Título: Posse põe em xeque cargos comissionados
Autor: Agostine, Cristiane e Bueno, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 18/12/2006, Especial, p. A14

Um contingente de mais de 100 mil pessoas em todo o país aguarda a troca de governo em estado de alerta. Pela lei, todos os funcionários comissionados dos Estados deverão ser exonerados em 31 de dezembro. Levantamento dos cargos em comissão feito pelo Valor em nove Estados revela que, em algumas unidades da Federação, o percentual de comissionados chega a quase metade do total de servidores, mas a situação não é uniforme. Em outros Estados, o percentual não chega a 2% do total.

O Estado que, proporcionalmente, tem o maior número de comissionados é Tocantins. São 50.810 servidores ativos e 22.882 cargos em comissão. Desses, 19.927 são exclusivamente comissionados. O número é maior do que o do governo federal, onde excluídas as estatais, são 19.897 servidores (3,8% do total).

De 2003 a 2006, foram criados 5.014 cargos em comissão no Estado - número maior do que o total de comissionados de Estados como Rio Grande do Sul e Pará. A secretária de Administração, Sandra Araújo, explica que entre os comissionados, estão "desde o governador e secretários, até funcionários da limpeza e profissionais da saúde". A concentração está nas pastas de Educação e Cultura (8.917) e Saúde (2.671).

Segundo Sandra, ficaria muito caro, por exemplo, terceirizar serviços como a limpeza e muitos funcionários são contratados temporariamente. "Tocantins é um Estado que está em franca expansão. Se aumentar a população, aumentará a demanda por escolas e funcionários. Mas, no próximo ano, faremos um concurso para regularizar a situação", diz. O governador reeleito, Marcelo Miranda (PMDB), deverá manter o número atual desse tipo de cargo. Está amparado em uma lei sancionada em 2000, na Assembléia Legislativa, que permite ao governador criar e extinguir cargos públicos sem passar pelo Legislativo.

Em São Paulo, os cargos em comissão correspondem a 2,93% do total. São 20.849 comissionados, espalhados nas secretarias, autarquias, empresas e fundações. O secretário da Casa Civil, Antonio Rubens Costa de Lara, explica que o Estado já passou por um "grande enxugamento da folha de pessoal", no governo de Mário Covas (PSDB) e atualmente "tem cargos comissionados de acordo com suas necessidades". A maior concentração está nas autarquias (4,02% dos funcionários) e a menor, nas fundações, 1,68%.

Numericamente, São Paulo tem mais cargos comissionados do que a União. Nessa comparação, estão excluídos tanto os servidores das estatais paulistas quanto das federais. Os servidores paulistas da ativa também são mais numerosos que os da União. São 650.625. Somados aos das estatais, são 709.349 servidores. O governo federal conta com 513 mil funcionários civis. O governo paulista explica que a rede de ensino, a saúde e a segurança concentram esses servidores.

O Estado com o menor número de comissionados é o Rio Grande do Sul. Apenas 1,6% dos 165,5 mil funcionários são comissionados. E a quantidade de cargos não deverá aumentar. A crise que se arrasta há anos nas contas públicas do Estado obrigou o governo a trabalhar com pouco mais da metade desses cargos desde o início do governo Germano Rigotto (PMDB). Já no primeiro mês da gestão, o governador determinou a extinção de 2.278 vagas, das 4.985.

"Para reabrir as vagas extintas, o novo governo (da tucana Yeda Crusius) teria que aprovar uma lei na Assembléia Legislativa", comenta o chefe da Casa Civil, Josué Barbosa. A hipótese, entretanto, é improvável. Yeda já tentou, por meio do PSDB e dos aliados, limitar em 3% o reajuste dos repasses para as folhas de salários do Judiciário e do Ministério Público em 2007, mas não teve sucesso. O índice será de 3,8%.

