Título: Educação, crescimento econômico e inclusão social
Autor: Werthein, Jorge
Fonte: Valor Econômico, 22/12/2006, Opinião, p. A14

É princípio aceito e comprovado que a educação desempenha papel econômico, social e político muito importante, inclusive ao criar e distribuir renda, conforme evidenciam numerosas pesquisas e exemplos de vários países. Convém, portanto, insistir no fato de que investimentos em educação geram os melhores retornos.

Mantendo constantes os fatores "capital, terra e trabalho", o aumento de um ano na média educacional da população economicamente ativa determina incremento de 5,5% na taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de um país. Vale lembrar que a educação tem efeitos ponderáveis não apenas sobre a produtividade e o trabalho, mas também sobre a saúde, a cidadania, a violência, o meio ambiente e outros setores. Alguns desses efeitos são difíceis de medir. Quanto o sistema de saúde economiza se as mães têm nível de escolaridade mais alto e sabem cuidar melhor de si e dos filhos? Quanto se economiza pela redução do fracasso escolar se mais e melhor educação melhora o desempenho educacional das futuras gerações? Quanto se economiza ao se evitarem danos ao meio ambiente quando a educação formal e informal ensina o homem a respeitar a sua condição de inquilino do planeta? Quanto se obtém de benefícios quando a educação contribui para uma vida mais longa, mais produtiva e de melhor qualidade?

Atualmente, o Brasil não destina nem 4% do PIB exclusivamente à educação. O investimento anual no setor não deveria ser inferior a 6%, e é preciso atingir esse índice rapidamente e mantê-lo por longo período. Diversos estudos apontam que persistem no Brasil enormes obstáculos à elevação da qualidade do ensino. Para superá-los, deve-se promover uma melhor formação dos professores, a incorporação do estudo de ciências desde o ensino fundamental, o uso de novas tecnologias de informação e comunicação nas escolas e entre os professores, e o enfrentamento das situações de violência no interior e no entorno dos estabelecimentos escolares. Afinal, a violência no ambiente escolar contribui para mau desempenho, repetência e evasão, além de desvalorização da escola.

As desigualdades sociais, a exclusão e a pobreza figuram também entre os principais problemas que afetam crianças, adolescentes e jovens brasileiros. As desigualdades, tanto geográficas quanto sociais, prejudicam o desenvolvimento. Se não se empreender grande esforço para superá-las, há sério risco de não se estabelecerem condições essenciais para o crescimento da economia e o desenvolvimento da sociedade.

Particularmente no Brasil, percebe-se a existência de um cruzamento cruel de dois tipos de insuficiência: a qualidade da educação em geral é baixa, ainda mais baixa quando oferecida aos pobres. A perversidade dessa combinação chama a atenção para um paradoxo assustador: a desigualdade da sociedade e das regiões se reproduz nas escolas. Isso se evidencia ao analisar-se, por exemplo, a Região Nordeste, onde, segundo avaliações, estão as piores e mais pobres escolas do país, atendidas pelos professores menos preparados.

Uma verdadeira democracia implica educação de qualidade para todos. Enquanto não se garantir o acesso ao conhecimento à maioria da população, o país nunca será uma potência, não viverá uma democracia plena, tampouco terá crescimento significativo e sustentável.

-------------------------------------------------------------------------------- Um ano a mais na média educacional determina incremento de 5,5% na taxa de crescimento do Produto Interno Bruto --------------------------------------------------------------------------------

É notório que os investimentos em educação têm sido uma das principais respostas historicamente utilizadas no Brasil para a inclusão social, com resultados estimulantes do ponto de vista quantitativo. No transcurso do tempo, porém, as oportunidades de mobilidade social ascendente, oferecidas pela educação, reduziram-se. Os investimentos em infra-estrutura, equipamento e capacitação docente foram relativamente insuficientes e conduziram a uma deterioração da qualidade do ensino e da aprendizagem.

Nesse contexto, o significado do Fundeb é profundo, pois ao financiar todos os níveis da educação básica, com maior participação federal, reduzem-se as disparidades entre Estados e municípios, bem como entre grupos sociais. Essa redução é urgente, pois se trata da única forma de promover a eqüidade no tratamento dado à educação infantil, fundamental e média e, conseqüentemente, garantir, a todas as crianças e jovens, igualdade de oportunidade de acesso à educação, independentemente de onde morem e da entidade governamental a que estejam vinculadas as escolas públicas que essas crianças e jovens freqüentarão.

Além disso, o Fundeb representa um avanço importante, pois torna necessário que os recursos financeiros estejam disponíveis e que Estados e municípios possam ser beneficiados com isso. Equivocam-se aqueles que afirmam que o Brasil já investe suficientemente na área da educação e que basta melhorar a gestão dos recursos existentes. O Brasil precisa, como já mencionado, de mais recursos para a educação. O fato de aplicar melhor e mais eficientemente os recursos não significa que não haja necessidade de mais investimento em educação. Uma gestão eficiente, aliada à disponibilidade de recursos, é uma resposta bastante adequada para começar a resolver os problemas da educação brasileira.

A educação pública, de acordo com as normas legais vigentes, é de responsabilidade dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios. Mas o Brasil ainda não definiu uma verdadeira política de Estado para a educação. Uma política de Estado, construída e implementada em conjunto com a sociedade civil, promoveria uma transformação fundamental na educação. Isso pode ocorrer por meio de amplo pacto educacional.

Um pacto educacional assim concebido viabiliza uma política de Estado, ou seja, uma política que, percebendo o alcance econômico, social e político da educação, tenha a ousadia de rever prioridades e conceber a educação não mais como gasto social, mas como investimento indispensável para ajudar a estabelecer as bases estruturais de uma nação, sobre as quais estarão assentadas as outras políticas, em uma visão sinérgica de desenvolvimento.

Jorge Werthein é doutor em Educação pela Universidade Stanford (EUA) e assessor especial do secretário-geral da Organização dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura - OEI. jwerthein@oeibrpt.org