Título: Lançamento de ações dobra de volume
Autor: Figueira, Andrea
Fonte: Valor Econômico, 20/06/2007, Caderno Especial, p. F4

Nunca tantas empresas abriram o capital no Brasil. Na busca por recursos para investimentos na expansão de suas atividades, o setor privado brasileiro correu à Bolsa de Valores de São Paulo para fazer IPOs (Initial Public Offerings, ou oferta pública de ações), que bateram recorde neste ano. Estima-se que entre 50 e 60 empresas terão aberto o capital até dezembro, mais do que o dobro dos 26 casos registrados no ano passado. Até junho foram 27 IPOs. O volume captado também deve duplicar no período. Dessa forma, as empresas conseguem turbinar o caixa com recursos a custos mais adequados e - por conta da necessidade de seguirem um conjunto de regras rígidas de operação - acabam ganhando maior visibilidade no mercado em que atuam.

A fase de bonança deve permanecer também no próximo ano. Analistas estimam que entre 80 e 100 novas companhias deverão solicitar abertura de capital em 2008 com o objetivo de expandir o seu crescimento por meio dos recursos de novos investidores. "Pelos nossos cálculos, com base em anúncios já realizados e pela disposição das empresas, acreditamos num número próximo a até uma centena de companhias indo ao mercado no próximo ano e outras 120 empresas em 2009", diz Rodrigo Pasin, sócio da Value Consultoria . "Esse movimento se estende, com certeza, até 2008. Temos mais de 20 pedidos já protocolados na bolsa para o segundo semestre", afirma João Batista Fraga, superintendente de relações com empresas da Bovespa.

Atualmente, com base em dados de junho, existem 368 empresas abertas no país, o maior número já registrado nos últimos três anos. No final de década de 90, o montante era bem maior: em 1998, por exemplo, havia 599 companhias abertas no país. Em 2006, o valor de mercado dos grupos listados atingiu R$ 1,5 trilhão. Até o dia 12 de junho, esse montante estava em R$ 1,9 trilhão.

O volume de IPOs registrados pelos países é um bom indicador do nível de confiança na economia dos agentes de mercado. Mostra que os investidores acreditam na solidez dos fundamentos econômicos e no desempenho do setor privado. Na esteira do atual momento de expansão na atividade econômica, o volume captado pelos grupos privados deve dobrar no Brasil neste ano. Em 2006, as 26 companhias que foram ao mercado, sem contar novas ofertas de empresas já abertas, embolsaram mais de R$ 15 bilhões com a emissão de papéis. Apenas no primeiro quadrimestre deste ano foram R$ 11,4 bilhões, informa pesquisa da Thomson Financial. Esse montante representa alta de 105 % em comparação a 2006. O índice de crescimento é superior à taxa média verificada no resto do mundo, que chegou a 40% em relação ao ano passado, atingindo US$ 70,6 bilhões de janeiro a abril de 2007.

Na avaliação de Luiz Fernando Iani, sócio da DLM Invista Administração de Recursos, esse movimento já tem se refletido nas operações de créditos no mercado financeiro. "Com mais companhias abrindo capital, certas atividades financeiras perderam a competitividade. O spread bancário então precisa cair, como já está acontecendo", afirma. "A corrida aos IPOs tem efeitos sobre todo o mercado de crédito brasileiro", completa.

Todo esse dinheiro vem, em grande parte, de fora. Em média, cerca de 68% do financiamento das operações brasileiras de IPOs neste ano ocorreu com capital internacional, calculou o Valor com base em números da Bovespa. Neste ano, a taxa foi além: na companhia de investimentos imobiliários PDG Realty e no Banco Pine (que fizeram IPOs em 2007), a participação chegou a 93% e 90%, respectivamente. Devido à expressiva liquidez no exterior, os estrangeiros se mantêm como os maiores investidores de companhias abertas brasileiras. Isso ocorre porque há muito mais dinheiro circulando na economia mundial, o Brasil tem opções consideradas atraentes com a expansão da atividade econômica em 2007 e, com isso, se tornou a bola da vez no mercado de capitais.

Essa entrada de recursos externos em determinadas companhias acaba criando um efeito dominó no mercado: se um grupo se capitaliza, os concorrentes acabam tendo de se mexer sob o risco de perder mercado. A Usina São Martinho, do setor sucroalcooleiro, por exemplo, seguiu os passos da Cosan (um dos maiores produtores de açúcar e etanol do mundo) ao abrir capital neste ano. A administradora de shoppings BR Mall foi ao mercado dois meses depois do grupo Iguatemi. Mas é o setor imobiliário que tem atraído as maiores atenções dos investidores. Doze construtoras já realizaram IPOs desde 2004, quando a Natura decidiu fazer uma oferta pública de ações, após anos de raros casos de ofertas de papéis, e começou o atual movimento de ida à bolsa. Já são 17 as empresas do segmento listadas na Bovespa.

Uma dessas companhias é a Rodobens Negócios Imobiliários, que estreou na Bovespa em janeiro de 2007. "Nosso processo de abertura foi bastante rápido. Já estávamos nos preparando há anos para isso, logo, ganhamos agilidade", diz Eduardo Gorayeb, diretor presidente da Rodobens. Na Totvs, uma das maiores empresas de software de gestão do Brasil, a situação foi a mesma. "Preparamos a empresa aos poucos. Foram seis anos trabalhando como empresa fechada, mas com regras internas de empresas aberta, até realizarmos o IPO, no ano passado", conta o presidente Laércio Cosentino.