Título: Lula decide adiar anúncio do pacote
Autor: Romero, Cristiano e Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 21/12/2006, Brasil, p. A3

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu ontem, após reunião que durou aproximadamente seis horas, adiar para janeiro o anúncio de medidas para estimular o crescimento econômico. Foram várias as razões do adiamento, desde as divergências, ao longo do dia, sobre a definição do novo valor do salário mínimo, até a recomendação do marketing da Presidência para que Lula não anunciasse medidas que ele reputa importantíssimas em véspera de feriado.

No início da noite de ontem, os ministros do Trabalho, Luiz Marinho, e da Previdência, Nelson Machado, fecharam o acordo com representantes das centrais sindicais para um reajuste do mínimo de R$ 350 para R$ 380, um aumento nominal de 8,56% e real (superior à inflação) de 5,3%; e uma fórmula de reajuste para os próximos anos: inflação do IPCA mais a variação real do PIB de dois anos anteriores.

A diferença no valor do mínimo aumenta em cerca de R$ 1 bilhão ao ano as despesas do governo com o pagamento de aposentadorias do INSS. São, assim, recursos a menos para desonerar o setor produtivo do pagamento de impostos, diminuindo, portanto, o estímulo a ser dado ao setor privado para aumentar investimentos.

A negociação com os sindicalistas, ocorrida sem a presença dos dois ministros da área econômica - Guido Mantega, da Fazenda, que participava no mesmo horário de confraternização com jornalistas, e Paulo Bernardo, do Planejamento -, teria recebido o aval do presidente Lula. Enquanto negociavam com as centrais, Marinho e Machado consultaram o presidente e receberam dele autorização para fechar o valor em R$ 380, contra a opinião da área econômica. Os sindicalistas definiram, também, com os dois ministros, a correção da tabela do Imposto de Renda (IR) a partir de janeiro.

Outra divergência diz respeito à regra permanente de correção do salário mínimo. A equipe econômica vinha defendendo reajuste anual com base no IPCA, acrescido de variação do PIB per capita. Na negociação com as centrais sindicais, Marinho e Machado concordaram com a aplicação do IPCA, mais a variação do PIB real.

Ontem, assessores de Mantega confirmaram que essa regra de correção foi o máximo que o governo conseguiu. "Reconhecemos que isso é melhor do que o que vinha acontecendo", observou uma fonte da Fazenda.

Há aspectos do pacote que não estavam fechados ontem. O ministro Mantega, por exemplo, revelou, no Senado, que o governo pretende usar o excesso de superávit primário deste ano como autorização para gastar mais, por meio dos Projetos-Piloto de Investimento (PPIs), em 2007. Além disso, o governo quer autorização do Congresso para aumentar o orçamento dos PPIs, de 0,15% para 0,5% do PIB.

Isso significa que, no ano que vem, o superávit será menor. A dúvida é saber quanto. Na área econômica, segundo uma fonte, ainda não se sabe se o que está previsto de PPI será somado ao excesso de superávit deste ano, ou se essa sobra será incorporada ao 0,5% do PIB. Dependendo da decisão, o impacto negativo sobre a economia de gastos primários em 2007 pode chegar, em tese, a 0,7% do PIB.

Um item do pacote sobre o qual há consenso é a fixação da regra de correção dos salários do funcionalismo - IPCA mais 1,5% ao ano. A medida será proposta por meio de projeto de lei complementar. Assessores da área econômica acreditam que essa regra, combinada com a que estabelece um mecanismo de correção do salário mínimo, limitará a expansão anual dos gastos correntes a algo entre 3% e 3,5%, num cenário de crescimento econômico de 5% ao ano - neste ano, as despesas subiram, até novembro, 15,1% em termos nominais. "O importante é conter e dar previsibilidade aos gastos correntes", explicou uma fonte.

Durante encontro com integrantes da bancada do PP, Lula teria afirmado que não queria anunciar nada de maneira "açodada" e que a divulgação das medidas "concorreria com as festas de Natal". Disse também que pretende consultar líderes dos partidos aliados antes de finalizar as propostas. A informação do adiamento do pacote foi dada pelo porta-voz da Presidência, André Singer.

"O pacote será anunciado quando estiver tudo bem, independentemente da data", disse um assessor. "O presidente está vendo esse conjunto de medidas como um elemento central do segundo mandato."