Título: Royalties de petróleo é alvo de FIDCs
Autor: Vieira, Catherine e Vilella, Janaina
Fonte: Valor Econômico, 14/12/2006, Finanças, p. C1

O início de novos mandatos de quatro anos nos Estados está animando gestores e estruturadores de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) com lastro em receitas a receber dos governos, especialmente as de royalties do petróleo. O Rio Grande do Norte - que junto com o Rio de Janeiro foi pioneiro na estruturação de uma operação com royalties -, por exemplo, admite já estar estudando a formatação de um FIDC de royalties no próximo governo.

A previsão dos administradores de recursos é que, com um mandato maior pela frente, fica mais fácil e interessante formatar esse tipo de fundo, uma vez que somente a receita prevista para legislatura vigente pode ser comprometida. Esse tipo de produto chegou ao mercado pouco mais de um ano antes do fim dos atuais mandatos. Três Estados já formataram fundos: Rio, Sergipe e Alagoas (Rio Grande do Norte fez uma venda direta). O fundo de Alagoas ainda está em análise pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Esses primeiros produtos funcionaram como uma espécie de teste, uma vez que a insegurança jurídica embutida nesses FIDCs ainda suscitava muitas dúvidas. Para alguns, inclusive de integrantes do governo no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, esse tipo de operação funcionaria como antecipação de receita futura, o que é vetado pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). "É preciso estudar com muito cuidado cada operação porque em algumas situações pode se configurar infração da LRF", disse um ex-membro do governo.

Os administradores de recursos estão animados com o sucesso das primeiras tentativas. "Nós acreditamos que a procura vai ser grande", avalia Zeca Oliveira, presidente da Mellon Serviços Financeiros, administradora do fundo pioneiro de royalties, do Rio. Após alguns questionamentos do Tribunal de Contas do Estado, o processo acabou arquivado, o que, para Oliveira, é mais um atestado de que o produto é viável.

Como essas captações têm por política usar apenas os royalties que vencem até o fim do mandato vigente, os estruturadores vislumbram nos próximos quatro anos uma oportunidade. "É possível somar os volumes de royalties previstos para todo o mandato e isso gera volume, o que pode reduzir custos e tornar o produto mais interessante", avalia Paulo Henrique Todaro, da Mercatto, que formatou o FIDC de royalties de Sergipe. "No caso de Sergipe, o volume foi baixo e o custo, alto, mas mesmo assim foi feito, porque era a única alternativa de captação naquele momento, então acabou sendo interessante", explicou.

Em 2005, o Rio Grande do Norte captou R$ 90 milhões numa operação direta de venda de direitos creditórios com o Banco do Brasil. Com mais quatro anos pela frente - Vilma de Faria foi reeleita -, o governo local já estuda a estruturação de um FIDC lastreado em royalties do petróleo para a execução de obras como o metrô de superfície e de um novo anel viário em Natal.

"Estamos estudando uma opção menos onerosa e mais adequada. O FIDC tem se mostrado mais amadurecido. Havia controvérsias se este tipo de fundo representava antecipação de receitas disfarçado, mas penso que agora as dúvidas estão amadurecidas", disse o secretário de Planejamento e das Finanças do Rio Grande do Norte, Vagner Araújo.

No Rio, líder em receitas desse tipo, ainda há dúvida se esse tipo de operação voltará a ser usada. O futuro secretário de Finanças, Joaquim Levy, deve enfrentar uma situação inusitada. Antes, como secretário do Tesouro Nacional, seu papel era o de principal fiscalizador do cumprimento da LRF. Como secretário do governo fluminense, terá de organizar e engordar o caixa do Estado. A dúvida é como ele vai encarar a possibilidade de usar esse mecanismo.

Um dos entraves é o desconhecimento que ainda existe dessa forma de captação, que é recente. "Muitos dos Estados que hoje já recebem volumes significativos de royalties não estão familiarizados com os fundos de recebíveis e têm dificuldades para entendê-los", diz um gestor. "Recebemos um volume grande de consultas, inclusive de municípios, mas poucas se concretizam".

O governador reeleito do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB), não tem intenção de fazer esse tipo de fundo em seu segundo mandato. "Utilizamos parte dos royalties na renegociação de nossa dívida com a União, mas o esforço fiscal do governo foi suficiente para obter recursos suficientes para investir em novas obras", diz o secretário de Finanças do Estado, José Teófilo.

A criatividade dos estruturadores já começa a extrapolar as receitas geradas pelo petróleo. "Já estamos começando a estudar a formatação de fundos com lastro em recibos de direitos de exploração mineral, que alguns Estados, como Minas Gerais, recebem, por exemplo", disse Oliveira, da Mellon.

Esta semana, a CVM editou novas regras para os FIDCs e, apesar de a captação por entes públicos ser permitida, o investimento mínimo é elevado de R$ 25 mil para R$ 1 milhão. No caso do FIDC do Rio, o valor já havia sido mais alto do que em FIDCs de outras categorias. Os fundos que envolverem receita pública futura também não poderão ter registro automático na autarquia.