Título: Mercado livre é alvo de quatro leilões na semana
Autor: Capela, Maurício
Fonte: Valor Econômico, 14/12/2006, Empresas, p. B7

Os consumidores do mercado livre de energia no Brasil, que representam cerca de 30% do total, estão na mira dos leilões. Quatro operações estão sendo feitas na mesma semana com o objetivo de garantir o insumo a valores competitivos já em 2007. Além disso, nunca as comercializadoras de energia se atreveram a fazer leilões no mesmo dia dos pregões da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), como acontece agora.

O temor em todos os segmentos do setor é que as dúvidas em relação ao fornecimento de gás natural, a real situação das térmicas e até mesmo o possível atraso na construção de usinas hidrelétricas impulsionem os preços da energia, já a partir de 2008. E ninguém gostaria de pagar para ver.

"Procuramos o governo federal para que realizássemos um único leilão e, apesar de a idéia ter sido bem aceita, acredito que não houve tempo hábil. Mas no futuro, acho que isso será possível", conta Renato Volponi, diretor de comercialização e risco da comercializadora Enertrade.

Sendo assim, a Enertrade, pertencente à Energias do Brasil, grupo controlado pela portuguesa EDP, fará um pregão eletrônico hoje. E o formato lembra o evento organizado pela Aneel, que também acontece hoje.

Conhecido como A-1, esse leilão organizado pela Aneel se caracteriza por negociar contratos de suprimento do insumo de oito anos, com entrega a partir de janeiro de 2007. E, de acordo com a agência, o preço inicial do megawatt hora (MWh) no pregão será de R$ 105, sendo que fecha o acordo quem apresentar o menor valor. O mercado estima uma comercialização de 600 megawatts (MW) hoje.

No entanto, há quem coloque em dúvida se realmente o leilão do governo federal irá atrair tantos interessados. E uma das razões desse questionamento é o preço teto de R$ 105 por MWh.

Walfrido Ávila, presidente da comercializadora Tradener, com sede em Curitiba (PR), é um dos que teme a falta de lances. Tanto é assim, que o executivo organizou um pregão, que começou ontem e termina hoje. A idéia é que a Tradener consiga arrematar 150 MW médios. "As geradoras estão participando do nosso pregão e nossa orientação é fechar contratos já a R$ 106 por MWh", afirma Ávila. A comercializadora paranaense vai faturar R$ 600 milhões neste ano.

Já a Enertrade, cuja receita líquida foi de R$ 430,5 milhões no ano passado, pretende adquirir 200 MW médios do insumo no seu leilão de hoje. E para isso convidou as geradoras a participar da disputa. "O nosso pregão também é eletrônico e penso que teremos um preço pouco além dos R$ 105. Tanto que abriremos o pregão com algo entre R$ 106 e R$ 108", afirma o executivo.

O primeiro sinal de que o temor de uma disparada de preços é real veio no começo da semana, quando a Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace) resolveu fazer o seu pregão. E de uma expectativa de 200 MW médios, o pregão só negociou 24 MW médios, cerca de 12% do total previsto.

Patrícia Arce, diretora-executiva da Abrace, reconheceu que o leilão ficou aquém da expectativa. Mas ela afirma que o resultado refletiu os problemas atuais que o mercado livre já enfrenta no Brasil. "Nós fizemos o leilão porque tínhamos uma preocupação forte com os consumidores que estão no mercado livre. E a baixa negociação reforçou isso, porque demonstrou uma falta de oferta de energia no longo prazo, uma falta de definição de preços. E tudo isso é fruto de uma série de incertezas, como a indefinição quanto ao abastecimento das térmicas", afirma a executiva.