Conforme Barbosa, o corte dos cargos em comissão atingiu linearmente todas as áreas do governo, exceto as pequenas Pastas que praticamente não possuem equipes próprias, como as de Turismo e da Reforma Agrária. Outra exceção foi a própria Casa Civil, que forma o "coração" do governo e necessita de maior quantidade de cargos de confiança, segundo o secretário.

As dificuldades de caixa gaúcho, que deve encerrar o ano com um déficit de até R$ 1,7 bilhão ante um Orçamento de R$ 19,5 bilhões (a equipe de Yeda prevê um rombo de R$ 2,4 bilhões em 2007), também tiveram impacto sobre o quadro geral do funcionalismo. Segundo o contador e auditor geral do Estado, Roberval Marques, praticamente todas as categorias enfrentam defasagem salarial e de contingente de servidores.

Com a contenção das contratações e dos reajustes aos funcionários, o governo estadual até conseguiu reduzir o comprometimento da receita corrente líquida com a folha de salários de 48,3% nos 12 meses encerrados no primeiro quadrimestre de 2003 para 40,8% no mesmo intervalo até agosto deste ano (ver tabela). Neste período, a receita anualizada cresceu 45,4% e os gastos com salários, 22,8%, para R$ 5,3 bilhões, mas o cálculo exclui as despesas com pensões, Imposto de Renda dos servidores e diversos auxílios.

Assim como no Rio Grande do Sul, o governador do Pará, Simão Jatene (PSDB) não ocupou todos os cargos comissionados existentes. Dos 4.206 cargos, 924 estão desocupados e os comissionados representam 3,8% dos ativos.

Em Pernambuco, a trajetória dos cargos em comissão também é de queda. Quando Jarbas Vasconcelos (PMDB) assumiu, em 1999, encontrou 9.812, número que chegou a 8.913 no fim de seu segundo governo - 7,3% dos 121 mil servidores ativos. No Estado do Ceará, a porcentagem é semelhante: 7,7% dos 85.400 ativos são comissionados.

Outros 15 mil comissionados estão preocupados com a troca do governo na Bahia. O PFL comandou o Estado por 16 anos e a equipe que está no governo desde o primeiro mandato teme sair junto com o governador pefelista Paulo Souto, quando Jaques Wagner (PT) assumir. São 15.579 cargos comissionados (9% dos 171 mil empregados).

A cada novo mandato, os servidores que estão em cargos de comissão são os primeiros que podem ser afetados. Em Santa Catarina, o clima entre os funcionários comissionados nas secretarias é de indefinição, embora tenha ocorrido reeleição no Estado. Pelos corredores, as conversas giram em torno dos nomes do próximo governo de Luiz Henrique da Silveira (PMDB), reeleito em composição de chapa com PSDB e PFL, e que já declarou que este será um "novo governo", com novos indicados.

Hoje são 1.746 funcionários comissionados no governo, segundo a Secretaria de Administração. Eles ocupam cargos de confiança como é o caso dos secretários, mas também chegam a um segundo escalão nas funções de gerentes e até coordenadores de projetos, além de funções nas 30 secretarias regionais, localizadas em municípios distantes de Florianópolis, que foram criadas para descentralizar o governo.

"A idéia do governador neste segundo mandato é fazer uma grande realocação dos comissionados, e, se for possível, diminuí-los", explica um dos coordenadores técnicos do governo de transição, Neri dos Santos. "Mas reduzir não é a intenção primordial porque o Estado já tem um quadro enxuto. Temos um quinto dos comissionados da Bahia".

A realocação envolveria a saída de funcionários comissionados de cargos importantes, que precisam de qualificação, como diretores, gerentes e gestores de pessoas, projetos, de finanças e de planejamento. A intenção é que metade dos cargos ocupados por comissionados seja preenchida por servidores de carreira a partir de janeiro de 2007. O governador foi reeleito numa ampla coligação e terá que abrir espaço para as nomeações dos novos aliados.

(Colaborou Patrick Cruz, de Salvador)