Título: Parecer da AGU reforça a posição dos militares
Autor: Vera Saavedra Durão e Thiago Vitale Jayme
Fonte: Valor Econômico, 19/01/2005, Brasil, p. A5

Um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) interfere diretamente numa disputa bilionária entre a Companhia Vale do Rio Doce e o grupo australiano Rio Tinto. As duas empresas disputam quem vai dar as cartas no pólo mínero-siderúrgico de Corumbá, na fronteira do Mato Grosso do Sul. Em parecer de outubro de 2003, a AGU entendia que a legislação permitia a exploração de áreas de fronteiras por empresas estrangeiras. Mas num novo parecer, concluído em junho de 2004, o governo mudou de opinião e foi claro ao dizer que esses investimentos dependem de aval do Conselho de Defesa Nacional. Em resumo, o governo Lula admite, no novo parecer, que as exigências feitas, por lei, para a exploração de fronteira durante o período militar continuam valendo. Mesmo depois da abertura para atividade de exploração de recursos minerais por multinacionais feita por emenda constitucional em 1995, no governo Fernando Henrique Cardoso, em 1995. A Lei nº 6.634 determinou a faixa de fronteira como "área indispensável à segurança nacional". Essa lei estabeleceu uma série de proibições nas fronteiras, inclusive os atos relativos à instalação de "indústrias dedicadas às atividades de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de recursos minerais". A exceção da lei para que essas empresas possam atuar é um "assentimento prévio" do antigo Conselho de Segurança Nacional, que foi substituído pelo Conselho de Defesa Nacional. O novo conselho é ocupado pelo vice-presidente da República, José Alencar, pelo presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha, pelo presidente do Senado, José Sarney, pelos ministros da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, da Defesa (Alencar), das Relações Exteriores, Celso Amorim, do Planejamento, Nelson Machado, e pelos comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, respectivamente, almirante de esquadra Roberto de Guimarães Carvalho, general Francisco Roberto de Albuquerque e tenente-brigadeiro-do-ar Luiz Carlos Silva Bueno. Entre as funções do conselho está a de propor critérios para o uso de áreas indispensáveis à segurança, "especialmente na faixa de fronteira", e preservar a exploração de recursos naturais. A Emenda nº 6 veio para modificar grande parte da lei de 1979. O espírito da emenda era o de possibilitar a atuação de companhias estrangeiras no país, antes limitada por questões de "interesse nacional". O objetivo do governo Fernando Henrique Cardoso em promulgá-la era o de ampliar a participação de empresas estrangeiras em investimentos no Brasil. Antes da Emenda nº 6, apenas empresas brasileiras ou de capital nacional podiam explorar recursos minerais. Após a emenda, essa atividade passou a ser permitida também para empresas constituídas sob as leis brasileiras e com sede e administração no país. Mas, para a AGU, a emenda não altera a situação na faixa de fronteira. "Ainda que a regra geral não mais imponha às empresas de mineração que atuam no país que o seu controle acionário pertença a brasileiros, a regra especial (a lei de 1979) assim o exige quando as atividades a serem desenvolvidas por essas empresas ocorrerem na faixa de fronteira", afirmou o consultor-geral da União, Manoel Volkmer de Castilho. "É que a Constituição, como se viu, prevê legislação específica para regular a atividade nessa área", justificou Castilho, no parecer aprovado pelo advogado-geral, Alvaro Augusto Costa. De acordo com o texto, as exigências da Lei nº 6.634 para a atuação de estrangeiros na faixa de fronteira não foram afastadas pela Emenda nº 6, de 1995. O parecer da AGU foi realizado a pedido do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Ao encomendar o texto à AGU, os militares reforçaram a sua posição a favor de "aval prévio" para as companhias estrangeiras atuarem nas fronteiras do Brasil. Após a assinatura do parecer, o governo promoveu um seminário para reforçar o posicionamento a favor dos militares. O encontro ocorreu no Palácio do Planalto em 7 e 8 de outubro passado e foi organizado em parceria pelo Gabinete de Segurança Institucional da Presidência e pela AGU. Sob o título "Faixa de Fronteira: Novos Paradigmas", integrantes do segundo escalão do governo Lula defenderam o "aval prévio" dos militares a investimentos estrangeiros no Brasil. Ponto para a Vale.