Título: Justiça retém dividendo da SEB na Cemig para o BNDES
Autor: Durão, Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 11/12/2006, Empresas, p. B9

O BNDES ganhou definitivamente no Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília, o processo que lhe dá direito de bloquear integralmente os dividendos das ações da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) pertencentes à Southern Electric do Brasil (SEB), um consórcio de empresas controlado pelo grupo americano AES, inadimplente com o banco desde abril de 2003.

Os dividendos já retidos por força da ação que tramita na Justiça desde janeiro de 2004 somam até agora R$ 450 milhões. A decisão do STJ, tomada por unanimidade no início do mês, derrubou uma liminar da SEB contra o bloqueio.

O arresto dos dividendos, que estão em depósito judicial, decorre de uma ação coordenada com outra mais ampla impetrada pelo BNDES na 15ª Vara Federal do Rio de Janeiro, pedindo a execução judicial da dívida da SEB, que hoje soma R$ 2,9 bilhões (valor do principal mais correções).

O consórcio é constituído de pelas americanas AES, com 65%, e Mirant, com 26%, além de fundos de investimento coordenados pelo Opportunity, com 9%. Em maio de 1997, a SEB comprou 32% do capital votante da Cemig, pelo qual pagou US$ 1 bilhão. O contrato previa que a SEB passaria a ser a gestora da energética.

Na época, o BNDES emprestou o correspondente a 70% do valor da aquisição. As ações da Cemig pertencentes à SEB foram dadas em garantia. Quando assumiu o governo de Minas, substituindo Eduardo Azeredo, do PSDB, que tinha feito o acordo com os americanos, Itamar Franco, alegou que o contrato era lesivo aos interesses do Estado e recuperou a gestão da Cemig, o que acabou desvalorizando os papéis em poder da SEB.

Com a crise da AES no Brasil, em 2003 a empresa ficou inadimplente tanto nos empréstimos para a compra do controle da Eletropaulo quanto para a operação da SEB.

Após várias tentativas de soluções negociadas, o BNDES, no início de 2004, decidiu acionar a cláusula de garantia do contrato da SEB para requerer na Justiça o pagamento da dívida e o bloqueio dos dividendos provenientes das ações da energética mineira.

O BNDES, apesar de já ter provisionado o débito total da SEB, quer receber este dinheiro, como garantiram fontes envolvidas no negócio ao Valor. Se obtiver sucesso, seja na Justiça ou pela via negociada, o banco incorpora o resultado diretamente no seu balanço, engordando seu lucro.

Enquanto a ação de execução da dívida não se resolver, os dividendos vão continuar sendo depositados em juízo. Pode ser que, se não tiver outra saída, o banco seja obrigado a se tornar acionista minoritário da Cemig. E neste caso, talvez possa usar os dividendos para pagar a dívida.

Em última instância, poderá fazer uma oferta pública das ações da Cemig hoje ainda pertencentes à SEB, para se ressarcir dos prejuízos, depois que os americanos deixaram a mesa de negociação.

O Valor tentou contatar a assessoria da AES, nos Estados Unidos, por telefone e por e-mail, bem como procurou, sem sucesso, advogados da empresa no Brasil que cuidam do caso para falar sobre a vitória do BNDES no STJ, referente ao bloqueio dos dividendos.

A AES tem uma história de inadimplência com o BNDES. Além do calote da SEB, o banco teve que renegociar com a empresa americana, em 2003, uma dívida ainda maior, referente a dois financiamentos concedidos para compra do controle da Eletropaulo, que envolvia ações ordinárias e preferenciais.

Depois de uma longa queda-de-braço, que durou todo o ano de 2003, o banco aceitou um acordo pelo qual tornou-se sócio com 50% menos uma ação da holding Brasiliana, formada pela maioria dos ativos da AES no Brasil.

A integralização da parte do BNDES na holding foi paga com 50% da dívida (US$ 600 milhões). A AES acertou no ato do acordo o equivalente a US$ 90 milhões e os demais US$ 510 milhões foram renegociados para pagamento em 11 anos com três de carência. Mas neste ano o banco e a AES concordaram em antecipar a quitação dessa dívida, permitida por captação de recursos e reestruturação financeira e organizacional.