação de R$ 1,5 bilhão", apontou Nardes.

Já o ministro Aroldo Cedraz criticou os R$ 39 bilhões em "restos a pagar". Tratam-se de dívidas que o governo rola ano a ano e, por isso, acabam comprometendo investimentos. "É mais do que o orçamento do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome", disse Cedraz.

O TCU também apontou um crescimento na carga tributária. Segundo o tribunal, houve uma elevação de 1,9% na carga tributária entre 2005 e 2006. Usando critérios diferentes daqueles utilizados pela Receita Federal, o TCU calculou o avanço da carga tributária de 33,92% do PIB, em 2005, para 34,58%, em 2006. O pagamento de tributos federais puxou este avanço. A Receita está desde abril com os cálculos da carga tributária praticamente prontos, mas ainda não divulgou os dados. Na segunda-feira, o secretário da Receita, Jorge Rachid, disse que houve redução na carga tributária em 2006, mas não especificou os cálculos que utilizou para chegar a este resultado.

Por causa das eleições de 2006, o TCU fez recomendações à Justiça Eleitoral para que adote medidas de fiscalização dos candidatos. Os ministros pediram ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que faça convênio com o Banco do Brasil para receber os extratos bancários dos partidos políticos e dos comitês financeiros dos candidatos. E recomendou a fiscalização "in loco" dos eventos promovidos pelos candidatos para a arrecadação de recursos de campanha - medida que já foi adotada em alguns Estados nas eleições de 2006, como São Paulo.