Título: A infra-estrutura precisa de desoneração tributária
Autor: Alves, Rubens T.
Fonte: Valor Econômico, 27/12/2006, Opinião, p. A10

Fica cada vez mais claro que a infra-estrutura, no Brasil, precisa de uma extensa modernização, com uma necessidade urgente, em todos os segmentos, de investimento e de atualização tecnológica. Caso os investimentos continuem no nível em que estão, a infra-estrutura será o principal obstáculo ao crescimento da economia. Porém, para incentivar tais investimentos, algumas providências simples, de desoneração tributária, deveriam ser adotadas pelo governo federal.

O discurso político predominante nas últimas eleições, tanto da oposição como do governo, converge para as PPPs e as concessões. Nas PPPs e nas concessões a titularidade dos serviços permanece com o Poder Público, que solicita aos investidores privados que façam os investimentos e operem os serviços no seu lugar, em troca das tarifas, ou das complementações tarifárias, previstas para as PPPs.

Não há lógica econômica que sustente a carga tributária (ICMS, IPI, COFINS, PIS-PASEP, ISS, IR, CPMF, CSLL, CIDE, INSS) sobre as futuras PPPs ou concessões, uma vez que o governo dará com uma mão (a complementação tarifária) e tirará com outra (a carga dos impostos). Isso onera inutilmente as tarifas, que continuarão sendo pagas pelos usuários. Procedimentos simples, de desoneração fiscal, contribuiriam muito para viabilizar investimentos em infra-estrutura. Basta que o fisco regulamente tais desonerações com base em precedentes.

Os serviços de construção civil e de engenharia, quando contratados pela União, Estados e municípios, autarquias e empresas concessionárias de serviços públicos, ficam isentos de ISS, conforme diz a Lei Complementar nº 22, de 1974. Então, por que não se amplia esse entendimento a todos os serviços prestados por concessionárias de serviço público, visando uniformizar a medida, como ocorreu com o ISS sobre pedágios (uniformizado em 2% pela Lei Complementar nº 100 de 1999)? O concessionário atua em substituição a uma esfera de governo, mas é tributado por outra, em alíquotas variáveis.

Problema semelhante ocorre com o ICMS, pois Estados, municípios e autarquias são isentos do recolhimento na aquisição de bens, mercadorias ou serviços (Decreto nº 48.024 de 2003) - porque instituí-lo para os operadores de concessões públicas, inclusive PPPs, se estão apenas substituindo a Autoridade Pública na prestação dos mesmos serviços públicos?

As empresas bolivianas, quando contratadas pela Petrobras para construir o gasoduto Bolívia-Brasil, foram isentas do recolhimento na fonte do imposto de renda e da contribuição social brasileiros (Portaria nº 41/1997, do ministério da Fazenda). Essa foi uma medida lógica de redução do custo da obra, que, pergunto, porque não se aplica o mesmo a todas as obras de infra-estrutura para os operadores brasileiros?

-------------------------------------------------------------------------------- Mesma medida de redução do custo deve ser aplicada a todas as obras de infra-estrutura, inclusive para os operadores brasileiros --------------------------------------------------------------------------------

Quando implementou no Brasil um programa de privatizações, o governo aceitou como pagamento títulos de dívida emitidos pelo próprio governo. Dessa forma, equalizou a operação a uma permuta, diferindo o recolhimento de PIS, COFINS, imposto de renda e contribuição social (Lei nº 8.383, de 1991) sobre o ganho de capital da operação até a efetiva realização. Por que não se adota procedimento semelhante para os pagamentos de complementação que ocorrerão nas PPPs? No caso da PPP da rodovia estadual MG-050, o governo de Minas Gerais propõe o pagamento de até R$ 35 milhões anuais de complementação tarifária para o operador que assumir a gestão da rodovia. Como desse montante R$ 9 milhões voltarão para os cofres públicos por tributação, pergunto que sentido tem isso para o cálculo do pedágio ou para a viabilidade do projeto?

A área de saneamento básico necessita urgentemente de um incremento nos investimentos e, em boa hora, o Senado aprovou o substitutivo do deputado Júlio Lopes, em julho desse ano - lei que aguarda aprovação na Câmara de Deputados. Há nessa lei um dispositivo (art. 55) estabelecendo que os investimentos realizados no setor, por entidades públicas ou privadas, poderão ser utilizados como crédito perante COFINS e PIS/PASEP. Esse procedimento deveria ser amplamente disseminado para todos os investimentos em infra-estrutura, pois, evidentemente, está na direção de incentivar o que é necessário.

Nunca é demais lembrar: o que interessa à sociedade é o que sobra para ela depois que o governo faz sua parte com os tributos. Em situação de carência de infra-estrutura, quanto menor a parte retida pelo governo sobre os tributos que são pagos pela sociedade, mais sobra para a construção dessa mesma infra-estrutura. Não há lógica econômica ou técnica para a tributação integral, como ocorre hoje, sobre atividades típicas de governo, tais como as previstas para as PPPs ou concessões operadas por investidores privados.

Nesse período pós-eleição, há uma oportunidade genuína de aumento da eficiência do governo federal na gestão das questões da infra-estrutura. E isso pode começar pela honesta desoneração e simplificação tributária sobre as concessionárias, tanto no regime das PPPs, como nas concessões comuns.

O governo federal possui um Fundo Garantidor para PPPs de R$ 6 bilhões - ainda sem uso. O BNDES, a Caixa Econômica e os Fundos de Pensão dispõem de amplos recursos não utilizados para o financiamento da infra-estrutura e, apesar disso, não se vê os projetos andarem. Um fator crítico para a lentidão, entre outros, pode ser o nó tributário.

Cabe, portanto, ao governo federal tomar a iniciativa. Os investidores privados vão considerar isso imediatamente. Estados e municípios terão maior facilidade com seus projetos. A sociedade, enfim, aguarda um sinal de racionalidade e de ação na esfera tributária, visando à melhoria, agudamente necessária, de nossa infra-estrutura.

Rubens Teixeira Alves é mestre em engenharia civil e de produção, consultor especializado em finanças associado do Albino Advogados Associados.