Título: Previsões para 2011
Autor: Pinsky, Jaime
Fonte: Correio Braziliense, 03/01/2011, Opinião, p. 13

Conta-se que um ministro da Fazenda, ainda durante o regime militar, costumava dizer que o Brasil ia bem, os brasileiros é que iam mal. Da mesma forma, quando se diz que ¿o brasileiro¿ quer saber o que vai acontecer com o Brasil em 2011 entenda-se que ele gostaria de saber o que vai acontecer com ele. Como cada caso é um caso, não posso adivinhar o futuro de todos. E, porque não gosto de errar como os economistas, não me arrisco a adivinhar o futuro do Brasil. Mas não custa dar uns palpites, coisa que faço na qualidade de cidadão, não na de historiador, já que não quero comprometer a, digamos, categoria.

No campo da política, Dilma tomará posse e surpreenderá com um comportamento descolado daquele do antecessor, em algumas áreas. Na política externa ela já deixou claro que não aceita a constatação cínica de que nações não têm amigos, têm interesses, o que a levará a criticar atentados evidentes à vida e à liberdade, principalmente em países em que os valores da Revolução Francesa ainda não chegaram.

Menos intuitiva, mas mais preparada do que o antecessor, Dilma se livrará paulatinamente de conselheiros que conduziram nossa política externa de modo a nos afastar de uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU, prestigiando regimes antidemocráticos, além de não melhorar nossa posição no comércio internacional. Tudo leva a crer que nossa presidente, apesar de não ter um passado de lutas feministas, permita o avanço de práticas democráticas ao abrir espaço para que mulheres, assim como outras minorias (no sentido social, não quantitativo) possam se afirmar e obter direitos legítimos. E isso inclui, sim, uma discussão séria sobre o aborto, sob o ponto de vista da saúde pública e não sob a ótica, necessariamente comprometida, de religiões organizadas.

Todos sabemos que o problema econômico do Brasil é o de infraestrutura, seja material, seja humana. Aeroportos, portos, estradas precisam ser construídos de modo prioritário. Mão de obra qualificada precisa ser preparada depressa. Vejo boas condições para que nossa presidente, consciente desses problemas, concentre dinheiro e vontade política no sentido de permitir o salto qualitativo e quantitativo tanto nas obras que precisam ser feitas imediatamente (do contrário o país para mesmo), quanto em uma revolução educacional que só pode começar pela requalificação dos nossos docentes, em todos os níveis. E, é claro, os professores precisam ser valorizados, tanto simbolicamente, quanto monetariamente. E precisam ser cobrados pelo seu desempenho. Espero e acredito que teremos finalmente a revolução na educação que se faz necessária há tanto tempo.

Não consigo imaginar que os documentos produzidos no tempo da ditadura militar continuem ¿secretos¿. Não consigo acreditar que as famílias de opositores ao regime instalado em 1964 continuem sem poder enterrar seus mortos. Anistia, como já foi mais uma vez definido por entidade internacional, não implica em silêncio, segredo, ou irresponsabilidade por parte do governo. Mesmo que não se concorde (ou não se concordasse, na ocasião) com a posição do combate armado, há que se atribuir responsabilidades e não encobrir, com compensações financeiras, algumas até indevidas, crimes praticados e mantidos em segredo pelo aparelho do Estado. Sem afrontar ninguém, mas com decisão, nossa presidente abrirá arquivos, permitirá o trabalho de historiadores e o ritual de passagem das famílias.

Meu improvável leitor estará, a esta altura do texto, perguntado se minhas ¿previsões¿ só ocorrem no que se refere à suprema mandatária. Por certo que não. Embora eu não tenha o talento do polvo Paul (aquele que acertou todos os resultados da Copa da África do Sul), arriscarei alguns resultados esportivos. O Corinthians será eliminado da Copa Libertadores da América bem antes de chegar à final e seus torcedores exigirão a saída do técnico e do presidente do clube. O São Paulo será campeão da Taça Sul Americana, vencendo a final por pênaltis. Rogério Ceni fará um dos gols e defenderá uma bola incrível, após o que se candidatará a presidente do clube. Wanderley Luxemburgo será declarado em decadência até pelos jornalistas esportivos mais míopes e Celso Roth sonhará todas as noites do ano de 2011 com a derrota para um time da República Democrática do Congo. Bernardinho será mais uma vez campeão. As torcidas do Grêmio e do Internacional de Porto Alegre brigarão, assim como as de Atlético e Cruzeiro.

Enfim, nada de surpresas no esporte. Mas no governo, podemos esperar muitas.