Título: PT pode ficar sem o fundo partidário
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 14/12/2006, Política, p. A11

O PT deve perder o direito à cota do Fundo Partidário para o ano que vem, mas o presidente Lula dificilmente terá problemas de impugnação de seu mandato por causa das contas de sua campanha à reeleição. Essas são as principais conseqüências do julgamento das contas da campanha de Lula pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Os ministros do TSE aprovaram, por cinco votos a dois, as doações feitas ao candidato Lula. Por outro lado, eles reprovaram, por quatro votos a três, as contas de campanha do Comitê Financeiro do PT. O motivo da reprovação foi a doação de R$ 10 mil pela empresa Deicmar. A maioria dos ministros entendeu que a Deicmar é concessionária de serviço público e, portanto, não poderia ter feito a doação. A empresa administra o Porto Seco de Santos.

A campanha de Lula recebeu doações tanto pelo Comitê Financeiro do PT, quanto diretamente em nome do candidato. Como o TSE verificou problemas nas contas de campanha do PT, a expectativa é que o partido seja punido conforme previsão da Lei Eleitoral (nº 9.504). O artigo 25 da lei estabelece que o partido que descumprir as normas referentes à arrecadação de recursos perderá o direito ao recebimento da cota do fundo partidário para o ano seguinte. A cota do PT para 2007 ainda não foi estabelecida pelo TSE. Neste ano, o partido recebeu R$ 22,1 milhões.

O presidente do TSE, ministro Marco Aurélio Mello, afirmou, ontem, que Lula é beneficiário do dinheiro arrecadado irregularmente pelo partido. "A rigor, o candidato é o responsável pelas duas prestações de contas porque ele é o beneficiário", enfatizou Mello.

Por outro lado, o presidente do TSE considerou bastante difícil a hipótese de Lula perder o mandato. Para tanto, seria necessário comprovar que o presidente cometeu o crime de "abuso de poder econômico" durante a sua campanha. Mas, a doação irregular é de apenas R$ 10 mil num universo de R$ 93 milhões arrecadados pela campanha presidencial petista.

"Indaga-se: no contexto em que os gastos (da campanha petista) ultrapassaram R$ 90 milhões, vamos assentar que houve abuso do poder econômico considerado R$ 10 mil a ponto de desequilibrar a disputa?", questionou Mello. "Será que essa diferença de votos entre o reeleito (Lula) e o candidato que disputou o segundo turno (o tucano Geraldo Alckmin) decorreu dessa importância de R$ 10 mil?", ironizou o presidente do TSE.

Formalmente, o Ministério Público ou qualquer partido político pode entrar com ação para impugnar o mandato de Lula por causa da reprovação das contas do PT. Mas, na prática, é bastante improvável que qualquer ação deste tipo tenha sucesso, pois, segundo o próprio presidente do TSE, é preciso demonstrar abuso de poder econômico na campanha e a irregularidade diz respeito a uma doação pequena. Assim, Lula deverá ser diplomado e tomar posse, sem problemas com a Justiça Eleitoral. A única conseqüência prática do julgamento do TSE está na cota que o PT tem direito no Fundo Partidário para o ano que vem. O partido deve perder mais de R$ 20 milhões. A decisão sobre o Fundo deverá ser tomada pelo TSE na semana que vem.

Ao julgar as contas de Lula, os ministros do TSE definiram posição favorável às doações de empresas que possuem participações acionárias em concessionárias de serviço público. Eles deram aval às doações das seguintes empresas: MBR (R$ 2,25 milhões), Caemi (R$ 1,8 milhão), CSN (R$ R$ 1,95 milhão), OAS (R$ 1,7 milhão), Tractebel (R$ 300 mil) e Christiani Nielsen (R$ 1 milhão).

O TSE também aprovou a doação de R$ 2,2 milhões pelo Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS). As entidades de classe estão proibidas de doar para campanhas políticas, mas, segundo os ministros, o IBS, que representa as siderúrgicas, não é entidade sindical e, portanto, pode fazer doações.

O PT entrará com recurso no TSE contra a rejeição das contas do Comitê Financeiro. O advogado do PT, Márcio Luiz Silva, afirmou que a doação da Deicmar representa apenas 0,001% do total arrecadado para a campanha e, assim, não compromete a regularidade das contas.